Como tudo que envolve a família Cutrale, o anúncio foi discreto. Na última sexta-feira, 13 de dezembro, a Fresh Express, uma das maiores empresas de saladas prontas dos Estados Unidos, usou uma simples nota para informar ao mercado a aquisição da McEntire Produce, companhia processadora, reembaladora e atacadista de produtos frescos que fornece para a indústria americana de serviços alimentícios.

Como também é praxe nos movimentos do grupo fundado por José Cutrale, no final dos anos 1960, e sediado na cidade paulista de Araraquara, não se falou em cifras, que certamente giraram na casa dos nove dígitos, em dólar.

O que fica sempre evidente, entretanto, é o apetite do grupo brasileiro, agora comandado pela terceira geração, em ampliar e diversificar seus negócios globalmente.

Os Cutrale ganharam fama como reis da laranja, graças sobretudo aos movimentos realizados a partir dos anos 1990 por José Luis, filho de José, ao levar sua marca para os Estados Unidos e, depois, para outros países do mundo, abrindo as portas para a citricultura brasileira conquistar 70% do mercado global de suco da fruta.

Na última década, a orientação dada por José Luís, que morreu em 2022, aos seus filhos José Henrique e Junior é manter o olhar global, mas posicionar a empresa como uma gigante da alimentação saudável.

A aquisição feita pela Fresh Express é uma demonstração de que eles seguem o plano estabelecido pelo pai. A companhia é controlada integralmente pela Chiquita Brands, uma das maiores produtoras e exportadoras de bananas do mundo, comprada em 2014 pelos Cutrale em sociedade com o banqueiro Joseph Safra, por US$ 1,3 bilhão.

Com o mercado de suco de laranja sofrendo intensa concorrência de outros segmentos de bebidas, como os energéticos e os chamados smoothies, o grupo colocou em seu radar a expansão dentro de um conceito mais amplo: o da alimentação saudável.

A Fresh Express foi uma das pioneiras desse segmento, ao lançar, em 1980, a categoria das saladas embaladas prontas para consumo. Hoje, esse segmento movimenta mais de US$ 5 bilhões ao ano nos Estados Unidos, com mais de 14 milhões de consumidores semanais.

Já há alguns anos o grupo vem investindo na ideia da consolidação desse mercado, com a criação de uma empresa de alcance nacional nos Estados Unidos e, eventualmente, com fôlego internacional, aproveitando as sinergias com a estrutura logística de alcance global da Cutrale e da Chiquita – que possuem navios e terminais próprios nas Américas, na Europa e na Ásia.

Em 2023, a empresa chegou a anunciar um acordo para a compra da divisão de vegetais frescos da irlandesa Dole, que compete com a Chiquita no mercado internacional de bananas, por cerca de US$ 300 milhões.

A aquisição sofreu, entretanto, severas restrições das autoridades concorrenciais nos Estados Unidos, sob a alegação de que o grupo teria influência muito grande sobre produtores de verduras no país e também junto aos varejistas.

Diante das dificuldades de concretizar o acordo, as duas empresas anunciaram, em março deste ano, a desistência do negócio. Na ocasião, John P. Olivo, CEO da Fresh Express, afirmou que já buscava alternativas para manter o plano de crescimento. Nove meses depois, uma delas resultou em negócio.

Com a compra da McEntire, a companhia controlada pelos Cutrale, cujas operações estavam mais concentradas na Costa Oeste dos EUA – onde estão também as maiores áreas produtoras de vegetais do país –, passa a contar com maior presença também na Costa Leste.

A empresa passa a contar com uma nova divisão de Food Service, para abastecimento a restaurantes e a indústria de alimentos, e uma estrutura com seis plantas em todas as regiões do país.

“Isso aumentará significativamente nossas ofertas e serviços para clientes e consumidores de serviços de alimentação por meio de maiores investimentos em inovação, eficiência e segurança alimentar, e realizaremos uma integração perfeita dos pontos fortes e funcionários da empresa", disse Olivo em um comunicado.]

A Fresh Express não divulga dados de receita ou lucro. Sua controladora, a Chiquita Brands, fatura mais de US$ 3 bilhões anuais e vende seus produtos em mais de 70 países.

A nova aposta da laranja

Enquanto expande seus negócios em outras áreas, a família Cutrale mantém-se atenta aos ciclos da citricultura e do mercado de suco de laranja.

Com a produção global em queda – sobretudo nos Estados Unidos, segundo maior produtor mundial –, a empresa tem feito movimentos também no Brasil para abrir novas áreas para seus pomares e, assim, proteger-se do avanço do greening, doença com alto poder devastador nos laranjais e que tem se alastrado pelo cinturão citrícola de São Paulo e Minas Gerais.

Em março passado, o AgFeed antecipou que a empresa estava fazendo um investimento de R$ 500 milhões na implantação de um pomar de 5 mil hectares no município de Cidrolândia, no Mato Grosso do Sul.

O plantio dos pomares começou efetivamente há cerca de um mês, segundo informou a companhia ao governo do estado.

A Cutrale produzirá laranjas na Fazenda Aracoara, pertencente ao grupo, em sistema irrigado – o que confere maior controle das condições hídricas e, portanto, produtividades elevadas. Mais de 1,7 milhão de árvores devem compor o pomar da Cutrale.

Durante dois anos a empresa realizou testes em uma área de 145 hectares, avaliando a adaptação e o desenvolvimento de variedades ao solo arenoso da região.

Segundo o governo do MS, os Cutrale já teriam comunicado a intenção de dobrar o investimento, chegando a R$ 1 bilhão.