A empresa alemã centenária de saúde Boehringer Ingelheim separa, todo ano, 10% de tudo que vende para investir em pesquisa em desenvolvimento. No ano passado, as vendas somaram 4,6 bilhões de euros (o equivalente a mais de R$ 24 bilhões) e, com isso, mais de 400 milhões de euros (R$ 2,12 bilhões) foram destinados à área de inovação.

Dos laboratórios da companhia costumam sair medicamentos e vacinas que fizeram do grupo uma marca global no combate a doenças em humanos e animais. Cada vez mais, no entanto, a Boehringer entrega a seus clientes softwares e equipamentos digitais.

Uma nova geração desses produtos deve chegar em breve às propriedades rurais brasileiras. Em entrevista ao AgFeed, o diretor de Aves e Suínos da Boehringer Ingleheim no Brasil, Abílio Alessandri, disse que nos próximos meses a empresa deve começar a oferecer no País uma tecnologia, baseada em inteligência artificial (IA) e big data, que integrará todos os dados da cadeia suína, como peso e dados de vida do animal e de toda produção de uma fazenda.

“Através dessas tecnologias, vamos colocar os dados de forma a ajudar na prevenção de doenças. Na plataforma, o suinocultor poderá correlacionar alguns fatores, números e tomar uma decisão com antecedência”, diz.

Alessandri afirmou que a cadeia produtiva das agroindústrias já tem esses dados, mas eles estão fragmentados entre as diversas partes da cadeia, que envolve criadores de diferentes portes e qualificações.

“Às vezes o dado é caseiro, às vezes usa um software global. Na etapa do frigorífico, um novo sistema surge e, na análise econômica, um terceiro. E eles não se conversam”, complementa.

A ideia da Boehringer é sincronizar todos os dados e, a partir dali, dar insights sobre a relação entre produção, mortalidade e o rendimento do produtor, por exemplo. O serviço, a princípio, atenderá a cadeia de suínos, mas a ideia é expandir para outras com o passar do tempo.

Há alguns meses, a empresa já havia iniciado a importação de outra tecnologia baseada em inteligência artificial para o Brasil. O sistema SoundTalks utiliza microfones instalados ao redor de uma área para captar os sons emitidos pelos animais e, a partir da análise dos ruídos, avaliar a saúde do rebanho.

Com o som de tosse dos suínos, por exemplo, o sistema é capaz de predizer e informar ao suinocultor a ocorrência de problemas respiratórios, que segundo o diretor, são o principal problema da cadeia.

“Prevemos quando aquele lote ou rebanho vai apresentar sinais clínicos dias antes de eles se tornarem mais graves. Com isso, a empresa pode agir e mudar a estratégia, datas de vacinação, alojamento e até pensar na origem do próximo lote”, comenta Alessandri.

Crescimento animal

A Boehringer Inglelheim foi fundada na Alemanha em 1885 e desde então tem se mantido como uma empresa familiar. No Brasil, está presente desde 1953, quando abriu um escritório de importação de medicamentos.

Em 2017, a empresa comprou a Merial, numa troca de ativos com a Sanofi, antiga proprietária, reforçando sua divisão de saúde animal. Passou, então, a trabalhar com uma “linha de saúde única”, que considera a saúde humana e a animal como partes de uma mesma cadeia.

Xavier Andivia, head de Saúde Animal

Segundo Xavier Andivia, head de Saúde Animal da Boehringer Ingelheim no Brasil, essa aquisição da Merial deixou a saúde animal “ainda mais importante no portfólio”. No ano em que comprou a Merial, a receita da área saltou 170% comparada com 2016, e bateu os 3,9 bilhões de euros.

O executivo vê com bons olhos os próximos anos, e já projeta crescer no mercado de saúde animal brasileiro que, segundo Xavier Andivia, é o segundo mais importante no mundo, ficando atrás dos Estados Unidos.

Segundo dados da Pesquisa da Pecuária Municipal (PPM), divulgada na semana passada pelo IBGE, o Brasil contabilizou em 2022 um efetivo total de mais de 1,65 bilhão de galináceos (que engloba galos, galinhas, frangos, frangas, pintos e pintainhas) e um rebanho de 44,4 milhões de suínos. Os dados colocam o País como o quarto maior produtor e exportador de carne de porco do mundo.

“As exportações de frangos e suínos são muito significativas, e o crescimento nos últimos anos, puxado principalmente pela avicultura e por importações chinesas, têm mantido o setor como relevante”, comentou o executivo.

A saúde do setor de aves, inclusive, tem chamado a atenção do país como um todo. Neste ano, os casos de gripe aviária identificados em vários estados estremeceram o mercado, e causaram até embargos pontuais e temporários de importantes compradores – atualmente o Japão mantém suspensas as compras de frangos oriundos do estado do Mato Grosso do Sul.

Nesse ponto, o diretor de Aves e Suínos, Abílio Alessandri, relembra do conceito de “saúde única” que faz parte do negócio da empresa. “Pensamos na saúde desde o campo até a mesa do consumidor, e os casos de influenza estão muito ligados a isso”, diz.

Abílio Alessandri, diretor de Aves e Suínos

Nesse aspecto, ele afirma que a Boehringer atua muito forte com os clientes na biosseguridade, algo que segundo ele, é um dos diferenciais da operação brasileira. “É por isso que a influenza bate na porta todos os anos e não entra”.

Alessandri ressalta o trabalho em conjunto do setor, das empresas e de entidades como a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e vê um segmento unido nesse sentido.

Segundo Alessandri, pela quantidade de aves que temos no país, a vacinação, na qual a empresa é líder mundial em mercado, não é a solução mais adequada, pelo menos por enquanto.

Mesmo com esse fantasma, a projeção de vendas para o mercado de aves e suínos para este ano e o próximo é positiva para o executivo, o que pode aquecer ainda mais os negócios.

A ABPA avalia que, mesmo com as breves interrupções de embarques ocorridos, as exportações de carne de frango devem crescer 8% em 2023, chegando a algo entre 5,1 e 5,2 milhões de toneladas.

“Tivemos até maio um momento difícil em termos de preço, mas hoje o setor já está melhor por um custo de produção mais baixo. Nos suínos, devemos bater pela primeira vez uma média de 100 mil toneladas exportadas por mês, um crescimento de 12% anual”, comenta Alessandri

Além do mercado de animais do agro, o mercado pet chama a atenção da Boehringer Ingelheim. “A pandemia de Covid-19 puxou um avanço desse segmento, com pessoas que adotam cachorros, por exemplo, mais conscientes das doenças, prevenções e vacinas”, comentou.