Um dos maiores sistemas de cooperativas de crédito do Brasil, o Sicredi, está prevendo crescer "mais de 20%" em 2023 e para isso aposta na maior presença junto aos produtores rurais da região Nordeste.
Em entrevista ao AgFeed, o diretor de crédito da instituição, Gustavo Freitas, afirmou que o crescimento da carteira de crédito em 2022 foi de 29% e que a perspectiva segue otimista para este ano.
A estratégia para manter o ritmo acelerado passa pela diversificação das regiões em que atua. Fundado há mais de 100 anos na região Sul do país, onde tem preseça mais forte, o Sistema Crédito Cooperativo (Sicredi) vem avançando também nas últimas décadas no Sudeste e no Centro-Oeste.
Agora, segundo diz, é a vez da região Nordeste, que também é foco de algumas das políticas anunciadas no Plano Safra 2023/2024, ganhar mais atenção do grupo.
“Temos uma atuação muito maior em força, volume e histórico, na região Sul, bem como um pedaço do Sudeste. São 120 anos de atuação no Sul, 30 no Sudeste e, no Nordeste, apenas 7 anos. Temos feito essa expansão de forma cuidadosa para chegar mais rápido”, afirmou Gustavo Freitas.
Atualmente, os recursos destinados ao Plano Safra, por exemplo, estão 90% concentrados nas outras regiões. Para assumir uma posição mais vibrante no Nordeste, a empresa tem focado em cidades que são estratégicas.
Um exemplo dessa estratégia, que deve agora ser intensificada, é Luís Eduardo Magalhães, na Bahia. Um dos mais importantes municípios do agronegócio brasileiro, Só passou a contar com agência do Sicredi em 2020.
Porta de entrada para a região do Matopiba (que engloba áreas dos estados Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), a cidade foi uma das que mais cresceu na última década, segundo o Censo 2022, divulgado na semana passada pelo IBGE, tendo registrado um aumento de 79% em sua população, enquanto a média brasileira foi de 6,5% no período.
Até junho de 2024, o Sicredi pretende disponibilizar R$ 60 bilhões em créditos para produtores rurais, num movimento que deve atingir cerca de 270 mil produtores e somar cerca de 375 mil operações.
O volume fica próximo da carteira de agro da instituição, que gira em torno dos R$ 70 bilhões. Esse montante, que corresponde a cerca de 10% do total do Sicredi como um todo, engloba cerca de 695 mil associados, sendo 85% desse total pequenos produtores.
Essa carteira, vale dizer, só fica atrás da carteira de agro do Banco do Brasil, que possui cerca de R$ 322 bilhões.
Os R$ 60 bilhões desta temporada correspondem a um aumento de 16% em relação ao que foi registrado na última safra.
Com isso, a área atendida em número de produtores deve crescer cerca de 30%.
“O mesmo hectare de soja conta hoje com um custo menor. O preço para plantar cada hectare vai ser, na média, menor que no ano passado. Então de certa forma o produtor precisa de um valor menor de crédito para fazer o custeio”, comenta Freitas.
No plano do Sicredi, serão cerca de R$ 23,3 bilhões para linhas de custeio e R$ 11,5 bilhões para investimentos. Somado a isso, serão R$ 24 bilhões para as chamadas CPRs, as Cédulas de Produtores Rurais.
Um total de 88% das operações serão destinadas para o pequeno e médio produtor, com R$ 11,8 bilhões garantidos para agricultura familiar, R$ 11,5 bilhões para o médio e R$ 12,4 bilhões para os demais.
Em termos de juros, a média do produtor parceiro do Sicredi está em torno de 3% a 5% nas linhas do Pronaf, o crédito familiar. O percentual menor é feito em casos de produtores com práticas sustentáveis ou no caso de produtoras mulheres.
Os desafios do "Plano Verde"
O Plano Safra anunciado pelo governo, que prevê incentivos para produtores que adotam práticas com foco na agricultura de baixo carbono, ainda tem seus desafios de implementação, na avaliação do Sicredi.
Gustavo Freitas acredita que uma aplicação mais fácil será aquela que pode enquadrar os produtores que praticam as chamadas “boas práticas”.
É considerada mais simples pois a comprovação pode ser feita pela apresentação de uma nota fiscal, por exemplo, ou pela prática em si, disse ele.
“Se o produtor comprar calcário para melhorar o solo ou cuidar de um solo degradado, se tem prática orgânica ou usa bioinsumos pode ser comprovado facilmente”, destacou Freitas.
O problema, no outro bloco do plano, segundo o executivo, são aqueles produtores rurais que precisam comprovar que fizeram – e tiveram analisados - o Cadastro Ambiental Rural (CAR).
Pelo que convivemos no dia a dia dos produtores, esses processos tecnológicos de consulta e de validação nos causam dúvidas da praticidade”, afirma.
O governo assumiu o compromisso de uma redução de 0,5 ponto percentual na taxa de juros para cada prática dos produtores rurais que possuírem o CAR analisado e regularizado – número ainda muito baixo, nacionalmente, em função de trâmites burocráticos nos estados.
Com isso, os executivos do Sicredi acreditam que somente nos próximos planos essa linha pode estar mais estruturada. O que importa, na visão deles, é esse primeiro passo.
Inadimplência baixa
A presença do Sicredi no segmento do agronegócio revela um setor com índices de inadimplência bem abaixo de outras áreas.
Segundo o diretor do Sicredi, isso acontece é baixa porque o produtor rural é associado e tem relacionamento ativo com as cooperativas de crédito.
Freitas afirma que os clientes costumam fazer financiamentos até 3 vezes por ano. “Por isso a taxa de inadimplência na carteira agro é de menos de 1%”, diz.
Quando se olha para o conjunto das carteiras do Sicredi, incluindo todos os segmentos, esse índice, antes da pandemia, era de 1,6%. Agora, está próximo de 2%.
Nem mesmo o cenário de preços mais baixos das commodities e o aumento em pedidos de recuperação judicial no setor representam, de acordo com Freitas, riscos de aumento na inadimplência.
"A próxima safra tem um custo de insumos bem menor e a margem tende a melhorar para o produtor", afirma.
Ele admite, no entanto, que, nos casos de arrendamento, quem arrendou a terra num patamar mais alto de preço da saca de soja não está interessado na questão dos custos, quer receber o que foi contratado.
"Produtores alavancados, assim, podem ter descasamento, tendo de pagar um arrendamento mais alto do que pode colher”, diz.
“Mas tudo isso é um choque temporário, a perspectiva ainda é positiva, com boa relação de troca. A dificuldade é escoar e vender essa produção grande, fazer a armazenagem", avalia o executivo.
Freitas explica que as 105 cooperativas que compõem o Sicredi têm como teto de financiamento o seu próprio patrimônio.
“Por isso não temos exposição muito grande ou relevante como outros. Não financiamos usinas de açúcar, por exemplo, até porque esse financiamento é bem grande, falamos da casa de bilhão de reais, para bancos maiores".