A macaúba é uma palmeira que chega a atingir mais de 15 metros e viver 100 anos. De seus frutos pode ser extraído, em grandes quantidades, um óleo ainda pouco conhecido, mas com grande potencial.

Para a startup brasileira S.Oleum, a planta nativa do Cerrado e da caatinga – também conhecida como coco-baboso – é a estrela de um projeto ambicioso. A empresa pretende fazer dela, literalmente, o combustível de um grande projeto que combina produção de bioenergia com a recuperação de solos através de agricultura regenerativa.

Já incorporada ao processo produtivo da indústria de sabões, para a S.Oleum a macaúba será destinada à produção de combustível sustentável de aviação e diesel renovável.

A meta da empresa é cultivar, até 2029, 180 mil hectares, em sistema agroflorestal, e erguer, junto às lavouras, indústrias de processamento do óleo. Atualmente, são quase 3 mil hectares, já em fase inicial de produção, concentrados no noroeste de Minas Gerais, na cidade de João Pinheiro.

Para dar escala à produção, tanto em hectares quanto em unidades para processar o óleo colhido da macaúba, o CEO e cofundador da empresa, Francisco de Blanco, afirmou ao AgFeed, que sua missão é buscar investimentos

E não é pouco: segundo Blanco, são necessários cerca de US$ 4 bilhões até o fim da década. Nas contas do executivo, US$ 1,5 bilhão virão de capital privado (private equity) em rodadas de captação com fundos e investidores.

Até agora, a empresa já participou de duas. Na primeira, ainda na fase pré-seed, captou US$ 10 milhões para começar os trabalhos. "Recentemente lançamos a segunda rodada de captação, a ser concluída até o final desse ano, e estamos avançando com players globais do setor de energia, química, bens de consumo e agronegócio para captar US$ 120 milhões, para então iniciarmos a expansão das agroflorestas e concluir a engenharia dos sites bioindustriais", afirma o CEO.

Nas projeções da empresa e pelas conversas que já estão em andamento, está prevista nova injeção com mais US$ 250 milhões em 2025 e rodadas adicionais em 2027 e 2029, com investimentos que podem atingir de US$ 500 milhões até US$ 700 milhões.

O restante do montante deve vir pelo mercado de dívidas. “Devem ser outros US$ 2,5 bilhões em dívidas tomadas desde fornecedores de equipamentos que entram com suporte e até por linhas de sustentabilidade do BNDES. Além disso, devemos emitir títulos de dívida como green bonds e CRAs”, explica Blanco.

Para aliviar essa tomada de crédito vinda de fora, o CEO também não descarta financiar a escala do negócio com a venda de créditos de carbono, mas tudo vai depender do avanço da regulação desse mercado.

No final dessa primeira fase da companhia, se houver já uma demanda, o CEO avalia também a construção de uma biorrefinaria própria, para já produzir o biocombustível com o óleo da macaúba feita “em casa”. “Pode ter mais US$ 1,5 bilhão se houver essa construção”, acrescenta.

Dois pés no ESG

O discurso de captação traz atrativos reluzentes na atual onda de investimentos verdes. “Atuamos com a produção de matérias-primas sustentáveis com emissões de carbono negativas”, define a própria empresa em material institucional.

Fundada em 2020, A S.Oleum atua com agricultura regenerativa, reflorestando áreas degradadas com árvores nativas e produzindo óleos vegetais que podem ser usados em várias indústrias, como a de sabão e biocombustíveis.

Com parte dos recursos, a ideia é ampliar as áreas com plantações, primeiro ao redor da fazenda atual e depois para outros estados, mas sempre dentro do Cerrado, onde a macaúba consegue se desenvolver de melhor forma.

“Começamos com a domesticação da macaúba, desde a germinação até a parte em que a macaúba se tornou uma espécie agrícola. Percebemos uma necessidade de alternativas para o óleo de palma ou mais óleo no mercado de forma sustentável”, comentou, em uma conversa durante o evento World Agri-Tech Summit – realizado em São Paulo em junho – a diretora de sustentabilidade da S.Oleum, Aline Bernardes.

Nessa primeira fase do negócio, que vai até 2029, a empresa deve atuar com clusters de 35 mil hectares cada, de propriedades da própria S.Oleum. Em cada um deles o projeto prevê a instalação de uma indústria associada.

Para além da utilização da área como negócio, onde a S.Oleum consegue vender créditos de carbono, a empresa ainda vende os produtos derivados da macaúba.

Atualmente a companhia também produz e vende óleos e proteínas tanto da polpa da macaúba quanto da amêndoa da mesma.

“A macaúba é nossa espécie âncora, mas temos ambição de trabalhar com mais espécies da biodiversidade brasileira, como produtoras de óleo e outras do cerrado. Implantamos apenas em áreas degradadas ou de pouca produtividade e temos um compromisso de desmatamento zero”, comentou a executiva.

A empresa mantém ainda uma área destinada à pesquisa e desenvolvimento, onde testa as melhores práticas no desenvolvimento da macaúba. Ali, de mãos dadas com a S.Oleum, estão organizações como a Universidade Federal de Viçosa, a Universidade do Vale do Jequitinhonha e a Embrapa Bioenergia.

Para melhorar a produtividade, a empresa conta com uma área de tecnologia da informação, liderada pelo diretor Marcio Propp. Ele destacou que atualmente a empresa está focada em implantação de sistemas que possam gerar indicadores das fazendas, bem como a instalação de programas de gestão das áreas e sensores locais.

As origens da S.Oleum

Francisco de Blanco criou a empresa em parceria com Felipe Morbi, atual vice-presidente agroflorestal, e Rafael Pastori, atual secretário de governança.

Fransciso de Blanco, CEO da S.Oleum

Antes da S.Oleum, o CEO atuava com projetos relacionados ao desenvolvimento de cadeias produtivas para ativos relacionados a combustíveis.

Já Morbi trazia na bagagem a experiência como CEO da Acrotech e da Soleá, duas companhias com mais de 15 anos de dedicação à pesquisa, desenvolvimento e domesticação da macaúba. Na Soleá, Rafael Pastori também era fundador.

Em 2022, a S.Oleum acabou incorporando as duas empreitadas. A Acrotech foi fundada em 2007 pelo professor da e pesquisador Sérgio Motoike, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), e desenvolveu a tecnologia de quebra de dormência da semente da macaúba, o que possibilitou a produção de sementes pré-germinadas.

Para se ter uma ideia, na natureza a taxa de germinação natural ficava em torno de 2%. No processo, o pesquisador conseguiu transformar em 80%.

Morbi entrou na Acrotech como COO e, enquanto pesquisava mais sobre os potenciais da macaúba, percebeu uma oportunidade de entrar no mercado de produção de óleos e de biomassa.

Foi aí que Rafael Pastori entrou na jogada. Empresário do ramo metalúrgico, investiu no projeto junto com seu pai, Aurélio Pastori. Em 2010 eles criaram a Soleá, que focou na domesticação da macaúba para transformá-la numa cultura agrícola. Em 2012, a Soleá adquiriu a Acrotech.

Foi justamente nesse momento que a fazenda de 2,6 mil hectares da S.Oleum em João Pinheiro foi adquirida. Lá estão abrigados o banco de germoplasma da Acrotech, o programa de melhoramento genético e os campos experimentais. É a semente do plano ambicioso da S.Oleum.