Um milhão de litros de inovação. A startup Ideelab, que desenvolve soluções biotecnológicas para empresas do agro, está prestes a inaugurar, em 2024, sua nova fábrica, que será localizada em Londrina (PR).

Segundo o CEO e cofundador da empresa, Ronaldo Dalio, a instalação nasce com essa capacidade anual, mas a ideia é que, entre 2025 e 2026, já seja ampliada para quatro a seis milhões de litros anuais.

O crescimento previsto é para acompanhar a demanda por produtos biológicos no agro. A Ideelab não deve ir diretamente ao mercado, mas, com modelo de negócio B2B, a empresa desenvolve dentro de casa soluções e vende para outras empresas. Essas empresas, por sua vez, vendem ao produtor.

A ideia da fábrica nasceu, assim, de uma necessidade de atender os clientes, principalmente aqueles sem fábrica ou aqueles com fábricas com 100% da operação já tomada.

Assim, a Ideelab atua como uma espécie de terceirizada, que pesquisa, testa, desenvolve a tecnologia e manufatura os biológicos. Segundo Dalio, os clientes não conseguem, em muitos casos, parar a fábrica para desenvolver um produto, demanda investimentos e tempo.

A empresa não quer, no entanto, ter uma “marca própria”. Tanto que, como explicou o CEO, não possui um time de vendas. “Nascemos na pesquisa e desenvolvimento e fomos criando esses departamentos periféricos para atender os clientes”, diz.

O negócio foi criado por Dalio e seu sócio, Sérgio Pascholati, dois ex-pesquisadores da Esalq/USP, num ambiente todo acadêmico. “Éramos poucos cientistas dentro de um laboratório pequeno, mas com ímpeto de trazer inovação na agricultura”.

No começo do negócio, que foi fundado em 2019, a ideia era dar um avanço para as tecnologias envolvidas no desenvolvimento de produtos biológicos para o agro. Na avaliação de Ronaldo Dalio, o mercado de biológicos ainda é dominado por uma gama de cerca de 20 micro-organismos, algo muito pequeno em relação a toda micro biodiversidade brasileira.

Diante disso, a ideia era dar tração a novas gerações de biológicos. Ele conta que a primeira geração, mais básica, é quando um microrganismo dentro de um frasco é utilizado no cultivo. Na segunda geração, há uma mistura desses microorganismos, algo que aumentou muito a eficiência dos produtos.

Na nova fábrica e no futuro, a aposta da Ideelab é nas próximas gerações, especificamente da terceira até a sexta. A terceira geração é a geração que usará microorganismos com funções metabólicas.

Na prática, o microorganismo não precisará estar vivo, ou pode estar com suas funções inativadas. O que realmente importa, nesse caso, é o “princípio ativo”. Na quarta geração, os produtos contam com peptídeos e proteínas. “Achamos que essas gerações [3 e 4] serão o grande passo do mercado no futuro”, avalia Dalio.

Já a quinta geração envolve o chamado sistema CRISPR, com a edição genética dos microorganismos, o que permitirá mais tolerância à químicos e herbicidas e aumentará a eficiência dessas moléculas. Na sexta geração, o princípio, que envolve RNA, usará uma tecnologia próxima com as das vacinas de RNA.

“Achamos que essas tecnologias, da terceira à sexta geração, vão compor o cenário dos biológicos no futuro. Está começando devagar, com a terceira e quarta, mas acreditamos que entre cinco e oito anos essas tecnologias estarão bem difundidas no mercado”, comentou o CEO da Ideelab.

Para dar conta desse novo momento do setor, Dalio revelou que a empresa deve buscar, nos próximos anos, um novo aporte para criar mais duas fábricas, que serão especializadas em bactérias, fungos e peptídeos, além de proteínas e RNA.

A empresa ainda não sabe se o capital virá via parcerias, fundos tradicionais de venture capital ou linhas de financiamento do BNDES ou outras oportunidades governamentais. “Vamos buscar capital para expansão. Queremos ter esse parque fabril de três fábricas em até cinco anos”, disse.

Sem contar a fábrica que será inaugurada em 2024, a empresa conta atualmente com um laboratório e dois centros experimentais, que englobam casas de vegetação e tecnologias de controle de temperatura. Além disso, parceiros da empresa fazem ensaios em campo.

No mês que vem, a empresa irá inaugurar uma facility, que segundo Dalio, é uma das primeiras instalações de scale-up de bioprocessos do Brasil. “Como os clientes não têm tempo para parar a fábrica e desenvolver produtos, investimos para fazer inovação internamente, já com desenvolvimento e scale up, para entregar o produto pronto”, disse.

Do laboratório universitário ao empreendedorismo

Quando Dalio, ainda mais jovem, entrou no curso de Ciências Biológicas na Universidade Estadual de Londrina, sua vontade era de se tornar professor universitário. Para tal, seguiu o rito tradicional acadêmico da pós-graduação.

Depois de formado, fez um mestrado na Unicamp, passou cinco anos na Alemanha no doutorado e completou a trajetória com três pós-doutorados no Brasil.

Quando voltou da Bavária, atuou pesquisando no IAC (Instituto Agronômico de Campinas) e na Esalq/USP de Piracicaba. A área de pesquisa sempre foi relacionada com a fisiologia vegetal.

A questão é que Dalio sempre “batia na trave” nos concursos para dar aulas e, quando passou em um, para dar aula no departamento de genética e processos biotecnológicos na Unesp de Botucatu, passou num processo seletivo com tempo determinado para acabar.

No seu terceiro pós-doutorado, na Esalq, atuou junto a Sérgio Pascholati, um professor referência na área de fitologia e que viria a ser seu sócio e cofundador da Ideelab alguns anos depois.

Ronaldo Dalio, CEO da Ideelab

Durante o tempo de Esalq, Ronaldo Dalio era figura carimbada nos eventos sobre fitopatologia, genética e sempre palestrava sobre sua linha de pesquisa, que envolvia peptídeos e moléculas que mudavam a fisiologia das plantas, controlando doenças das mesmas.

“O assunto começou a chamar atenção de empresas, que chegavam até mim para desenvolver algum tipo de inovação na área. Ao mesmo tempo, o Sérgio tinha o mesmo tipo de abordagem. Chegou num momento que estávamos envolvidos ou prestes a fazer várias parcerias com multinacionais”, disse.

Foi então que entre 2017 e 2018, surgiu a ideia de fazer isso por conta própria, fora da Universidade.

“Tomei a decisão de deixar de lado a vontade de ser professor universitário e colocar 100% da minha atenção numa empresa com foco em criar inovação na biotecnologia”, comentou o CEO da Ideelab.

Nesse momento, numa “conversa franca” com Pascholati, convidou-o para entrar na empreitada. O convite foi aceito e a Ideelab nasceu oficialmente em 2019.

A questão é que dois pesquisadores, envolvidos até então somente com o mundo acadêmico, não tinham a expertise do mundo de negócios. Em um programa de startups de agro do Sebrae, aprenderam sobre o que era Ebitda, fluxo de caixa e também a lidar com funções administrativas.

Nessa época, tiveram a oportunidade de, para além das aulas, de fazer pitches em alguns eventos. Foi aí que a empresa conheceu a WBGI, Venture Builder de Piracicaba, interior de São Paulo, especializada no agronegócio, que já soma R$ 10 milhões aportados em cerca de 15 agtechs.

A WBGI aportou R$ 500 mil, recebendo em troca 10% do negócio, e ajudou-os a começar sua empreitada. "Construímos o primeiro laboratório no parque tecnológico de Piracicaba e o negócio foi caminhando. Conseguimos passar pela pandemia sem muitos problemas", disse João Blasco, um dos sócios da WBGI.

Nessa época, a Ideelab tinha, além de Pascholati e Dalio, mais três pesquisadores. “Logo que abrimos o espaço físico já fechamos contratos de parceria com empresas, o que nos ajudou a nos manter no início”, disse Dalio.

“O espaço físico foi inaugurado em agosto de 2020. Lembro que em novembro daquele ano eu tinha oito mil reais na conta e tinha que pagar salários. O dinheiro não pagava nem o custo fixo. Mas a partir dali, começaram a aparecer muitos contratos e desde então temos um crescimento rápido”, conta o CEO.

Atualmente são mais de 30 pessoas, com 10 pós-doutores. A expectativa, com a nova fábrica de Londrina, é aumentar ainda mais o corpo de funcionários. Até o ano que vem, o quadro deve chegar próximo das 100 pessoas.

O contato com a WBGI serviu também para ajudar no segundo aporte da empresa. Outro sócio da empresa, Uriel Rotta, fez uma ponte entre a Ideelab e a Inquima, fabricante brasileira de insumos foliares que, em 2022, fez um aporte na startup.

Segundo Dalio, o investimento da fábrica de Londrina veio em partes por esse aporte e em partes pelo próprio caixa da companhia. O valor não foi revelado.