O Brasil é um país com abundância na produção de açúcar, algo que se reflete no consumo. Mas o mel vem ganhando espaço e, por isso, deixou de ser tratado como um remédio contra gripe e dor de garganta e hoje tem status de alimento.
Esta é a conclusão de Daniel Cavalcante, que é CEO da Baldoni, empresa que processa e produz mel, e também presidente da A.B.E.L.H.A, a Associação Brasileira de Estudo das Abelhas.
A Baldoni tem 40 anos de existência, mas Cavalcante comprou e assumiu o comando da empresa há seis anos. “Em 2016, a produção era de 800 quilos por mês. Atualmente, variamos entre 10 a 15 toneladas de mel por dia”, conta o executivo.
Nos últimos seis anos, o valor de mercado da empresa foi multiplicado por 200, segundo Cavalcante. “Em 2023, nosso faturamento vai crescer entre 35% a 40% na comparação com 2022”, revela.
O próximo passo é aumentar de forma significativa a produção de mel dentro de casa. “Nosso projeto é ter 80% de produção própria em cinco anos. Hoje, a relação é a inversa, produzimos 20% e compramos 80% de outros produtores”, diz Cavalcante.
Uma das grandes preocupações de Cavalcante, sobre a Baldoni e o mercado em geral, é a qualidade do mel que chega ao consumidor.
“Dentro da companhia, nós resolvemos isso fazendo o licenciamento de marca. Conversamos com o Maurício de Souza, e fechamos parceria para vender o mel da Turma da Mônica. Para isso, tivemos que passar por auditorias, inclusive de qualidade”, diz o CEO.
Em relação ao mercado de mel no Brasil, o presidente da Associação aponta o problema da fraude.
“Muitas vezes, esse produto que se vende em beira de estrada ou nas ruas, em garrafas, não é mel, é xarope de glicose. Não dá para dizer que são todos, claro. Mas acontece muito”, diz.
Ele lembra que o mel passa por um processo de fiscalização pelo Ministério da Agricultura e Pecuária muito parecido com o que é realizado no leite. “As pessoas não compram leite na beira da estrada, sem ter o selo do Mapa”.
Mas a fraude está longe de ser o maior obstáculo para a evolução do mercado de mel no Brasil. Além do açúcar, a baixa produtividade em relação a outros países é um problema a ser atacado.
“Segundo dados do IBGE de 2021, nós produzimos 55 mil toneladas de mel com 3 milhões de colméias, ou seja, menos de 20kg por colméia ao ano. A Argentina produz 40 mil toneladas com 2 milhões de colméias”, diz Cavalcante.
Para ele, aumentar a produtividade passa por educação e tecnologia. “Na parte da educação, nós temos um projeto de escola técnica voltada para a formação de apicultores. É uma cadeira que não está na maioria das universidades, e nós precisamos dessa formação”, diz Cavalcante.
A escola fica no município de Espírito Santo dos Pinhais, a cerca de 100 quilômetros de Campinas, no interior de São Paulo, onde fica a sede da Baldoni.
“Os formandos já saem empregados pela Baldoni. Eles começam aqui cuidando de 200 colméias, e a ideia é que eles evoluam até mil colméias cada”, diz o executivo. Dois jovens, uma menina de 19 anos e um menino de 20 anos, já trabalham na empresa.
No campo tecnológico, o executivo aponta avanços principalmente no manejo das colméias de cativeiro, em que a madeira ainda é o material mais utilizado.
A Baldoni participa de um projeto, nos Estados Unidos, de caixas feitas de polímero de cimento com impressão 3D, que ficam prontas em menos de quatro horas, e oferecem um maior controle de temperatura interna da colméia, evitando os eventos climáticos extremos.
Ele cita ainda aplicativos que conseguem medir o nível de atividade das abelhas dentro das colméias, detectando a causa de um aumento de stress. “Em caso de morte da rainha, por exemplo, é possível fazer a reposição mais rapidamente”, conta.
Tudo isso porque Cavalcante enxerga um grande potencial de crescimento para o mel, tanto no Brasil quanto no exterior.
“O Brasil ainda tem um consumo muito baixo, de 60 gramas por pessoa ao ano. Para se ter uma ideia, no Estados Unidos é 1 quilo por pessoa. A média mundial é de 240 gramas por pessoa ao ano”, diz Cavalcante.
Em exportações, a pandemia apresentou um pico de demanda global pelo produto, e o Brasil passou de 25 mil toneladas em 2019 para chegar ao pico de 45 mil toneladas. “Agora, este volume está voltando aos patamares pré-pandemia, mas a demanda continua em alta”. Estados Unidos e Alemanha são responsáveis por 90% do mel exportado pelo Brasil.
Cavalcante conta que a espécie de abelha predominante no Brasil, que é um híbrido da africana com a europeia, é mais resistente a doenças. “Isso diminui a necessidade do uso de medicamentos, e aumenta a qualidade do mel”.
Segundo o executivo, a produção de mel no Brasil é bem espalhada, com destaque para o Rio Grande do Sul. “O Nordeste, especialmente a região da Caatinga, tem aumentado bastante também. São muitas floradas por ano naquela região, especialmente no Piauí”.
Após a chegada de Cavalcante, a Baldoni começou a produzir outros itens com maior valor agregado, como a geléia de frutas adoçada com mel. “Nós começamos a vender em 2019, retiramos do mercado, e agora estamos relançando, com grande procura pelos varejistas”, diz o executivo.
Ele conta que o mercado ainda precisa ter dados mais formais, mas que em levantamento interno feito pela Baldoni, são cerca de 150 marcas de mel no Brasil.
“Nós temos entre 20% a 25% de participação. Temos conversado com a Nielsen para tentar uma auditoria, mas os custos são elevados. Precisamos da contribuição de todo o setor, que ainda é pouco organizado”, diz Cavalcante.