Para alguns segmentos, pode ser um maremoto. Para a indústria de Fiagro, uma marolinha. Pelo menos foi essa sensação que ficou, entre os gestores responsáveis pelos principais fundos que envolvem ativos do agronegócio, após uma análise mais cuidadosa do texto da MP 1.184/2023, apresentado esta semana pelo presidente Lula.
Ao tratar da tributação de fundos de investimento, a nova regulamentação prevê uma mudança na isenção dos rendimentos dos FIIs e Fiagros.
Atualmente, os investidores não pagam imposto de renda sobre os rendimentos desses fundos desde que o fundo tenha, no mínimo, 50 cotistas. A proposta prevê subir esse número para 500.
Para os fundos listados em Bolsa, a medida tem pouco efeito. Para se ter uma ideia, de todos os mais de 30 Fiagros que estão na B3, apenas quatro possuem menos de 500 cotistas e, se a lei entrasse em vigor agora, passariam a ter seus rendimentos taxados.
São eles: o Greenwich Agro Fiagro (GRWA11), da gestora Greenwich e que possui 424 cotistas atualmente, e os Fiagros FZDA11, FZDB11 e FLEM11, todos da 051 Capital. Esses três possuem, respectivamente, 217, 53 e 18 cotistas.
De acordo com Bernardo Arruda Reis, head da área de agronegócio na 051, a gestora tem “acompanhado com muita atenção o assunto”, que ele considera de muita relevância para a empresa e para os cotistas.
Porém, ele destacou que, mesmo antes da MP entrar em tramitação, a 051 já tinha como parte do plano expandir o tamanho de seus fundos.
“Desde a primeira divulgação dos resultados do nosso primeiro fundo, FZDA11, já estávamos iniciando um movimento de expansão da divulgação do investimento em terras agrícolas via Fiagro do tipo FII”, disse ao AgFeed.
“Estamos dando continuidade ao nosso planejamento para ter agilidade para se adequar às mudanças necessárias. No entanto, é de suma importância aguardar o desenrolar das discussões para não haver qualquer tomada de decisão precipitada”.
Esses quatro fundos também são pouco representativos em termos financeiros frente aos outros Fiagros listados. O patrimônio líquido somado desses quatro Fiagros soma R$ 1 bilhão. Segundo dados da B3, o patrimônio somado de todo esse mercado é em torno de R$ 13,5 bilhões. Ou seja, os quatro fundos representam pouco mais de 7% desse total.
Para além da quantidade de cotistas, a MP prevê que o fundo, para ter seus rendimentos isentos de IR, deve ser listado na Bolsa.
Aqui é importante uma diferenciação entre fundo fechado e não-listado. O fundo pode ser considerado fechado e ainda assim ser listado, como é o caso do Fiagro IAAG11, da Inter Asset.
Segundo o CEO da Inter Asset, Daniel Castro, um fundo é fechado quando o investidor não pode fazer nenhum tipo de resgate, mas continua com as cotas abertas. “O que vai mudar é para fundos que não são listados e têm poucos cotistas”, diz.
Na avaliação de Brunno Bagnariolli, sócio da Jive Investments e CIO de fundos da Mauá Capital, o texto da MP é positivo para o segmento de FIIs e Fiagros.
Em sua opinião, o texto pontua duas coisas. A primeira é que FIIs e Fiagros não são o alvo prioritário do governo nas taxações, o que pode afastar boatos de que a Fazenda quer taxar todo e qualquer tipo de investimento do segmento.
O segundo ponto é que o texto acaba separando e criando uma barra de divisão entre os fundos.
“Atualmente, um fundo de 300 mil cotistas que negociava milhões por dia em bolsa era tratado da mesma forma que um fundo com 51 cotistas que não tem negociação nenhuma. Isso fragilizava o segmento como um todo para ser alvo de uma tributação”, comentou.
A MP, que é combinada com outros projetos do governo, visa taxar os chamados “super-ricos”.
Com isso, se o texto for aprovado no Congresso, impactará somente uma modalidade de Fiagro, que é aquela que justamente atende grupos familiares que usam o fundo para gestão patrimonial e planejamento familiar – a Fiagro-FIP, e que investe em participação em sociedades que explorem atividades da cadeia agroindustrial, incluindo títulos conversíveis em participações. Esses fundos são aqueles que não são listados em Bolsa.
Desde sua criação, o Fiagro vinha sendo utilizado por famílias detentoras de patrimônio rural e com muitos herdeiros como alternativa para planejamento familiar e patrimonial.
Por meio da criação de fundos, era possível explorar imóveis e propriedades rurais, especialmente nos casos em que a titularidade das terras era registrada em nome de mais de um membro da família.
“O aumento do número de cotistas pessoas físicas para que seja mantida a isenção do IR do Fiagro, de 50 para 500 membros, e a exigência de que as cotas sejam exclusivamente negociadas em bolsa ou no mercado de balcão da B3 vai praticamente impossibilitar grandes grupos familiares de usar o Fiagro para estruturação e planejamento familiar”, afirma Henrique Erbolato, sócio tributário do Santos Neto Advogados.
A MP prevê a cobrança de 15% a 20% sobre rendimentos de fundos exclusivos. O texto da MP 1.184/2023 altera exatamente a terceira regra, da quantidade de cotistas – previstas na Lei 11.033, de 2004 –, que passa de 50 para 500.
Colaborou: Elaine Cotta.