Aos 75 anos, o engenheiro agrônomo Geraldo Barros tem um currículo daqueles difíceis de caber em uma só pagina. Com PhD em Economia pela North Carolina State University e pós-doutorado pela University of Minnesota, aparece na lista dos 100 economistas mais citados em produções científicas. E tem uma paixão: a economia aplicada ao agronegócio.
O maior desafio na carreira do “professor” Geraldo, como é conhecido, está no fato de, há 30 anos, ocupar o cargo máximo do Cepea – Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada –, ligado à Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz).
A função se chama “coordenador científico”, mas a missão inclui, por exemplo, liderar um time de 130 pessoas que gera 3,3 mil dados por dia, principalmente preços agrícolas e da pecuária, um elemento crucial para o fechamento de negociações que pode levar agentes de mercado a grandes ganhos ou perdas, por isso requer máxima credibilidade.
O trabalho das equipes do Cepea é minucioso, inclui a interação com mais de 10 mil agentes de mercado cadastrados, que colaboram com informações que ajudam a definir os preços diários e também os indicadores setoriais, cada um com seu timing específico.
São monitoradas ao todo 31 cadeias do agronegócio, gerando dados que vão desde o indicador do boi Cepea/B3, usado para a liquidação financeira dos contratos futuros da bolsa, diariamente, até o tomate e a melancia, com uma publicação que virou referência entre os produtores de hortifruti.
Outro destaque do trabalho da instituição, que hoje é 100% financiada pela iniciativa privada, é o cálculo de indicadores macroeconômicos, como o PIB do agronegócio, PIB setoriais, índices de exportação e preços de insumos, entre outros.
”A pesquisa só faz sentido quando ela traz um retorno real para a sociedade”, disse Geraldo Barros, na conversa com o AgFeed, que durou mais de uma hora.
O coordenador do Cepea se refere aos preços, estudos de cadeia produtivas e diferentes pesquisas feitas pelo menos 50 mestres e doutores que fazem parte do grupo.
A área de pesquisa de Geraldo Barros tem mais ênfase em macroeconomia. Ele diz que os estudos detalhados de determinadas cadeias, como o que têm sido feito na soja e no biodiesel, ao calcular o PIB deste segmento, ajudam a embasar os diferentes elos na busca de políticas e estratégias para desenvolver o setor.
Ao longo da trajetória do Cepea, um dos indicadores de maior relevância tem sido o chamado “PIB do agronegócio”. Trata-se de um cálculo muitas vezes confundido com o PIB da agropecuária, calculado pelo IBGE,
No caso do dado oficial do governo, contam nas riquezas da “agropecuária” somente a atividade primária, a produção feita dentro das fazendas.
Já a metodologia feita pelo Cepea procurou agregar tudo o que é agro ou “depende do agro para existir” nesta conta. Desta forma, a soma da agropecuária, da agroindústria e dos agrosserviços, dá origem ao PIB do agronegócio.
Apesar do recuo de 2,99% no PIB do agronegócio calculado pelo Cepea em 2023, Geraldo Barros disse estar otimista com a retomada do setor. Ele admitiu que ainda poderá haver uma leve queda, quando se considera também a indústria, mas garante que, ao longo do tempo, a tendência é de que este indicador cresça pelo menos 2% ao ano.
E, se considerada apenas a agropecuária, a média de crescimento anual deve se manter “entre 3% e 3,5% ao ano”, afirmou o especialista.
Geraldo Barros recomenda a quem está assustado com o atual momento do agro que tenha foco “no longo prazo”, a medida que confia na demanda crescente por alimentos mundialmente, apesar de um crescimento menor na economia da China.
Confira os principais trechos da entrevista do coordenador científico do Cepea ao AgFeed.
O indicador do boi Cepea/B3 está completando 30 anos. E a instituição tem até uma história mais longa. O senhor participação da formação do grupo desde o início?
Sim, participei desde os atos de criação, em 1981. Oficialmente ficou o ano de 1982 como o início do Cepea. Na época a Fealq (Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz) estava começando a se estruturar como uma fundação, para administrar e também fazer pesquisas. Foi criado o Cepea dentro da Fealq. Mais para frente a Fealq decidiu ficar somente com o apoio à pesquisa. Em 91/92 ele foi constituído como centro de pesquisa, até que se transformou em grupo de pesquisa ligado ao CNPQ, que é um cadastro de todos os pesquisadores do Brasil. Cepea hoje é um grupo de pesquisa que a USP propôs ao CNPQ, mas não conta com recursos públicos.
E como foi possível essa independência?
Todo o resultado da pesquisa na universidade, ele termina em conhecimento e tecnologia de inovação que vão ser usados pelas empresas. Você cria uma vacina e depois quem vai quem vai desenvolver e comercializar é uma empresa. A Esalq agora está trabalhando, por exemplo, na área de bioinsumos, mas quem vai desenvolver e comercializar vai ser a indústria. Nós fazemos um trabalho de utilidade pública. Os dados e estudos são financiados pelo setor privado.
Pode dar um exemplo?
A B3, por exemplo, é uma das apoiadoras, nós começamos lá atrás, há 30 anos, quando ainda era uma bolsa de mercadorias e futuros. Depois vieram associações das cadeias produtivas da soja, do algodão, da cana-de-açúcar, entre outras. Todos vão se organizando e isso é muito importante. A coisa mais complicada que tem é fazer estudos em cadeias que não estão organizadas. No caso da bolsa, eles precisavam do indicador para fazer a liquidação financeira dos contratos. A condição que estabelecemos é que vamos publicar os dados. Os preços da soja e do milho, os custos de produção, todos os dados são colocados no nosso site ou em publicações específicas, como aquela da área de hortifruti.
O PIB do agronegócio é feito com a CNA (Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil) e agora tem da cadeia da soja e biodiesel, para a Abiove (Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais. Tem até o PIB das plantas ornamentais, para Holambra. O pessoal está investindo em se auto conhecer. E eles concordam que a informação se torne pública para poder ver políticas e estratégias, além de prestar um trabalho para todo o pessoal que está vinculado aquela cadeia.
Inclusive os preços?
Ter um indicador de preço facilita as negociações. Traz transparência e equilíbrio econômico para as transações. Pode ser um grande produtor ou o pequeno produtor, para que todos conheçam os preços. Muitos já fecham o negócio estabelecendo que é “para daqui um mês, pelo indicador Cepea”. No milho, por exemplo, tem o preço Campinas, e para todas as regiões. Acho que nós trouxemos uma credibilidade, confiança, vou fazer um negócio com transparência e agilidade, o que eu acho mais importante. Antes de ter um indicador do boi, para liquidação financeira dos contratos, o pessoal chegava com uma boiada lá, a bolsa precisava ter até armazém. Atualmente, o indicador Cepea é o preço pelo qual se compra e vende boi hoje no estado de São Paulo.
Esteve na liderança desde o começo?
Assumi diretamente como coordenador por volta de 93/94. Nas eleições todos votam, do mestrado, doutorado, até os departamentos. E tenho sido reeleito até hoje. Já fui professor e inclusive orientador de quase todo mundo que está hoje lá. É interessante porque muitas instituições não conseguem se manter tanto tempo, manter uma harmonia, ter uma eficiência, criar um sistema em que as pessoas sejam estimuladas a produzir e cooperar.
Como foi criado o PIB do agronegócio, mais estendido, que vai além da agropecuária?
Foi criado em conjunto com os professores Joaquim Guilhoto e Maria Cristina Ortiz Furtuoso. Já tínhamos uma parceria com a CNA e ela se interessou em fazer o PIB do agronegócio, para ver o impacto do agro na economia como um todo. E o professor Joaquim criou toda a fundamentação e a metodologia para fazer. Depois ele saiu, agora está na Europa. E nós continuamos. A metodologia vem sendo aperfeiçoada.
E como foi criado este conceito mais amplo do agro?
Nos Estados Unidos o Ray Goldberg e outros já vinham falando desta ideia do agribusiness e do impacto do agro na economia, tanto em termos de produção, de emprego, de renda, de PIB. Havia esse conceito lá e nós adaptamos esse conceito para o Brasil. Eu sou contra o uso desta expressão “agro”. No latim esta palavra tem sentido de coisa “amarga” e o pessoal acha bonito dizer que o agro é pop. Depois desviaram o sentido de agribusiness como se fosse o significado somente dos grandes produtores rurais e empresariais.
“Eu sou contra o uso desta expressão agro. No latim esta palavra tem sentido de coisa amarga e o pessoal acha bonito dizer que o agro é pop”
Até hoje tem esse mal entendido, é o trabalho que temos de explicar que o agronegócio é entendido por agricultura, agropecuária, o parque florestal, a pesca, os insumos, todos os tipos de agroindústria, desde uma serraria, um moinho de arroz, etc, e o agrosserviço também. Imagina se uma gota mágica pinga em cima do Brasil e desaparece a agropecuária, o que mais desapareceria? Todas aquelas atividades e empregos que deixariam de existir.
O que mais pesa em agrosserviços?
Você tem transporte, tem o trabalho dos técnicos e agrônomos, a área financeira que trabalha com o setor. O agronegócio representou 23,5% do PIB em 2023 e responde por cerca de 27% dos empregos. O agrosserviço representa 60% do emprego no agronegócio. Na economia toda 75% mais ou menos é serviços. Nós tivemos sempre a ilusão de que o Brasil deveria se industrializar e todo mundo viria da área rural para ganhar cinco vezes mais trabalhando na indústria, mas o fato é que a indústria nunca empregou mais de 15% do total. Todos que vieram não conseguiram se encaixar na indústria e foram para os serviços. Dentro do agronegócio também a indústria deve empregar uns 15%.
Há quem diga que outros setores, como a venda de picapes, por exemplo, também poderiam entrar nesta conta do PIB...
Sempre que necessário atualizamos a metodologia. Hoje os dados são muito detalhados. É preciso cuidado para não inflar demais. Para estar incluído no agronegócio é necessário que o setor esteja usando de alguma forma um produto que saiu da agropecuária. O biodiesel é porque depende do óleo de soja e da soja. Nos maquinários, eles existem para que sejam vendidos para a agropecuária. Mas estamos sempre abertos para avaliar. Mas esse número que chegou a 27% nos últimos anos, é grande.
O pessoal está achando pouco? Eu acho que ele representa bem e evolui adequadamente. Qual é a dificuldade que o agronegócio tem? É a mesma da indústria de transformação brasileira como um todo. A inovação, a tecnologia e a escala precisam ser permanentes. Mas se apostou no mercado interno, já que o Brasil é um país continental. Só que o mercado interno brasileiro, infelizmente, não é tão grande. A população é grande, mas para ter demanda é preciso ter poder aquisitivo. Nosso problema é que uma grande parte da população ainda é pobre, não tem recursos, necessita desse apoio de transferência de renda.
Como isso se aplica ao agronegócio?
No agronegócio, para desenvolver escala, usar tecnologia e reduzir custos, ser competitivo, tinha que ter um grande mercado. As pessoas acham que se nós não tivéssemos exportando teria alimento barato no Brasil, e isso não é verdade. A nossa produção tem o menor preço do mundo e todo mundo vem comprar aqui. Graças à exportação, você tem esse grande desempenho da agropecuária.
“As pessoas acham que se nós não tivéssemos exportando teria alimento barato no Brasil, e isso não é verdade. A nossa produção tem o menor preço do mundo e todo mundo vem comprar aqui”
Mas a agroindústria brasileira tem dificuldade de reproduzir essa estratégia em função do protecionismo mundial. A China quer comprar soja aqui e levar para lá para depois fazer o farelo e o óleo. O certo é você transportar um produto já o máximo processado, porque o transporte e a logística ficariam mais baratos. Para mudar isso teria que fazer acordos comerciais, mas é difícil, porque o pessoal não quer, os europeus, por exemplo, não querem.
O que esperar do PIB do agronegócio?
O PIB do agronegócio cresce a uma taxa menor do que a agropecuária. Se você fosse você me perguntar quanto que vai crescer no próximo ano, eu diria de 3% a 3,5% porque essa é a taxa histórica. Para desviar disso precisa haver um problema climático ou uma guerra. O agronegócio cresce cerca 2% porque a agroindústria não acompanha, existe essa dificuldade de acesso ao mercado internacional. No Brasil quem não exporta, importa. A nossa indústria até exporta bastante, mas temos que importar peças e produtos acabados.
Como avalia os números divulgados recentemente sobre 2023?
O PIB do agronegócio, que engloba agropecuária, agroindústria e agrosserviços, alcançou o valor de R$2,58 trilhões em 2023, o que correspondeu a 23,5% do PIB total do Brasil, uma queda em relação ao ano anterior, quando representou 25,2% do total.
Para melhor compreender a evolução do PIB do Agronegócio entre os anos de 2022 e 2023 e poder confrontá-la às dos demais setores econômicos do Brasil, é importante esclarecer que o Cepea calcula duas medidas desse PIB. Para a sociedade como um todo, importa qual foi a variação do Volume produzido pelo Agronegócio – quanto maior o volume, melhor para todos. Pois bem, entre 2022 e 2023, o PIB-Volume do Agronegócio cresceu 8,43%. Ou seja, o setor disponibilizou um total de produção 8,43% maior do que o de 2022.
E quais setores tiveram maior influência neste aspecto?
Puxaram esse desempenho do agronegócio, de 2022 para 2023, na agropecuária, a soja e o algodão cujos volumes de produção expandiram em torno de 23%. No caso do milho o crescimento de produção foi de 17% e no da cana, 11%. A bovinocultura de corte também teve expressiva expansão: 12%. Esses altos volumes refletiram-se no significativo crescimento dos agrosserviços, como logística, por exemplo, que atingiu a taxa de 6,9%.
Mas há um outro cálculo que mostra queda?
Sim, além do PIB-Volume, o Cepea calcula a evolução da Renda Real do Agronegócio. É um dado que interessa primeiramente aos produtores e demais agentes do setor. Nessa abordagem, o volume produzido é avaliado a preços reais. Como os preços reais do agronegócio sofreram queda de 10,5% e, especificamente, os da agropecuária, 17%, resultou que, a despeito do substancial aumento do volume, a Renda Real do Agronegócio caiu 2,99%, enquanto a Renda Real da Agropecuária caiu 1%.
“Não precisa ficar dando estímulo de preço para a agropecuária crescer, o que precisa é de mercado em expansão, para seguir explorando escala e tecnologia”
Portanto a agropecuária brasileira, aumentou substancialmente sua produção (19,3 %), mas obteve uma Renda Real pouco abaixo da do ano anterior (-1%) em virtude da forte queda de preço real (- 17%). Já o agronegócio, como um todo, que aumentou sua produção em 8,43%, e tendo sofrido uma queda real de preços de 10,5%, teve sua Renda Real diminuída em 2,99%.
E qual o efeito para o País?
Evidentemente, o consumidor brasileiro se beneficiou nessa situação – um aumento substancial de produção a um preço real praticamente constante, quando se considera que os alimentos subiram ao consumidor 4,4% (IPCA Alimentos) e os preços em geral 4,6% (IPCA Total). Ademais, entre 2022 e 2023, o saldo comercial do agronegócio, resultante do comércio externo, aumentou 6%, atingindo o recorde de 150 bilhões de dólares.
Será possível manter aquela média de 2% de crescimento em 2024?
Sim, vai manter. A agropecuária tem um grau de competitividade muito grande. Se você comparar o crescimento da produção da agropecuária, com o preço real da agropecuária, de 1975 até próximo do ano 2000, o preço real quase caiu pela metade. Hoje está mais ou menos 40% do que era 50 anos atrás. Não precisa ficar dando estímulo de preço para a agropecuária crescer, o que precisa é de mercado em expansão, para seguir explorando escala e tecnologia.
Mas esta quebra na safra em 2023/2024 não muda o cenário?
Havia uma tendência de crescimento de preços e quando chegou a pandemia houve um rompimento. Danificou as cadeias produtivas. Depois entramos num período de belicismo, com guerra na Ucrânia e na África. Por isso, em 2021 e 2022, os preços tiveram uma elevação, inclusive no Brasil, acima da tendência que vinha sendo seguida e agora está havendo uma normalização. Vai ser retomada a tendência que se tinha antes.
Toda a agropecuária funciona com base na PPI – Paridade de Preço Internacional, aquela que foi alvo de toda a discussão na Petrobras, que era converter pela taxa de câmbio o preço internacional. A agropecuária funciona assim, na soja, no milho, por exemplo, se comparar preços da FAO com aqueles que Cepea levanta, é uma coisa relacionada a outra. E isso se aplica até para o arroz e o feijão.
O maior cuidado que precisamos ter no Brasil é com a taxa de câmbio, porque se há algum problema político, às vezes não é nem de natureza econômica, e o dólar sobe, vai subindo o preço do arroz e feijão, e o pobre está pagando. As pessoas pensam que se subiu o dólar vai valorizar a situação do produtor de soja, mas o preço do arroz e do feijão também vai subir.
Mas se o volume colhido é menor, como é possível crescer?
O PIB não vai crescer como cresceu no ano passado, que foi fora da curva, houve uma grande produção. Em relação a 2023 pode ser que até caia um pouco, porque a última safra é que foi fora da curva. A tendência depois é retomar, se não houver nenhuma pandemia, se o mundo acalmar um pouco o belicismo, a agropecuária pode ficar naqueles 3%. É um crescimento em cima de produtividade e competitividade para um mercado mundial, que tem uma demanda grande.
Neste sentido, é possível contar com a mesma demanda por parte da China?
O pessoal tem medo, comenta que a China vai desacelerar, mas ainda vai ser um crescimento expressivo. E você tem ainda uma grande parte da população do mundo que está subalimentada. Naqueles cálculos da FAO, por exemplo, está se contando que tem essa grande parte de pessoas subalimentadas e os governos estão cada vez mais focados nisso, em atender quem está subnutrido. Esse é um determinante do crescimento na demanda mundial de alimentos, assim como a taxa de crescimento populacional, que não vai ser muito alta.
“Na China, a tendência é passar de cereais e grãos para carnes. A demanda por alimentos não vai cair”
A China já atingiu um certo grau de maturidade. Como não é uma economia de mercado, não teve um jogo de cintura para se adaptar, tomou um baque, mas assim mesmo tem um potencial de crescimento, não vai ser 8% ou 9%, mas vai ser 5%. Isso é mais do que suficiente. Tem poder aquisitivo e ainda tem necessidade de atender uma porcentagem da população mais pobre, que vai acessar alimentos de mais qualidade, como proteínas. A tendência é passar de cereais e grãos para carnes. A demanda por alimentos não vai cair.
O que mais precisa ser esclarecido?
Tem alguns mitos. O pessoal fala que o agronegócio fica exportando só commodities. Mas a mesma proporção de commodities primárias que o agronegócio exporta a indústria também exporta, porque 40% da exportação industrial é minério. A indústria extrativa quase compete com a agropecuária. Ela cresce uns 2,5% a 3%, porque exporta.
Devemos temer as barreiras da Uniao Europeia?
A relação agro e desmatamento é muito menor do que se fala. Agora está havendo uma perda maior no Cerrado. Mas tudo isso está regulamentado no Brasil, há leis que dizem o que pode ou não fazer. Só que nossa sociedade tem um problema que é o combate aos crimes. Para o agronegócio é importante que se cumpra a lei. Mas enquanto houver desmatamento no Brasil, não importa quem esteja desmatando, vão dizer que o Brasil é um país que desmata. O País tem que fazer a lição de casa para desarmar estas armadilhas. Nós não somos dependentes da Europa na exportação. Ela até pode se dar ao luxo de fazer isso (barrar produtos brasileiros). O Brasil acho que tem condições de comprovar que estamos em grande proporção atendendo esses requisitos ambientais.
Qual o seu conselho para os empresários que neste momento estão preocupados com o agronegócio, inclusive pelo aumento das recuperações judicias entre produtores rurais?
Nós tivemos uma saída da rota, como falei, a partir da pandemia. Foi um impacto tremendo. Jogou preços para patamares altos, que agora estão em processo de correção. Parece que está caindo porque compara com período anterior. Mas é sempre importante olhar no longo prazo. Economistas, por exemplo, para fazer uma aplicação financeira, olham sempre no longo prazo. E as perspectivas são altamente favoráveis, no longo prazo. Vai haver um crescimento de 3,5%, o uso dos insumos e os investimentos vão continuar crescendo nessa mesma proporção.
O senhor aplicaria o seu dinheiro num fundo do agronegócio então?
Claro, aplicaria em Fiagros, LCAs, e assim por diante. Pensando nessa questão do longo prazo. Está muito caracterizado que nós estamos num processo de sair desse trauma que veio com a pandemia, de preços altos, que descolaram do PPI. Foi necessário dar aquele auxílio emergencial. E tanto o Brasil, como EUA, todo o mundo, está pagando o preço até agora com uma inflação alta, pelos gastos que foram feitos. Os preços internacionais estão se acomodando e no Brasil também. Essa maior importação de leite e arroz da Argentina, é porque aqui o preço ainda estava acima da paridade internacional.
E daqui um ano, é possível prever como estarão estes preços?
Se não tiver uma nova pandemia e se forem equacionados os problemas de guerra, nós voltamos para a normalidade e retomamos aquele período de crescimento, que ocorria até 2019, excelente para o agronegócio. Mas hoje o produtor e o investidor têm que ser profissionais, para manter o negócio rentável, saber o momento de realizar negócios. O câmbio por incrível que pareça está mantendo projeções, na faixa de R$5 (por dólar). O Brasil comparativamente a outros países é uma economia onde compensa investir, então os recursos estão vindo. Se não fosse isso, estas incertezas políticas, com a polarização, teriam prejudicado o câmbio.
Os juros devem cair, mas vamos manter uma taxa real de juros em torno 4% ao ano. Porque existe uma paridade de juros internacional e os EUA vão manter seus juros mais altos. Na hora que o juro americano começar a cair, aí poderemos reduzir nossa taxa real. Outra vantagem é que quando isso acontecer, vai favorecer o preço das commodities.