A proposta de negócio da startup umgrauemeio já está posta em seu nome. Segundo o CEO Rogerio Cavalcante, a companhia, que atua na detecção de incêndios em florestas e plantações por meio de imagens de satélite, câmeras e inteligência artificial, se propõe a ser um grande aliado no desafio de evitar que a temperatura do planeta se eleve, nas próximas décadas, mais de 1,5 graus celsius.
“Quando soube que 20% das emissões de CO2 no planeta eram decorrentes de incêndios no planeta eu pensei: muitos falam em carbono zero, mas mesmo após trocar as matrizes energéticas, o efeito prático demora. Mas há um meio efetivo, rápido e barato para reduzir as emissões desde o primeiro dia de implementação”, afirma Cavalcanti.
Esse meio é tentar agir rápido contra algumas das principais causas de emissões de gases de efeito estufa. Uma delas, das mais danosas, é a queima de árvores em incêndios florestais, problema recorrente em países com grandes áreas de reservas nativas ou matas plantadas, como o Brasil, Austrália e Canadá – que enfrenta agora uma intensa temporada de fogo, com impactos ambientais afetando vários países em todo o mundo.
Assim, o primeiro objetivo da umgrauemeio foi o desenvolvimento de um sistema capaz de usar tecnologia de ponta, como sistemas de inteligência artificial e câmeras sofisticadas de vídeo, para monitorar grandes áreas e gerar alertas ao primeiro sinal de fumaça.
“Começamos como uma empresa de detecção de incêndio, mas hoje somos mais do que isso”, afirmou Cavalcante ao podcast Rural Ventures, apresentado por Fernando Rodrigues, CEO da Rural Ventures, e Kieran Gartlan, sócio e responsável pela operação no Brasil da Yield Lab, gestora americana especializada em fundos para investimento em agtechs e foodtechs.
Criada em 2016 e remodelada em 2019, a umgrauemeio atualmente cobre quase 9 milhões de hectares e conta com clientes de peso. Na silvicultura, tem parcerias com a Suzano e a Irani, do ramo de papel e celulose. No segmento da cana-de-açúcar, a Raízen.
Essa última, inclusive, foi uma das impulsionadoras da ideia, logo no ínício, quando precisou de uma solução para combater os incêndios nas suas plantações de cana.
Em média, são observados entre 300 e 400 focos de incêndio por safra de cana de açúcar no Brasil. “Estamos falando em 4% da cana perdida por ano”, comenta Cavalcante.
Na detecção dos incêndios, o sistema da umgrauemeio atua com câmeras instaladas em torres, com visão 360º. Elas fornecem dados para uma inteligência artificial que detecta, em segundos, qualquer fumaça num raio de no mínimo 15km. Isso corresponde, segundo o CEO, a uma área em torno de 70 mil hectares.
A empresa instala esse hardware, que funciona num esquema de mensalidade para os clientes, e quando algo é detectado pelas câmeras, as informações necessárias são enviadas por aplicativos de mensagens para o produtor ou brigadas conterem o problema.
“A detecção era o ponto inicial e o foco do problema, mas tivemos como propósito ir atrás do menor impacto possível, , explicou Eimi Arikawa, diretora geral e comercial da startup. “Então moldamos ferramentas de planejamento para o cliente tomar o melhor proveito das informações, tudo isso em um único lugar”.
Sem o produto da startup, uma fumaça é detectada ou por imagens de satélites ou pelo próprio olho humano. O problema é que desde o primeiro foco de incêndio até o início do combate, podem se passar horas.
“Quanto antes ocorre a detecção, menos recurso é utilizado para apagar o fogo e menos prejuízo uma plantação ou reserva têm”, comenta o CEO da umgrauemeio.
Cavalcante ainda ressalta que o olho humano só enxerga até 9km. “Se o profissional que fica em torres monitorando com binóculos vê uma fumaça, significa que já tem fogo há muito tempo no local inicial”, acrescentou.
Para além da detecção de fumaça, o sistema da startup identifica a presença de atividade humana próxima à plantação. Segundo os executivos, 95% das queimadas do país tem um fator antrópico, ou seja, são provenientes de atitudes humanas. Dentro da gama de captações do sistema, a maior parte é ocorrência em beira de estrada.
Além dos clientes citados, a empresa tem feito parcerias com o poder público e outras gigantes do agro. O CEO cita o projeto “Abrace uma Floresta” e o projeto “Abrace o Pantanal”.
No segundo, a empresa atuou com o financiamento da JBS e, em parceria com organizações como a Aliança da Terra, o Sesc Pantanal e Instituto Homem Pantaneiro, monitorou cerca de 2,5 milhões de hectares na região.
Nas estimativas da umgrauemeio, houve uma redução de 70% nos incêndios na região após as grandes queimadas registradas em 2020.
Captação com investidores
Apesar de contar com grandes clientes, a companhia ainda busca mais fontes de financiamento. Atualmente está participando de uma rodada de captação de R$ 15 milhões, nos quais R$ 10 milhões já tiveram contratos fechados.
Os recursos captados serão utilizados em diversas frentes. A primeira ideia é escalar o projeto, com olhares voltados até mesmo para fora do Brasil.
“Queremos captar para acelerar, tanto em relação a produto, hardware e equipe. O dinheiro não vai ser para Capex (investimentos de longo prazo) e sim para Opex (investimentos de curto prazo)”, diz.
Além disso, o CEO comenta que a empresa emitiu um CRA (Certificado de Recebimento do Agronegócio) anos atrás para dar tração ao negócio. Porém, como se trata de um título de dívida, o momento atual de juros altos faz a conta ficar mais cara na prática.
A dívida foi emitida em 2021, no valor de R$ 8 milhões. O CRA foi feito em parceria com a Ecoagro e a Guide Investimentos, e foi considerado do tipo verde. Na época, a empresa declarou que queria atingir os 2,4 milhões de hectares monitorados com o investimento.
Com isso, parte do dinheiro da captação dessa rodada de investimentos será utilizado no pagamento dessas dívidas atuais, para reduzir a exposição aos juros.
“Os investidores de capital de risco (Venture Capital) não olhavam para a sustentabilidade cinco anos atrás. Hoje o momento é diferente, com a agenda ESG e os incêndios se tornando uma discussão crescente”, avaliou o executivo.