O ano de 2024 começou difícil para a Cooperativa Vinícola Garibaldi, uma das maiores do setor vitivinícola do Rio Grande do Sul, sediada na cidade de mesmo nome.

A Garibaldi já iniciou o ano que passou com uma quebra de safra, levando a uma queda de 35% no volume de uvas recebidas pela cooperativa – que passou dos costumeiros 28 a 30 milhões de quilos para 18 milhões de quilos.

Ainda no primeiro semestre, novo susto: em maio do ano passado, as enchentes que afetaram boa parte do Rio Grande do Sul também impactaram negativamente os negócios da Garibaldi.

Associados da cooperativa perderam seus parreirais e a filial da Garibaldi na capital gaúcha, Porto Alegre, alagou. Com isso, a vinícola teve perda de grande volume de produto que estava armazenado no local.

“Foi um ano de sustos, surpresas e, isso, de certa forma, nos preocupou no início”, recorda Alexandre Angonezi, diretor executivo da Garibaldi, em entrevista ao AgFeed.

“Mas na medida que o ano foi transcorrendo e a gente foi executando o planejamento estratégico, as coisas foram entrando nos eixos, vamos dizer assim. Conseguimos superar essas dificuldades.”

A Garibaldi ainda está fechando os dados de suas demonstrações financeiras, mas o número deve superar a faixa dos R$ 300 milhões, crescimento de 15% em relação a 2023.

“Conseguimos superar a dificuldade de falta de matéria-prima com o estoque que tínhamos e conseguimos fechar um ano muito bom, de crescimento e melhoria de resultados para a cooperativa”, diz Angonezi.

O crescimento da vinícola no ano que passou também foi ancorado pelo lançamento de novos produtos.

A Garibaldi tem mais de 80 itens em seu portfólio. O carro-chefe são os espumantes, que continuaram sendo lançados no ano passado, mas a vinícola também tem respondido à uma demanda crescente nos últimos anos por produtos mais leves, com menor teor alcoólico ou até mesmo zero álcool.

A preferência dos consumidores por bebidas não alcoólicas é um fenômeno registrado em diferentes partes do mundo.

No ano passado, a Garibaldi lançou dois produtos zero álcool, o Moscato Zero Álcool Rosé e o Prosecco Zero Álcool.

“O Moscato Zero Álcool é muito parecido, muito semelhante a um espumante Moscatel, produto bem aromático e doce. E o Prosecco Zero Álcool é muito próximo a um espumante Brut”, explica Angonezi.

Além dos produtos zero álcool, a Garibaldi lançou também um vinho tinto da variedade Tannat, um vinho branco pioneiro no Brasil, o Pálava, a partir de uma variedade de uvas originárias da República Tcheca, e dois espumantes Brut e Moscatel, em uma embalagem menor, chamada de Baby, com 187 mL.

A ideia é lançar novos produtos com menor teor alcoólico em 2025. “Não necessariamente zero álcool, mas também zero álcool. Já definido o lançamento de mais uma linha de espumantes da linha zero álcool, por exemplo”, afirma Angonezi.

Safra positiva

A perspectiva da Garibaldi para 2025 é positiva, com uma safra que está prestes a ser totalmente colhida, com volume esperado de 28 milhões de quilos de uva. Mais da metade desse montante total já foi recebido pela vinícola.

“Se no ano anterior nós tivemos as dificuldades do El Niño, neste ano nós tivemos, em boa parte, o aspecto positivo do La Niña. Para o nosso setor, o La Niña é bom. A uva não gosta de muita chuva. É diferente do que acontece, por exemplo, no setor de grãos”, afirma Angonezi.

A ideia é também que o faturamento siga crescendo neste ano. “Deve chegar a 15% em relação ao valor registrado em 2024”, afirma o diretor executivo da Garibaldi.

“A gente está com uma perspectiva bem positiva em relação ao ano. Apesar das dificuldades que teremos, porque o cenário macroeconômico talvez não seja tão favorável, em função de taxas de juros, custos, inflação. De qualquer forma, a gente segue com o planejamento e pretendemos continuar com o crescimento da competitiva”, diz Angonezi.

Com uma operação já consolidada, a Garibaldi investiu ao longo do ano passado um valor que Angonezi considera “pequeno”, de R$ 6 milhões, especialmente em armazenagem, elaboração, processamento, melhorias de qualidade e tecnologia.

“A situação de investimentos está complicada em função das taxas de juros, mas não paramos de investir para garantir continuidade de crescimento da cooperativa e melhorias de qualidade no processo”, afirma.

A ideia é continuar crescendo dentro do Brasil. A maior parte da produção da Garibaldi é direcionada para o mercado interno, principalmente para as regiões Sul e Sudeste.

Um pequeno volume é exportado para países como Estados Unidos, mas a quantidade de remessas é muito pequena, cerca de 1% do total.

Por enquanto, a Garibaldi prefere se concentrar no mercado brasileiro, onde vê potencial de crescimento.

Angonezi cita que o consumo de vinhos em geral gira entre 2,3 litros a 2,4 litros per capita ano no Brasil.

“Vem crescendo, mas a passos lerdos e, infelizmente, boa parte desse crescimento tem sido absorvido pelo produto importado. Principalmente falando de vinhos finos”, afirma

Com isso, a Garibaldi foca especialmente no potencial trazido de crescimento vindo dos espumantes.

“Hoje, o consumo per capita de espumantes no Brasil hoje é cerca de 200 mL por ano. Pensando na população em idade de consumo, ainda é um mercado bastante pequeno, com potencial para crescer”, diz Angonezi.

Os espumantes são o carro-chefe do faturamento da vinícola, responsável por mais de 40% do total, seguido pelo suco de uva, vinhos finos, vinhos de mesa, zero álcool e filtrado doce.

A Garibaldi tem quase 100 anos de história. Fundada em 1931 na cidade que dá nome à cooperativa por imigrantes italianos que introduziram a uva na Serra gaúcha, a vinícola tem 470 associados em 18 municípios da região, pequenos produtores de agricultura familiar.

Em 2023, a cooperativa se viu envolvida em uma operação do Ministério Público do Trabalho (MPT), que resgatou 207 trabalhadores em situação análoga à escravidão em Bento Gonçalves, cidade da Serra gaúcha.

Eles prestavam serviços a uma empresa terceirizada que era contratada pelas vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi, e atuavam na colheita das uvas.

As empresas firmaram um termo de ajustamento de conduta com o MPT e se comprometeram a pagar um valor de R$ 7 milhões em indenizações de danos morais individuais e coletivos.

As vinícolas assumiram, na ocasião, o compromisso de exigir e fiscalizar que as empresas contratadas para prestação de serviços assinem a carteira de trabalho de seus funcionários, além de monitorar também condições de trabalho, segurança, higiene e salubridade.

Angonezi diz que a companhia revisitou desde então suas políticas trabalhistas para explicar o que havia acontecido e também passou a utilizar um aplicativo para registrar as condições de trabalho.