Uma usina quebrada, com 90% dos seus ativos tomados pelos bancos, sem condições de continuar operando e com uma relevância grande para a economia de uma região no interior de São Paulo.
Este foi o cenário assumido pelos irmãos Dorival e Dirceu Finotti, empresários e produtores de cana de açúcar na região de Ibirarema, cidade do interior paulista a quase 400 quilômetros da capital, perto da divisa com o Paraná.
Ex-fornecedores da Usina Pau D’Alho, os dois resolveram mudar de lado e tomar o controle da empresa em 2019. Procuraram Sylvio Valle, presidente da Associação Rural dos Fornecedores e Plantadores de Cana da Média Sorocabana (Assocana), na esperança de atrair mais canavieiros para o negócio. Valle topou e os três fundaram a Enersugar.
Foram investidos cerca de R$ 100 milhões para recuperar a planta, colocá-la em operação, já pensando em ampliar o volume de moagem.
Segundo Melchiades Terciotti, diretor geral da Enersugar, a usina começou a operar em 2020, processando 340 mil toneladas de cana produzidas pelos próprios sócios, como forma de testar e ajustar a planta.
“A partir daí, como vimos que o resultado foi positivo, passamos para 735 mil toneladas em 2021, e passamos de 1 milhão de toneladas em 2022”, conta Terciotti.
Para 2023, a perspectiva é de moagem de 1,5 milhão de toneladas pela Enersugar, com faturamento de R$ 420 milhões. “Nos próximos dois anos, temos o cenário de atingir a capacidade máxima instalada atualmente, de 2 milhões de toneladas de cana moída”, projeta o executivo.
A Enersugar planeja e já possui até a licença para expandir sua capacidade para até 3,5 milhões de toneladas por ano. “Essa expansão vamos fazer de acordo com as condições do mercado de açúcar e etanol. Nem precisamos realizar tudo de uma vez”, conta Terciotti.
A empreitada dos produtores contou também com a ajuda da gestora americana Amerra Capital, que aportou US$ 25 milhões direcionados principalmente na reestruturação física da usina.
Segundo o sócio Sylvio Valle, a Amerra é sócia do empreendimento, mas no contrato, a relação está prevista para terminar quando a Enersugar quitar o valor investido pela gestora.
No entanto, a própria Amerra estaria, segundo os sócios, interessada em permanecer como investidora na companhia.
“Vejo com naturalidade este interesse de investidores no negócio. Mas não estamos procurando. Quando tiver que acontecer, terá que ser boa para a indústria como um todo, com a condição de manter o bom relacionamento que construímos com os fornecedores”, afirma Dirceu Finotti.
Esta relação com os produtores da região é um dos pilares da estratégia da Enersugar, segundo Sylvio Valle. “Nós reerguemos a usina porque temos nomes respeitados na região. Tivemos que superar o histórico negativo com nossa credibilidade. Somos produtores, isso ajuda muito”.
Os dois sócios contam que, quando tiveram a ideia, a sociedade foi oferecida a vários produtores da região, que recusaram o convite. “Depois que a onça está morta, todo mundo quer tirar foto”, brinca Finotti.
Valle lembra que, mesmo depois de assumirem a usina, em 2019, houve alguns solavancos. “Tivemos que enfrentar uma seca severa entre 2019 e 2020”, conta.
Tecnologia traz novos mercados
Um plano que gera bastante entusiasmo nos sócios e no diretor da Enersugar é a produção de itens resultantes da produção de açúcar e álcool, que neste ano devem ser de 128 mil toneladas açúcar e 38 milhões de litros de etanol.
“Mas acredito que o grande crescimento da indústria vai acontecer no universo periférico”, afirma Finotti.
Terciotti afirma que estão nos planos da Enersugar atuar com o processamento da levedura seca da cana, voltado para nutrição animal, especialmente de pets. “Isso resulta em um produto diferenciado, em uma proteína nobre para o animal”, diz o diretor da usina.
Os resíduos do processo de moagem podem ainda ser utilizados como fertilizantes organominerais, com resultados melhores que os químicos, segundo Terciotti.
Há também a possibilidade de utilização da linhaça também para fertilizar lavouras, em seu estado natural, e para produção de biometano, um gás combustível renovável.
“A questão é esperar a maturação das tecnologias para este tipo de produção. Mas acredito que podemos começar a implementar parte desses novos processos em um ou dois anos”, diz o executivo.
Ainda sobre o futuro, a Enersugar não pretende ter produção própria de cana, segundo Valle. “Se começar a faltar cana para moer, podemos procurar alguma alternativa. Mas não pensamos em ter algo próprio”.
Terciotti conta que a Enersugar inclusive ajuda os produtores da região a conseguirem crédito. A usina tem parceria com instituições como Bradesco e Banco do Brasil, e entra como anuente nas operações com os produtores.
A companhia olha também para o etanol de milho. Segundo Terciotti, o produto pode ser complementar ao de cana.
“Não vejo como concorrência, até porque a demanda global tem aumentado e vai aumentar mais. Está nos nossos planos produzir milho para etanol”, conta.