Depois de uma safra com quebra de 35% causada pela seca prolongada que assolou o estado de São Paulo em 2024, os produtores de amendoim agora se vêem diante de outro desafio: a não-renovação do artigo 351-A do Regulamento do ICMS (RICMS) para o estado de São Paulo, que trata da concessão de incentivos fiscais para a cadeia do grão.
O benefício, criado pelo Decreto 45.490/2.000 e incluído no RICMS em 2011, instituiu o adiamento da cobrança do ICMS na saída interna de amendoim. Na prática, o cerealista ou processador, ao adquirir o amendoim do produtor, recebe um crédito outorgado de 10,8% sobre o valor final da matéria-prima.
Esse percentual representa um “desconto” de 60% sobre o ICMS incidente sobre o produto, atualmente em 18%, e pode ser utilizado para manutenção das operações e investimentos no negócio.
No entanto, a validade do incentivo fiscal terminou em 31 de dezembro e ainda não há proposta de renovação. No final do ano passado,o governo do estado, por meio do ofício 24/2024 assinado pelo governador Tarcísio de Freitas, solicitou à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo a análise para a renovação dos incentivos para vários setores, com validade a partir de 1º de janeiro de 2025, mas deixou de fora o amendoim.
A notícia da possível proposta de revogação do incentivo acendeu o sinal de alerta para o setor, que divulgou uma nota manifestando preocupação e repúdio à proposta do governo do estado.
Assinada pela Associação dos Produtores, Beneficiadores e Exportadores e Industrializadores de Amendoim do Brasil (Abex-BR) e pela Câmara Setorial do Amendoim, a nota considera a proposta uma “ameaça ao setor produtivo de amendoim de São Paulo".
“Caso aconteça a revogação desse incentivo, os custos da cadeia produtiva serão ainda mais elevados, impactando não só a nossa competitividade lá fora, mas resultando também em aumento de preços para o consumidor doméstico” afirma o presidente da Abex-BR, Cristiano Fantin.
Segundo cálculos preliminares feitos pelas duas entidades, se implementada, a medida oneraria em R$ 300 milhões a cadeia produtiva do amendoim, resultado da retenção desse valor em impostos. Outro prejuízo apontado pelas entidades seria acelerar a migração de produtores para outras culturas e a transferência de indústrias para outros estados.
Além de onerar o setor, as entidades alegaram em nota que haveria uma disparidade na concorrência com produtos similares como castanhas e nozes, tanto no mercado nacional quanto no internacional.
“Essas revogação de incentivos deveria estar focada em produtos não essenciais. Estamos falando de uma cadeia relevante para o agronegócio paulista, que gera empregos, é vitrine para o Brasil no exterior e cuja matéria-prima, além de saudável, faz parte da cultura nacional”, pondera o diretor de relações governamentais da Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas (Abicab), Luis Oliveira.
Por meio da assessoria de imprensa, a Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo afirmou que “mantém diálogo permanente com o setor, por meio da Câmara Setorial do Amendoim. O objetivo é promover o desenvolvimento de toda a cadeia produtiva, elaborar e apoiar políticas públicas que fortaleçam o setor”.
Segundo Fantin, os representantes da Abex-SP e da Câmara Setorial do Amendoim estão pleiteando um encontro com representantes do governo estadual para discutir o assunto e solicitar a renovação do incentivo.
Incentivo para crescer
Para os representantes da cadeia produtiva do amendoim, desde que entrou em vigor, o artigo 351-A contribuiu para o desenvolvimento do setor no estado, que cresceu em ritmo acelerado.
De acordo com a nota divulgada pela Abex-BR e Câmara Setorial do Amendoim, de lá para cá a produção cresceu 342,5%, enquanto a área plantada aumentou 258,7%. A produtividade das fazendas também cresceu e ultrapassou 132% em pouco mais de uma década.
“Esses incentivos permitiram ao produtor investir em melhoria de tecnologia, adoção de novas variedades e maquinário. Não à toa o Brasil é hoje o terceiro maior exportador de amendoim do mundo”, pondera Fantin.
Levantamento da Federação de Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), indica que o estado responde por 90% da produção nacional de amendoim, com Valor Bruto da Produção (VBP) de R$ 2,86 bilhões.
Segundo a Abex-BR, na safra 23/24 o Brasil produziu 800 mil toneladas de amendoim em casca, volume que deve chegar a 1,1 milhão de toneladas na safra 24/25. “Estimamos um aumento de 20% na área plantada”, diz Fantin.
A possível retirada do incentivo fiscal de alguns setores faz parte do plano de melhoria da eficiência de gestão e gastos do governo do estado, batizado SP na Direção Certa. Segundo o site do governo, o plano reúne ações que passam “pela expansão dos investimentos, melhoria e efetividade do gasto, além da modernização da administração pública”.
Para Oliveira, da Abicab, a proposta “desprestigia o estado de São Paulo”, ao onerar um setor em expansão e que contribui com a geração de divisas. “Ao invés de incentivar um setor importante para o estado, acabaria por prejudicar o crescimento e competitividade da cadeia”, diz.
Procurada, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo não respondeu ao contato do AgFeed.