Escrevo este artigo de Colônia, na Alemanha, onde acontece agora uma das maiores feiras de alimento do mundo, a Anuga.

Normalmente, as feiras são espaços de negócios e network para as empresas. Institucionalmente, vamos aproveitar a ocasião para um diálogo com importadores e associações de importadores europeus de carne bovina sobre a EUDR, a legislação anti-desmatamento da União Europeia.

Mas feiras – e a Anuga, especialmente – também ajudam a identificar tendências no mundo da alimentação, que vemos refletidas nas inovações expostas nos diversos ramos da indústria de alimentos que usam a feira como vitrine. Observar esses movimentos pode nos ajudar a entrever o futuro e moldar estratégias para nossa atuação como setor.

A Innova Markets Insights, consultoria especializada, levou para a Anuga algumas constatações interessantes, pesquisadas no mercado global (e a pesquisa passa por mercados tão distintos quanto representativos, como Brasil, Canada, China, França, Alemanha e Índia).

A primeira delas é que cada vez mais consumidores mais jovens estão definindo o que o mercado deveria oferecer como produtos. 63% dos jovens da chamada Geração Z acreditam que as indústrias de alimentos devem entrar em ação para fazer valer valores e princípios.

Quase metade desses jovens usam as redes sociais para cobrar isso e opinar sobre alimentos em geral.

O que estes jovens buscam? Em primeiro lugar saúde, física e mental. E aqui aparece com grande força o conceito de produtos que contribuam para um envelhecimento saudável (healthy ageing).

Cerca de 77% desses jovens consideram uma prioridade manter-se ativos fisicamente no envelhecimento. Buscam também sabor e novas experiencias sensoriais.

Mas a sustentabilidade definitivamente entra nas prioridades da Geração Z. Cerca de 64% dos jovens conscientemente escolhem alimentos baseados em seu impacto ambiental, quase sempre ou na maioria das vezes.

Esse impacto positivo é entendido como menor desperdício, menos resíduos ou melhores práticas para se proteger o meio ambiente.

Globalmente, e não só entre jovens, um de cada quatro consumidores entende que vale a pena pagar mais por um produto (embalagem incluída) ambientalmente amigável.

Algumas tendências apontadas pela Innova mostram como as empresas estão respondendo a essa crescente demanda por sustentabilidade pelos consumidores.

A primeira é que as companhias estão dizendo mais claramente as ações que estão tomando para reduzir seu impacto ambiental. As próprias embalagens mencionam produtos livres de desmatamento, ou menor uso de plástico ou menos resíduos, ou reaproveitamento ou reciclagem.

A segunda tendencia é que estão se comunicando mais sobre o processo produtivo. Consumidores querem saber onde e em que condições um alimento foi produzido e que impacto ele tem.

Mostrar inovação na parte agrícola passa a fazer parte da comunicação sobre o processo produtivo do alimento e, nesse quesito, agricultura regenerativa está sendo o último grito da moda.

Do ano passado para cá, houve um crescimento de 84% no lançamento de novos produtos alimentícios que ostentam agricultura regenerativa como parte do processo produtivo.

De todos os lançamentos, 58% aconteceram na América do Norte, 22% na Europa, 8% na Asia e 5% na América do Sul e outros 5% na Australásia.

E por último, mas não menos importante, surge o conceito de Positivamente Imperfeito. Para os consumidores, confiar em uma marca é cada vez mais importante.

E por isso, é melhor para uma marca ser transparente sobre os desafios e complexidades envolvidos em tornar uma cadeia produtiva mais sustentável e sobre sua jornada nessa direção do que proclamar como sustentável algo que não é.

É claro que estes insights são valiosos para pensarmos nosso futuro e como nos comunicamos como setor. Globalmente, a carne está no centro das discussões sobre sistemas alimentares sustentáveis. Exemplos?

Assisti aqui a um debate sobre o Futuro da Carne. O debate tinha dois representantes de empresas de carne cultivada in vitro, um de uma empresa de ultraprocessados plant based e duas ativistas veganas.

Surge o conceito de Positivamente Imperfeito: é melhor para uma marca ser transparente do que proclamar como sustentável algo que não é

Ou seja, aparentemente há pouca confiança por aqui de que a carne seja associada a um futuro positivo neste planeta.

Na Climate Week em Nova Iorque, no início de setembro, a transparência na cadeia como ferramenta contra o desmatamento esteve no centro da discussão.

A Abiec e a Coalizão Clima Agricultura e Florestas organizaram um debate sobre rastreabilidade com experts sobre o tema. E com a The Nature Conservancy e o governador Helder Barbalho, do Pará, debatemos a transição em uma das paisagens produtivas mais relevantes do país.

E ainda em setembro, na FAO, fez-se a primeira Conferência Global de Transformação para a Pecuária Sustentável, em busca de soluções para uma necessária transição.

Sim, sabemos que os desafios para avançar a sustentabilidade na cadeia da carne são grandes.
Nas palavras da ex ministra Izabella Teixeira, que participou da discussão em Nova Iorque, precisamos associar food security a nature security. Para ela, a transformação da agropecuária está no centro da transição que o mundo precisa.

O Brasil tem um papel imenso nisso e a pecuária dentro do Brasil, um peso imenso nessa transformação. Podemos continuar aprimorando a transparência na cadeia, assim como podemos fazer da nossa pecuária um modelo regenerativo para o mundo ver.

Avançando nessa trajetória, podemos trabalhar para colocar de volta a carne como uma opção preferencial para que futuras gerações possam crescer e envelhecer de forma saudável e ativa.

Plant based, orgânico, local, sustentável, low carbon. Antes de mais nada, ou de qualquer claim sobre o que é melhor para pessoas e para o planeta, é preciso também colocar a produção responsável e sustentável no lugar central que deve ocupar nos sistemas alimentares.

Nas palavras de James Banks, produtor e escritor inglês, é quando produzimos bem que comemos bem.

Fernando Sampaio é Engenheiro Agrônomo e Diretor de Sustentabilidade da Abiec.