Enquanto big techs e multinacionais de diversos setores miram grandes latifúndios do Brasil para compensar suas emissões e comprar créditos de carbono, uma startup que nasceu no coração da Amazônia quer destravar o mercado para pequenos e médios produtores e, consequentemente, pequenas e médias empresas.

A Tero Carbon, que como uma certificadora de projetos de carbono, atendendo às demandas tanto de quem quer comprar quanto de quem quer vender créditos, está de olho nessas oportunidades.

Segundo o CEO da empresa, Francisco Higuchi, a startup já certificou projetos no Cerrado Mineiro e na Amazônia e está em conversas para certificar novas iniciativas na cafeicultura, no cultivo de citros e também com produtores de castanhas.

“Fechamos contratos para verificar projetos que estão em processo de finalização no Mato Grosso, Amazonas e Pará e estamos desenvolvendo uma nova metodologia para atuar no cacau”, afirmou.

O momento atual da Tero Carbon é de receber projetos, aproveitando que o mercado está aquecido e com compradores atentos, de acordo com o CEO. Essas novas demandas somam, segundo o executivo, dezenas de milhares de hectares.

A empresa ostenta dois projetos-piloto para demonstrar sua atuação. Juntos, somam 2,2 milhões de créditos de carbono verificados e emitidos, além de 6 mil hectares preservados.

Na Amazônia, o projeto envolveu a Agropecuária Aruanã, que planta castanheiras. Higuchi conta que, ao longo dos anos, o proprietário resolveu abrir mão de parte de sua área de reserva legal para criar um sistema agropecuário, mas reverteu o processo após algumas safras, reflorestando e passando a cultivar as castanhas.

“Ao abrir mão desse direito de uso alternativo do solo, que envolveu o reflorestamento, ele passou a ter direito aos créditos de carbono, compensando o que deixou de ser emitido”.

No Cerrado Mineiro, o projeto se deu com uma propriedade de 64 hectares de cultivo de café arábica, localizada no município de Monte Carmelo (MG) e pertencente à Fazenda Santa Bárbara. Os 1,9 mil créditos foram gerados a partir da remoção de carbono no período de 2015 a 2024.

“Vimos que parte do mercado vendedor não é atendido pelas grandes multinacionais. A ideia da Tero é atender grupos que estão sem acesso ao mercado de carbono”, afirmou o CEO.

Ele acredita que na Amazônia, os pequenos e médios proprietários de terras que possuem propriedades de 500 a 1 mil hectares, não possuem esse acesso. “Sâo pessoas que vivem da e na terra, com propriedades conservadas”.

Do lado comprador, a ideia é também se manter em pequenas empresas. Higuchi espera que os créditos sejam viabilizados para todos, desde uma pessoa física até um supermercado, ou um escritório de contabilidade ou uma agência de comunicação, por exemplo.

O CEO vê uma oportunidade da Tero Carbon se posicionar como um fio condutor da cadeia de carbono. Ele explica que não existem somente compradores e vendedores, mas toda uma rede de advogados e intermediários nesse processo.

Da mesma forma, muitos dos critérios para o mercado de carbono vêm de fora do País, sem compreender a dinâmica tropical.

“Entramos para agregar uma regionalidade para os projetos e critérios. É comum uma empresa da Europa, Ásia ou dos EUA ter exigências específicas não aplicáveis ao Brasil”.

Uma meta de Higuchi é posicionar a Tero em plataformas globais de mensuração de créditos de carbono, de forma a consolidar a metodologia própria.

Recentemente, a startup passou a integrar a plataforma da Climate Action Data Trust (CAD Trust), criada pelo Banco Mundial e pelo governo de Singapura, sendo a primeira empresa brasileira do tipo dentro desse ecossistema.

A CAD Trust funciona como um marketplace de créditos de carbono, de forma que todo ativo certificado pela Tero é comercializado lá.

Agora, o foco da startup está em participar de outras agências de credenciamento, como a Corsia, de aviação civil. “A meta é se credenciar na Corsia para que empresas aéreas absorvam os ativos ambientais”, afirmou.

Higuchi explica que a Tero é contratada para verificar e certificar projetos estruturados por terceiros, num processo que envolve três pilares. O primeiro diz respeito à prova de vida, e engloba a conscientização de todo pessoal envolvido no projeto em relação aos compromissos firmados.

O segundo é a prova de origem, que engloba os documentos regularizados de toda parte fundiária da propriedade. Por fim, a prova de ativo é a garantia dada ao mercado de que o carbono existe de fato no solo.

“Com tudo ok, a Tero ainda contrata um auditor independente e depois geramos o crédito de carbono de forma digital, depositado numa carteira online”.

A startup amazônida

A Tero nasceu de uma demanda da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (FIEAM) para atender o mercado de crédito de carbono amazônico, conta Higuchi.

Ele e seu sócio, Matheus Bonadiman, foram convidados por um conselheiro da federação para “trazer mais protagonismo e autonomia para o mercado de crédito de carbono com as florestas locais”.

“Dentro desse contexto, vimos que uma certificadora nacional amazônica que representasse os interesses regionais, entregando integridade, era o caminho a ser seguido”, contou Higuchi.

O start técnico veio das pesquisas do laboratório de manejo florestal do INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), que é liderado pelo pai de Fernando, Niro Higuchi, um renomado pesquisador que já até foi laureado pelo Nobel da Paz, em 2007, por conta da sua atuação em conjunto com o IPCC (Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas).

O restante da base teórica da Tero Carbon veio da mãe do CEO, Maria Higuchi, que integra um grupo de pesquisas que envolvem psicologia e educação ambiental também no INPA.

Pela relação familiar, a vivência com a temática acontece desde a infância do executivo, o que o ajudou a trilhar o caminho. “A Tero nasceu de olho em oportunidades ‘não absorvidas’ na região. Temos um estado preservado, conservado e com florestas primárias, mas as pesquisas não se traduzem em negócio”, contou.

Francisco Higuchi conta que se especializou em toda a parte de mensuração e dinâmicas de estoques de carbono na floresta.

Na criação, a Tero recebeu um aporte do tipo seed pelo Amazônia Venture Builder, instituição criada dentro do guarda-chuva da Federação das Indústrias regional. Depois, recebeu um aporte não revelado de uma investidora anjo, que segundo o CEO, é uma “empresária relevante de família importante na região”.

Além de participar de alguns programas de aceleração, a startup busca novos investidores, desde que não sejam, por exemplo, produtores ou empresas que estruturam projetos de crédito de carbono. A ideia é não deixar nenhuma sombra de conflito de interesse no processo de certificação de um projeto.

“Estamos em conversas iniciais com indústrias de Manaus e com instituições financeiras”.