Com a expectativa de redução na taxa básica de juros e o início do plantio de uma nova safra recorde, a Credicitrus, uma das maiores cooperativas de crédito do Brasil, já considera crescer mais de 20% em 2023, disse o CEO Walmir Segatto, ao AgFeed.
No primeiro semestre os ativos totais atingiram R$ 13,2 bilhões, um crescimento de 15,92% em relação ao mesmo período de 2022. Apesar de expressivo, o avanço foi menor do que o registrado em todo o ano passado, quando os ativos aumentaram 29,66% na comparação com 2021, mas suficiente para mantê-la como a maior cooperativa de crédito do País nesse quesito.
"Houve uma demanda maior por crédito no ano passado, depois veio o período de juros muito altos e agora estamos passando por um momento de transição", afirmou Segatto.
Entre os motivos para o crescimento menor no primeiro semestre, o executivo destaca o forte atraso na compra dos insumos por parte dos produtores rurais, que preferiram aguardar a queda nos preços, especialmente dos fertilizantes.
Não é algo que tire o sono de Segatto. Diferentemente do que ocorre com bancos privados, que costuma perseguir planos ambiciosos de crescimento, o CEO da Credicitrus afirma que a cooperativa apenas acompanha o apetite de expansão que seus associados mostram a cada ano.
E, nas últimas semana, eles têm mostrado que não se deixaram abater pelo ambiente mais complexo. "O segundo semestre costuma ser mais forte e já percebemos uma demanda mais forte em julho e agosto”, afirma Segatto. “Por isso acreditamos que podemos até superar a média de 20% ao que vínhamos apresentando historicamente”, disse.
Há, de acordo com o executivo, um menor entusiasmo na pecuária, em função da queda de preços. Mas no caso de produtos como a soja, apesar de também registrar desvalorização, "o produtor que já vinha se planejando para expandir área plantada, vai manter este movimento".
Como pauta estratégica, o CEO da Credicitrus aponta uma maior presença em produtos financeiros que tragam soluções para os desafios de sustentabilidade na agropecuária.
Ele conta que estão "em estudo” diferentes ferramentas que podem ser adotadas pela cooperativa, o que inclui a emissão de títulos verdes.
"Já temos essa demanda, mas ela é ainda muito pequena, por isso estamos escolhendo com calma qual será o melhor modelo”, explica.
Outro destaque é o avanço da digitalização de seus 167 mil associados. Segundo Segatto, quase 80% do volume transacionado hoje já é feito por meio digital. Antes da pandemia mais da metade ainda utilizava a presença física na cooperativa.
Criada há 40 anos no interior de São Paulo para atender a produtores de citros e cana, a Credicitrus atualmente já tem 50% dos clientes oriundos de atividades não agrícolas, como serviços e varejo.
“Mas são segmentos que seguem junto com o agro nas cidades do interior, por isso não acredito que ultrapassem a agropecuária na nossa carteira", disse Segatto.
As operações de crédito no primeiro semestre deste ano atingiram R$ 6 bilhões, alta de quase 16% na comparação anual.
Segatto diz que a carteira de captação já alcança R$ 8,5 bilhões, “uma situação confortável, já que é maior que a demanda por empréstimos, o que demonstra uma solidez financeira."
Confira alguns trechos da conversa do AgFeed com o CEO da Credicitrus:
Como tem sido o ritmo de crescimento da cooperativa?
O agro, como é nosso principal público de associados, experimentou uma demanda maior nos últimos três, quatro anos. E nós acompanhamos. Esse público trouxe mais demanda para a gente, tanto de serviços financeiros, produtos financeiros e crédito. Nós tivemos uma expressão de crescimento similar ou às vezes até superior do que a média geral, dependendo da praça, das commodities ou da demanda mais específica de um associado.
E de quanto foi esse crescimento?
Em linhas gerais, saímos nos últimos três, quatro anos, de uma carteira de crédito de R$ 3,5 bilhões para R$ 6 bilhões. Crescemos de forma expressiva, quase dobramos em um período de três anos. Temos expectativa de crescimento de pelo menos 20% este ano. Já a carteira de captação [que são os investimentos dos associados cooperados captados pela cooperativa] alcança R$ 8,5 bilhões. A solidez da Credicitrus também é reconhecida pela Fitch Ratings, uma das maiores agências de classificação de risco de crédito do mundo, que elevou seu Rating Nacional de Longo Prazo da Credicitrus para AA (bra), o mais alto do cooperativismo brasileiro.
E algum setor pesou mais neste desempenho?
Na cadeia ligada ao agronegócio temos uma diversificação. No interior de São Paulo é muito forte o setor sucroenergético, a cana-de-açúcar, assim como pecuária e grãos, como soja e milho. Essas representam a maior parte dos nossos produtores. E todos cresceram muito nesses últimos anos. Temos também uma região cafeeira importante, no sul de Minas e Triângulo Mineiro, e no Nordeste de São Paulo, em Franca. No interior paulista temos diversas culturas, desde produtores de banana até hortifrúti em geral, conforme a região, com muitos pequenos e médios produtores nessas cadeias. As unidades estão em mais de 110 municípios, além de escritórios e outros formatos de atendimento, que atende o Brasil inteiro.
A Credicitrus cresceu além da cadeia do agronegócio?
Somos uma cooperativa financeira cuja origem – e o nome já até descreve isso – vem do período em que a nossa região, Bebedouro [no norte do estado de São Paulo], era fortemente ligada à citricultura. Ainda tem a citricultura no formato um pouco diferente da época em que foi criada, quando sócios demandavam crédito, além daquilo que era fornecido pelos planos-safras da época. Hoje, 50% da nossa base não é ligada necessariamente a um CNAE de agronegócio. Mas o nome carrega uma história, por isso preservou-se Credicitrus. É uma marca muito forte, conhecida e requerida pelos sócios, mesmo aqueles sócios que não são do setor de agronegócio.
Desde quando houve essa mudança de perfil do associado?
Essa mudança acompanha o que ocorreu com a legislação do cooperativismo de crédito no Brasil. Até 2015, as cooperativas de crédito tinham que optar por algumas características, normalmente seguiam nichos de atuação. O nosso caso era um nicho de atuação em agronegócio. Isso era uma questão regulatória. Em 2015 a legislação permitiu que as cooperativas pudessem ser de livre admissão. Qualquer setor podia ter uma admissão em qualquer tipo de cooperativa. A partir daí a gente percebe um crescimento muito expressivo das cooperativas de crédito em geral, alcançando próximo de 20% do market share do sistema financeiro brasileiro. Portanto, agora, todas as cooperativas de crédito (são mais de 800) do País representam quase 20% do sistema financeiro brasileiro. A Credicitrus acompanhou e é hoje a maior em volume de ativos do Brasil.
As cooperativas de crédito estão usando muitas ferramentas modernas, como CRAs e Fiagros. Vocês também trabalham com estes títulos?
As linhas hoje dos nossos produtores, algumas são por demanda de complementariedade, outras são por exclusividade de formato. Fornecedor, por exemplo, gosta de fazer uma operação estruturada com recebíveis. E aí você tem vários formatos de recebíveis, desconto, fundos, certificados... No caso de um de um produtor, de uma indústria, ele gosta de trabalhar, por exemplo, com antecipação de contratos. Aí você coloca crédito rural (tradicional) dentro do contrato e o excedente você vai buscar via LCA. A nossa característica é bem diversificada.
Mas já fizeram emissões de CRA?
Estamos fazendo de acordo com demanda do nosso associado. É algo muito pontual. Não consigo expressar quantos foram feitos. Como a gente tem um contexto genérico, às vezes serve para um e não serve para outro. Fazer certificado de recebíveis precisa ter algumas estruturações. Eu sempre prefiro deixar aberto dizendo que nós atendemos as necessidades dos nossos associados. As linhas de crédito que têm esse nível de sofisticação ou exigência atendem mais ao médio e grande produtor ou às indústrias.
Não tem havido demanda por esse tipo de operação?
O CRA e os fundos, como o Fiagro, já começaram a ter demanda. Mas ainda não são os nossos principais demandadores. A nossa carteira está muito pautada em produtos ligados aos repasses do crédito rural, correspondente ao que o Plano Safra prevê. Nós temos uma carteira muito forte e importante de LCA [Letra de Crédito do Agronegócio]. Recursos livres em certificado de recebíveis, como o CRA, ou Fiagro, são capturados em parcerias de funding de quem tem interesse no fundo ou até de emissão própria quando se trata de uma CPR, por exemplo.
Pode explicar melhor?
A cooperativa tem algumas características próprias, de fundear recursos em captação, não somente específica de aplicações. Mas com fundos, ela tem que seguir as demandas do produtor. Eu não capto recurso de fundo por captar, para compor funding. Quando falo que eu capto hoje R$ 2 bilhões acima do que eu empresto é porque eu tenho caixa suficiente para oferecer os produtos que o meu produtor quer. Então, se condição de fundo, de certificado de recebíveis, estiver nas necessidades do associado, aí eu vou estruturar com ele. Daí já entra no mercado de capitais, que é um mercado muito mais estruturado que, às vezes, não é necessário a gente ter obrigatoriamente que acessar pra atender o associado, porque eu tenho caixa dele mesmo. Nossa disponibilidade de captação é maior que a de empréstimo.
Como avalia o atual cenário, com preços de commodities mais baixos?
Estamos experimentando uma demanda positiva. Estamos vendo o nosso produtor procurar mais crédito nos últimos cinco meses por conta da variação cambial positiva para um dólar menor. De um lado impactou no preço da commodity pra fazer a receita da safra passada. Mas por outro lado também provocou uma redução no custo dos insumos. E isso está também trazendo os produtores para uma revisão dos seus orçamentos. Mas ainda assim ele está demandando o crédito. Então, a gente tem uma perspectiva nessa safra de crescimento dentro dos patamares históricos de 20%.
*Colaborou: Niza Souza