A produção de leite tem se tornado uma verdadeira batalha para quem vive da atividade. Preços baixos e o grande volume de importações são fatores que dificultam a vida de quem se dedica à pecuária leiteira. No Rio Grande do Sul, esse cenário acaba de piorar ainda mais.

O presidente da Associação dos Criadores de Gado Holandês do Rio Grande do Sul (Gadolando), Marcos Tang, que também é produtor de leite na região de Farroupilha, conversou com o AgFeed sobre a situação do segmento no estado, que já tem enfrentado até mesmo uma evasão nos últimos 10 anos. E seu testemunho é de desalento com a situação de seus colegas de atividade.

“Até 2014, nós tínhamos cerca de 80 mil produtores no Rio Grande do Sul. Agora, temos cerca de 32 mil. Tenho ouvido de muitos produtores, já desanimados com a atividade, que essa tragédia foi a pá de cal, que não querem mais produzir leite”, conta Tang.

Ele diz que há sim relatos de produtores que perderam animais levados pelas enxurradas. “Um produtor disse que foi dormir com 100 animais, e quando acordou, só cinco tinham sobrado”.

A maior parte dos problemas enfdrentados nesse novo capítulo do drama do leite gaúcho está, entretanto, relacionada à alimentação do gado leiteiro. “Até mesmo silos que comportavam tortas de pré-secado foram arrastados. Algumas áreas de pasto foram reduzidas a pedras, com recuperação difícil e demorada”, afirma o presidente da Gadolando.

A solução, provisória, tem vindo da solidariedade de outros produtores de regiões do Rio Grande do Sul menos afetadas - e até de outros estados.

“Estão a caminho cerca de 20 caminhões com comida para os animais. Inclusive a equipe técnica da Gadolando está voltada para auxiliar nesta questão, de fazer chegar alimentos nas propriedades”.

As fábricas de rações também enfrentam problemas por conta da dificuldade de transporte de grãos no estado. Além disso, segundo Tang, o que é produzido tem como prioridade atender os criadores de suínos e aves, por não terem outras opções de alimentação como têm os bovinos.

Tang contabiliza que cerca de 40% dos produtores gaúchos foram afetados de alguma forma. “Foram poupados apenas aqueles localizados nas regiões norte e noroeste do estado, perto da divisa com Santa Catarina”.

Corte brusco

O presidente da Gadolando conta que houve uma queda brusca no volume de leite que chegou aos laticínios do estado nos primeiros dias de chuva, ainda na semana passada.

“Em um período de três dias, o Sindilat (Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados) relatou 4 milhões de litros que deixaram de ser coletados”.

Depois da portaria editada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) que flexibiliza as regras para fornecimento de leite, esse volume não coletado caiu para 2 milhões de litros, segundo Tang.

“Foi um pedido que recebi de vários produtores, dizendo que a indústria na qual tinha cadastro não conseguia retirar o leite, por conta das estradas fechadas, mas que poderia fornecer para uma outra indústria mais próxima”.

Sobre as possíveis medidas para amenizar os impactos da tragédia e auxiliar a reconstrução das fazendas, Tang acredita que o governo terá que disponibilizar crédito barato e flexibilizar as condições das dívidas que já estão contratadas.

“Nós não queremos deixar de pagar o que devemos. Pelo contrário, o produtor de leite está em situação difícil exatamente por ser um bom pagador de dívidas. Mas estamos vindo de três anos com eventos climáticos extremos e precisamos preservar a produção de leite no Rio Grande do Sul”, diz Tang.

O presidente da Gadolando aponta a necessidade de que a ajuda financeira precisa chegar rapidamente ao produtor, sem burocracias. “Não interessa em que linha de crédito cada um se encaixa. Precisamos que seja barato para reconstruir as estruturas e os pastos”.

Ele lembra que o estado tem a melhor produtividade do país, segundo dados do IBGE. “A média nacional é de 2 mil litros por vaca ao ano. Aqui no Rio Grande do Sul, essa média é de 3,5 mil litros”.

O produtor ressalta ainda que o rebanho gaúcho tem um banco genético bastante valioso, principalmente por ter raças holandesas. “Por conta do clima mais frio, essa variedade se adaptou bem. Algumas dessas vacas conseguem produzir até 10 mil litros de leite por ano”.

Tang levanta ainda os impactos sociais e econômicos, não só para os consumidores de leite e derivados, mas para os próprios produtores.

“Na grande maioria, são pequenas propriedades, mas eu digo que são grandes produtores. Porque conseguem, em uma área de 20 a 30 hectares, produzir mil ou até 2 mil litros de leite por dia. É uma atividade que envolve e sustenta muitas famílias”.