São 20 anos de negociações para abertura do mercado japonês à carne bovina brasileira. As conversas tiveram um hiato de cinco anos, foram retomadas há dois anos e havia a expectativa de que evoluíssem esta semana, com a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Japão.

O resultado dos encontros mantidos no Oriente, entretanto, indica apenas que as conversas devem prosseguir em 2025, seguindo um roteiro com algumas etapas obrigatórias. A primeira delas será o reconhecimento de todo o Brasil como livre de febre aftosa sem vacinação pela Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA).

Atualmente apenas cinco estados - Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Acre e Rondônia - têm esse status, mas o reconhecimento do País inteiro pela OMSA é esperado para maio. A expectativa do setor é que até 2026 os orientais, enfim, cedam e abram seu cobiçado mercado à carne bovina brasileira.

O Japão é o terceiro maior país importador de carne bovina do mundo, com 80% do total proveniente dos Estados Unidos e da Austrália. O Brasil, maior exportador global do produto, atende cerca de 160 países.

As negociações prosseguiram na missão do governo brasileiro Japão - e depois ao Vietnã. Nesta terça-feira, 25 de março, Lula e o ministro da Agricultura, Carlo Fávaro, se reuniram com representantes do setor no Japão e reforçaram o compromisso do governo em expandir o acesso da carne bovina brasileira àquele mercado.

“Nossas indústrias estão aptas a atender às exigências sanitárias e comerciais feitas pelo Japão”, relatou o ministro, citando o reconhecimento do Brasil livre de febre aftosa sem vacinação.

“Como bem disse o ministro (da Agricultura, Carlos) Fávaro na reunião, são mais de 20 anos de negociações e agora, vemos que, com essa visita, as coisas começam a avançar, principalmente pela evolução sanitária do nosso rebanho”, completou o presidente do Conselho da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Renato Costa.

Abiec e governo brasileiro têm trocado missões técnicas e diplomáticas com o governo e importadores japoneses, com uma série de inspeções sanitárias realizadas por autoridades do país oriental. Do outro lado, o presidente da Abiec, Roberto Perosa, esteve diversas vezes no Japão para tratar do tema.

Principal executivo da associação, Perosa já foi Secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e trocou o cargo pela Abiec. Ele sustenta que o Brasil tem um dos sistemas de controle sanitário mais avançados do mundo, cumprindo todas as exigências de mercados criteriosos para onde exporta, como Estados Unidos, União Europeia e China.

“Foi uma reunião extremamente produtiva, marcada por um claro comprometimento do presidente com o setor. Estamos confiantes de que avançaremos na abertura do mercado japonês — uma expectativa legítima do setor, que está plenamente preparado para atender, com excelência, aos mais altos padrões exigidos”, destacou Perosa sobre o encontro.

A Abiec sustenta que as exportações brasileiras de carne seriam complementares à produção local no Japão, garantindo maior oferta ao consumidor japonês, sem impactar a cadeia produtiva local.

“Embora exportemos apenas 30% da produção, com o crescimento do rebanho e o acesso a novos mercados, garantimos sustentabilidade para toda a cadeia”, destacou Renato Costa, presidente do Conselho da Abiec.

Só em 2026

Para o diretor-fundador da Scot Consultoria, Alcides Torres, o Brasil perdeu várias oportunidades de colocar produtos agropecuários na mesa de negociações para troca de produtos com o Japão no passado. Com isso, teve de partir para negociações pontuais e setoriais, como a da carne bovina.

Para Torres, apesar do discurso relativo à questão sanitária, o principal ponto de impasse para a abertura do mercado oriental à carne bovina brasileira é o econômico. “A carne brasileira é muito barata e vai bagunçar aquele mercado interno”, disse.

Torres citou a China como exemplo. O país se tornou o maior mercado da carne brasileira após a abertura do mercado, até que a pecuária local fosse afetada. “Isso incomodou e os chineses colocaram o Brasil sob observação para a prática de dumping, que definitivamente não existe”, lembrou.

Para o consultor, o Brasil “consegue atender o mercado japonês com qualquer tipo de carne e com qualidade muito melhor” e os dois países têm um ótimo relacionamento que pode ajudar na abertura. “Mas não acredito que isso ocorrerá em 2025”, concluiu.