As oscilações do clima deixam produtores rurais em alerta e complicam a vida de quem é responsável por fazer projeções de safra, que a cada semana precisam ser revistas e, muitas vezes, mostram diferenças entre os órgãos oficiais e as estimativas de consultorias privadas.
Conforme já era esperado pelo mercado, nesta sexta-feira, o relatório mensal de oferta e demanda do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês) revisou para baixo a expectativa para a produção de soja no Brasil.
O USDA cortou em 4 milhões de toneladas sua previsão, na comparação com o relatório anterior, projetando agora que o país colha 157 milhões de toneladas ao final da safra.
Nesta semana, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) também divulgou suas projeções, com a expectativa de que o Brasil produza 155,3 milhões de toneladas de soja até o final do período 2023/2024.
Ambas as projeções vêm sendo criticadas por produtores rurais, que alegam perdas maiores em função do clima. A Aprosoja de Mato Grosso, por exemplo, afirma que a produção no estado ficará 4 milhões de toneladas abaixo do que está projetando a Conab.
O relatório do USDA também revisou para baixo outros indicadores, como o consumo de soja no Brasil, de 59,7 milhões para 57,5 milhões de toneladas, e reduziu em 5 milhões de toneladas a projeção de esmagamento de soja.
Diversos analistas de mercado também vêm projetando uma produção de soja ainda menor no Brasil do que a estimada por órgãos oficiais.
A mais recente, foi divulgada nesta quinta-feira, pela Pátria Agronegócios. A consultoria projetou a safra de soja em 143 milhões de toneladas, o que pode representar uma queda de 7,4% em relação ao volume colhido em 2022/2023, que foi de 154,6 milhões de toneladas e também represente um corte de 7,5 milhões de toneladas em relação ao que era previsto pela empresa em dezembro.
A consultoria espera também uma queda significativa na produtividade nas áreas de soja, com estimativa de 3,223 toneladas por hectare, contra um índice de 3,5 toneladas na safra passada. O número representa uma queda superior a 8%.
A expectativa da Pátria Agronegócios é que todos os principais estados produtores de soja fechem a safra com quedas de dois dígitos. É o caso de Mato Grosso e Goiás, com recuos esperados no volume de soja de 17% e de 14%, respectivamente.
E para o produtor, a grande questão é que essas revisões para baixo nas estimativas de volume não se revertem em aumento do preço. Ao contrário. Nesta sexta-feira, a cotação medida pelo índice Cepea/Esalq no Paraná caiu 3,25%, com a saca de 60 kg fechando o dia a R$ 122,20.
Na Bolsa de Chicago, o contrato para janeiro fechou em US$ 12,05 por bushel, enquanto há dois meses operava próximo de US$ 14. A queda em relação a quinta-feira foi de 25 pontos.
Em parte, essa disparidade começa a ser justificada pelo que se espera do Rio Grande do Sul. O El Niño, que vem provocando secas severas no Centro-Oeste e no Nordeste, como já ocorreu em outras safras, trouxe mais chuvas para o Sul.
Até o ano passado, o fenômeno La Niña provocava a tendência exatamente oposta. Assim, nesta safra, a estimativa é de recuperação na produção de soja do Rio Grande do Sul, com aumento superior a 53%, segundo a Pátria Agronegócios.
Mas os números do USDA trazem um cenário mais amplo que explica o comportamento do preço da soja, relacionado a oferta e demanda globais da oleaginosa.
O relatório Radar Agro, do Itaú BBA, mostra que o USDA espera que a Argentina dobre sua produção na safra 23/24, para 50 milhões de toneladas.
Os Estados Unidos tiveram suas estimativas de produção elevadas em 1 milhão de toneladas, o que representa uma expectativa de queda ainda menor que a registrada anteriormente. Agora, espera-se que a produção americana caia 2% em 23/24.
A Pátria Agronegócios chama atenção para outro dado importante no ciclo de soja brasileiro. O processo de colheita atingiu 2,38% esta semana, o que representa o maior índice de antecipação desde 2017. Em 2023, nesta mesma época, a colheita estava em 0,85%.
Segundo os analistas, mesmo com o plantio mais lento na safra, a colheita está acelerada no Mato Grosso. Isso tende a sinalizar baixa saúde das plantas e redução na produtividade. Segundo a Pátria, relatos de seus clientes apontam decepção com os rendimentos das plantações.