Os dias têm sido de incomum agitação para as duas gerações que convivem no Grupo Colorado, um tradicional player do setor sucroenergético do interior paulista.
No comando da gestão da comanhia - que controla duas usinas de duas usinas, em Guaíra (SP) e Morrinhos (GO), com capacidade para processar 9 milhões de toneladas de cana-de-açúcar por safra, produzindo 780 mil toneladas de açúcar e 575 mil metros cúbicos de etanol a cada temporada, além de ter negócios paralelos na área de locação e equipamentos agrícolas e industriais e no varejo automotivo - a segunda geração do clã estaria negociando, segundo informações divulgadas pelo jorval Valor Econômico, negociando a aquisição de uma terceira usina.
O alvo de um possível investimento seria a Usina Continental, em Colômbia (SP), ativo com capacidade de moagem de 2,5 milhões de toneladas de cana e que está no rol das plantas a serem negociadas pela gigante Raízen, dentro do seu plano de reestruturação e redução do endividamento. As duas partes não confirmam os rumores.
Em outra frente, os mais jovens abrem outra trilha para o crescimento do Colorado, em uma estratégia de mais longo prazo. Há dois anos, os primos Maurilio Ribeiro de Mendonça e Marcelo Ribeiro Camargo começaram a se movimentar a partir de uma inquietação: como poderiam contribuir para fomentar a inovação dentro do grupo sucroenergético de sua família, o Colorado, que acabava de completar 60 anos de existência?
"Falamos: 'Precisamos criar uma estrutura dentro do grupo, mais profissionalizada, para a gente poder receber, discutir e investir em inovação. Ter um canal aberto com todos os heads aqui da empresa. Não existia um setor para receber startups, founders ou iniciativas vindas de universidades", recorda Marcelo Camargo, em entrevista ao AgFeed.
Os primos, que fazem parte da terceira geração da família dona da Colorado, não eram neófitos no mundo das startups. Marcelo investe em startups de forma paralela, na pessoa física, e Maurílio já tinha tido contato com fundos de investimentos após uma experiência como analista da Kijani Investimentos, gestora com foco no agro.
É preciso fazer um parênteses aqui. Apesar de ser uma empresa já tradicional do setor sucroenergético, a Colorado também não é uma companhia totalmente sem familiaridade no campo da inovação.
Antes mesmo de iniciar a produção de cana, operação que iniciou no fim dos anos 1970, o fundador do grupo, Osvaldo Ribeiro de Mendonça, já atuava no setor de sementes de soja, milho e amendoim desde o começo daquela década.
Em 1984, ele criou a Campbiotec, empresa de pesquisa voltada ao desenvolvimento de sementes híbridas de milho doce para a produção de enlatados destinados à indústria alimentícia. O negócio foi adquirido em 1998 pela Dow, mas as raízes da inovação já estavam germinadas dentro do grupo.
Voltando à Colorado Ventures, após entenderem que precisavam inserir a inovação de forma mais intensiva na empresa, Marcelo Camargo e Maurílio Mendonça passaram a estudar cases de diferentes consultorias e empresas para entender como tinham trazido a inovação para dentro de casa.
"Até que acabamos optando pelo modelo de CVC [sigla para o termo em inglês corporate venture capital]", recorda Marcelo Camargo.
CVCs são uma modalidade do venture capital em que grandes empresas investem em startups e negócios que possam complementar ou transformar seu próprio setor, trazendo inovação e novas tecnologias.
Como o processo era novo para o grupo, os primos passaram a idealizar o CVC em parceria com o clube de investimentos no agro Agroven até levar a ideia para o aval da segunda geração da família - que ainda comanda o Grupo Colorado - em dezembro do ano passado.
Projeto aprovado, na sequência, os primos passaram a estruturar até que o CVC – batizado como Colorado Ventures – entrasse em operação, em julho passado. "Tivemos um aprendizado muito interessante. Participamos de todas as reuniões, de que forma que a gente ia investir", afirma Maurílio Mendonça.
A tese de investimentos foi construída em conjunto com os profissionais do grupo. "Sentamos com os heads de todas as áreas, sócios, CEO, CFO, e de lá saiu a tese", afirma Maurílio Mendonça.
O que os primos buscam, com a Colorado Ventures, é investir em soluções, ferramentas e inovações que agreguem valor ao grupo. "Nós queremos estar olhando para o que pode ter um bom divisor de águas aqui para dentro do grupo como um todo", resume Marcelo Camargo.
A tese abrange quatro pilares estratégicos: agricultura de precisão e decisão, robótica e automação industrial, bioinsumos e biocombustíveis.
A ideia da Colorado é encontrar startups que já estejam com um produto pronto. "Para que a gente possa trazer para dentro de casa e possa fazer algum tipo de tese", explica Maurílio Mendonça.
O volume de investimentos destinados para o CVC e o tamanho dos cheques não estão definidos, mas os primos dizem que pretendem atingir startups em early-stage, pré-série A e que já podem receber recursos série A. "Sabemos claramente que, em série A, a gente quer co-investir, seja com algum fundo ou algum outro player", afirma Mendonça.
A ideia da Colorado Ventures é de ter uma participação de no máximo 20% nas startups, diz Mendonça. "Pensamos em algo entre 10% a 15% e, no máximo 20%.”
Até aqui, a Colorado Ventures não fez nenhum investimento, mas algumas startups já estão em processo de avaliação mais amadurecido e a ideia é que o primeiro deal seja feito até o fim de 2025.
"Temos falado com muita empresa legal e muita tecnologia que gostamos bastante", afirma Maurílio Mendonça. "Estamos animados, mas não queremos dar o passo maior que a perna. Queremos investir em algo que vai fazer sentido para a gente. E queremos ser também bons investidores para a startup", diz.
Apesar de poucos meses em atividade, cerca de 100 startups já passaram pelo funil da Colorado Ventures, estima Elias Ospina, diretor de inovação aberta e corporate venture do CVC.
Antes de chegar ao Grupo Colorado, Ospina atuou como gerente de comunidade de inovação no PwC Agtech Innovation, centro mantido pela big four em Piracicaba (SP), auxiliando empresas como John Deere, Bunge, Banco do Brasil, Sumitomo Corporation, General Mills, TIM, LDC, Suzano, Trimble, UPL, entre outras.
O executivo conta que, no processo de originação, trabalha em parceria com a XVen, braço da Agroven, avaliando se as soluções apresentadas merecem seguir, logo após, para o comitê de screening, etapa de triagem com a presença de diretores e gerentes.
Esse comitê funciona como um primeiro filtro, em que os líderes avaliam se a proposta tem aderência ao negócio e potencial para crescer dentro da estrutura do grupo.
“Foi interessante perceber o engajamento dos diretores e gerentes. Eles estão comprados com a ideia e participam com um verdadeiro sentimento de dono”, conta Ospina.
As startups que passam por essa triagem seguem para o comitê estratégico, formado por sócios e diretores do Grupo Colorado, que tomam a decisão final, o chamado “go or no go”.
"Como os diretores vão já ter visto essa startup, é legal que daí eles já vão poder auxiliar os sócios", afirma.
Marcelo Camargo ressalta que, ao contrário de um fundo de investimento tradicional, o grupo aposta no conceito de smart money: não se trata apenas de aporte financeiro, mas de integrar a startup ao ecossistema da companhia, oferecendo estrutura, mentoria e oportunidades reais de teste e crescimento.
“A gente quer fazer o investimento nas startups e trazê-las para dentro de casa, fazer os testes, fazer acompanhamento, portas 100% abertas a toda a estrutura do grupo", diz Camargo.
“A ideia não é investir apenas por equity, é trazer para dentro de casa, porque se a gente está usando essa tecnologia é significativo acreditar nela", complementa Elias Ospina.
Para as startups, a oportunidade será única, ao acessar um importante player do setor sucroenergético, dono
Agora, o grupo vê mais uma oportunidade de agregar novos negócios, mesmo com um momento atual pouco favorável para investimentos, com juros altos – a taxa Selic continua em 15% e não dá sinais de que vá diminuir muito nos próximos meses.
“É como aquela famosa frase do [megainvestidor] Warren Buffett: ‘Compre ao som de canhões e venda ao som de violinos. Então, se esse é o momento de que todo mundo não está olhando, então é o momento para talvez ser mais estratégico e olhar para fazer um CVC dentro da estrutura de um grupo tão consolidado no mercado do agronegócio”, diz Elias Ospina. Que assim seja.
Resumo
- Terceira geração do Grupo Colorado cria a Colorado Ventures, focada em inovação e corporate venture capital
- Fundo busca startups em agricultura de precisão, robótica, bioinsumos e biocombustíveis, com participação de até 20%
- Mais de 100 startups já foram avaliadas; primeiro investimento deve ocorrer até o fim de 2025