As margens apertadas e as inseguranças climáticas devem continuar a dar o tom na produção agropecuária em 2024. E, para a Confederação da Agricultura e da Pecuária do Brasil (CNA), esse cenário exige prevenção, com apoio do governo.

Em entrevista coletiva realizada nesta quarta-feira, 6 de dezembro, para fazer um balanço do setor em 2023 e fazer previsões para o próximo ano, a entidade aproveitou para ressaltar sua reivindicação por um reforço substancial nas verbas destinadas ao seguro rural oficial.

Segundo a CNA, as incertezas, sobretudo em função do clima, vão demandar pelo menos R$ 3 bilhões nessa rubrica, o triplo do previsto pelo governo no orçamento.

Depois de um ano de “safra cheia com bolsos vazios” em 2023, como explicou o diretor técnico da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), Bruno Lucchi, o próximo ano ainda traz grandes desafios para os produtores, tanto em aspectos climáticos quanto em geopolíticos.

No clima, a expectativa é que o El Niño atinja seu ápice entre dezembro e janeiro, o auge do verão brasileiro. Com esses fatores em mãos, outras instituições já preveem uma produção levemente abaixo na safra 2023/24 frente às 321 milhões de toneladas produzidas na safra 2022/23.

Em seus últimos relatórios, Conab, USDA e IBGE projetaram, respectivamente, 316 milhões de toneladas, 311 milhões de toneladas e 308 milhões de toneladas colhidas na próxima safra.

A queda dessa produção virá da safra de milho, já que as projeções para as safras de soja A CNA ainda não vê uma quebra de safra, a depender do quanto os efeitos do El Niño sejam intensos entre dezembro e janeiro.

Diante disso, a entidade estima que os preços das commodities agropecuárias devem ficar estáveis no ano que vem, com exceção da cana, que se beneficia de uma menor oferta vinda de países como Índia e Tailândia.

Como se não bastasse, a probabilidade de uma La Niña aparece no horizonte a partir do meio do ano que vem. “Mal saímos de um El Niño e temos tudo para entrar em La Niña. Não estamos tendo anos de neutralidade”, citou Lucchi.

Com isso, a CNA declarou que uma política de seguro rural que seja de estado e não de governo é necessária e projetou que sejam necessários R$ 3 bilhões em seguro rural no ano que vem.

O montante pleiteado é três vezes maior do que o previsto pelo governo federal no orçamento do ano que vem, de R$ 1,06 bilhão, o mesmo montante disponível no início de 2023.

Outra insegurança que ronda o ano que vem está relacionada à geopolítica global. De acordo com Sueme Mori, diretora de relações internacionais da CNA, o conflito na Faixa de Gaza pode prejudicar os mercados globais caso se intensifique, com outros países se envolvendo.

“Uma escala no conflito envolve seguro, mexe com rotas marítimas e afeta uma região que produz energia para o mundo todo”, citou. Além disso, tensões políticas entre EUA, que além de tudo passará por uma eleição presidencial ano que vem, e China, devem se acirrar, segundo Mori.

Na América Latina, os primeiros meses da gestão de Javier Milei na presidência ainda são incertos.

Diante dos problemas, a entidade projeta que o PIB do agronegócio, que engloba além da produção dentro e fora da porteira em si, as receitas, deve recuar 0,94% neste ano, atingindo uma faixa de R$ 2,6 trilhões.

No ano que vem, a perspectiva da CNA é de estabilidade ou uma queda de até 2% nesse PIB.
Já para o PIB da agropecuária, que considera apenas a produção, CNA espera um aumento de 14,5% neste ano e, para o ano que vem, um avanço tímido de 1,5%, já ponderando as questões climáticas.

“Tivemos uma inflação dentro da meta em 2023 graças à superprodução que tivemos e que ajudou a reduzir a inflação de alimentos. Os empregos do agro vão seguir crescendo, cerca de 1%, e as exportações devem crescer 3% em 2023”, projetou Lucchi.

Projeções da ANEC

A Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais), por sua vez, divulgou nesta quarta um relatório com projeções para o final de 2023. No documento, projeta um crescimento das exportações de soja e farelo em dezembro, em relação ao mesmo mês de 2022.

Para a safra 2022/2023, a associação projeta que as exportações terminem próximas a 101 milhões de toneladas de soja, um volume que está muito próximo de ser concretizado, de acordo com a Anec. Na safra anterior, foram 77 milhões de toneladas.

Em dezembro, a expectativa é de uma exportação de 3,58 milhões de toneladas, mais do que o dobro do visto no mesmo mês em 2022. No mesmo mês, as exportações do farelo de soja devem alcançar 2,04 milhões de toneladas, incremento anual de 51%.

Em termos produtivos, a safra 2023/2024 de soja está estimada em 161,6 milhões de toneladas, segundo a entidade e a Agroconsult. “Apesar dos efeitos do El Niño, que possivelmente reduzirão o teto produtivo, a safra poderá apresentar um volume superior ao da safra 2022/23. Devido à instabilidade climática, muitas áreas foram replantadas, colocando essas culturas em calendários mais adversos”, citou a Anec.

Por conta disso, a Anec espera uma redução da área plantada de milho, o que deve favorecer o plantio de algodão. “Estão ocorrendo chuvas no centro-norte do Brasil que, apesar de irregulares, auxiliarão no desenvolvimento da cultura”.

Já o milho e trigo devem ter recuo nos embarques no último mês do ano. Para o milho, os embarques de dezembro devem atingir 6,86 milhões de toneladas, 6% abaixo do visto no ano passado no mesmo mês. As exportações de trigo devem atingir 283,8 mil toneladas em dezembro, 60% a menos que no ano passado.

Para a safra 2022/2023 completa, a expectativa da Anec é que sejam exportadas 56 milhões de toneladas de milho. Na safra anterior foram 44 milhões de toneladas.

A associação cita no seu relatório que a Agroconsult estima que a safra total de milho atingirá aproximadamente 128,7 milhões de toneladas em 2023/2024. “Isso se deve a uma redução na área plantada, influenciada pelos atrasos e replantios na área de soja, o que, por consequência, reduz a janela ideal para o milho”.