O Brasil começa a colher uma safra recorde de milho e os produtores rurais, que chegaram a ver preços próximos a R$ 100 por saca no início do ano passado, já recebem propostas abaixo de R$ 30 em alguns locais de Mato Grosso.

O cenário preocupa porque a colheita começou pontualmente e muito em breve haverá a chamada "pressão de oferta", como dizem os analistas, com mais tendência de baixa para os preços.

Como consequência disso, o mercado aposta que nas próximas semanas o governo retome uma antiga ferramenta nas épocas de instabilidade do milho no Brasil – os chamados PEPs, Prêmio de Escoamento de Produto

Na prática, é uma subvenção econômica concedida àqueles que se disponham a adquirir o produto indicado pelo governo federal, diretamente do produtor rural ou cooperativa, pelo valor do preço mínimo fixado e faz parte da Política de Garantia de Preços Mínimos do Governo Federal (PGPM).

"Este ano mais do que nunca o produtor rural vai precisar de crédito para comercializar o milho", destacou o sócio-diretor da Agroconsult, André Pessoa, ao comentar a queda nos preços do cereal para níveis abaixo do preço mínimo.

O consultor explica que existe uma lei no Brasil que determina esse mecanismo, indicando que o governo deve intervir no mercado. Os produtores de soja e milho já nem lembravam que existia o sistema de preços mínimos, já que os valores internacionais vinham muito altos e não era necessário, mas agora está dado o gatilho para que o governo possa intervir, afirmou Pessoa.

O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, tem dado declarações de que o governo precisará adotar políticas para minimizar as perdas aos produtores de milho.

O último ano em que o governo atuou de forma mais contundente com o PEP foi em 2017, quando os preços da saca estavam próximos de R$ 30, patamar que já vem sendo visto em regiões da BR-163, em Mato Grosso, esta semana.

Quem trabalha na exportação de milho, também está vendo com bons olhos a expectativa de uma intervenção do governo para sustentar os preços do grão.

"Se isso ocorrer, a tendência é a queda nos prêmios de exportação, o que pode trazer maior competitividade para o milho brasileiro”, disse ao AgFeed o sócio da ACI Commodities, Flávio Almeida.

Ele ressalta que, apesar da abertura do mercado chinês, uma redução nas compras por parte dos países do Oriente Médio tem sido um fator limitante para que as exportações de milho tenham um crescimento expressivo.

"O mercado estima que China poderá comprar até 10 milhões de toneladas de milho este ano, mas por outro lado há uma redução de 9 milhões em diversos países do Oriente Médio”, alertou Almeida.

Mesmo assim, em evento de lançamento do chamado Rally da Safra – etapa milho – realizado hoje, a Agroconsult reafirmou a previsão de que o Brasil exporte um volume recorde 54,1 milhões de toneladas de milho este ano, bem acima dos 46,5 milhões de toneladas embarcados em 2022.

"A safra atrasou este ano, a China não está com tanta pressa e existe também uma competição do milho com a soja por espaço nos portos", explicou André Pessoa, ao ser questionado sobre a queda dos embarques do cereal nos últimos dois meses.

Tendência de queda

Caso a demanda maior se confirme, ainda assim os analistas acreditam que o cenário para os preços do milho segue complicado. A previsão divulgada pela Agroconsult é de uma safra total de 132,5 milhões de toneladas. É um recorde absoluto, puxado pelas condições climáticas favoráveis e pelo aumento de área plantada na segunda safra, que começa a ser colhida agora.

A Agroconsult revisou de 97,2 milhões de toneladas para 102,4 milhões de toneladas a produção da segunda safra, em um intervalo de dois meses. Se confirmado, o volume será 11% maior que o mesmo período do ano passado.

Outro risco para os preços é a confirmação de casos de gripe aviária em aves silvestres no Brasil. Caso a doença venha a atingir granjas comerciais, haverá impacto para a demanda por proteína brasileira e também por milho.

"Se agora estamos no fundo do poço para os preços do milho, uma situação como essa poderia levar o fundo alguns metros ainda mais abaixo”, admitiu o analista da Agroconsult, André Debastiani.

Mundialmente, o clima favorável para a produção do milho norte-americano também não ajuda o produtor rural brasileiro – uma parte da formação do preço por aqui está relacionada às cotações da Bolsa de Chicago.

"A China tem cancelado compras de milho americano, isso recentemente provocou queda de mais de 1 dólar por bushel no preço internacional, tudo isso leva a crer que está difícil haver uma recuperação", disse Flavio Almeida, da ACI Commodities.