Além de ganhar mercado, uma das grandes dificuldades de uma empresa iniciante é obter financiamento. Se de um lado um investidor anjo é geralmente uma pessoa que aposta em uma ideia ainda incipiente, os fundos tradicionais de venture capital preferem apostar em satartups mais maduras e já testadas em uma certa escala.
No mercado de capital de risco, esse “limbo” que essas empresas encontram após a criação e antes de um investimento robusto é conhecido como “vale da morte”, pois é o momento da jornada empreendedora com maior índice de mortalidade de negócios.
É nesse espaço que a NovoAgro Ventures decidiu se posicionar como um Venture Builder focado no setor agropecuário. Na tradução literal, venture builder significa “construtora de negócios de risco”. Basicamente, é como se fosse uma fábrica de startups, ou seja, trata-se de uma instituição que auxilia no desenvolvimento de empresas em estágio inicial.
A empresa foi criada pela FCJ Group, companhia mineira que conecta investidores, startups, corporações e universidades para desenvolver negócios inovadores e que se proclama como o maior grupo de venture builder da América Latina, com 50 braços setoriais no estilo da NovoAgro Ventures.
Nas palavras de Leonardo Dias, CEO da empresa, a iniciativa atua nesse gap que existe dentro da jornada de uma startup após uma aceleração ou incubação e antes de receber um aporte mais robusto de um fundo de venture capital.
“Para acessar esse fundo, a empresa demanda um produto mais estruturado. Geralmente quem entra no nosso portfólio recebeu, no máximo, um aporte de investidor-anjo”, conta.
Além da FCJ, a NovoAgro conta com a participação da Faemg (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais) e mais cerca de 120 investidores que são empresários do agro, técnicos agropecuários, produtores ou players da agroindústria.
A tração da Faemg, que conta com mais de 600 mil produtores associados, ajuda a dar respaldo às startups que entram na iniciativa.
Segundo Dias, a relação com a Federação permite saber dos problemas do setor, e ao mesmo tempo facilita a atração de investidores. “Levamos as startups para validar o seu negócio com o cliente. Com acompanhamento técnico, ajudamos a entender se a solução atende a dor”, explica.
O CEO contou que até uma startup sair do radar e entrar de fato no portfólio são 10 etapas de validação, que envolvem conversas, reuniões, visitas a campo, planejamentos e pitches. A NovoAgro “compra” de 0,5% até 10% da startup que entra no programa, a depender do valuation.
Uma startup que passa por essas etapas ainda é avaliada pelos investidores da NovoAgro e pela Faemg, e com o ecossistema aprovando, ela entra no portfólio. Aí começa a jornada de algumas semanas para desenhar diagnósticos, aperfeiçoar produtos e ir ao mercado.
A empresa não desembolsa dinheiro na entrada, mas oferece o chamado “smart money” de sua rede e auxilia no processo de validação do negócio. Quando uma empresa sai do portfólio, aí sim a compensação é financeira.
Todo lucro obtido pelas startups no período dentro da NovoAgro é reinvestido no próprio negócio, explica Dias.
Na estratégia do negócio, uma empresa que entra no portfólio da NovoAgro fica lá por cinco anos. Como a iniciativa nasceu em 2020, a partir do ano que vem haverá saídas, iniciando a jornada de remuneração aos investidores.
Essa saída pode acontecer tanto pelo aporte de um fundo robusto, que queira uma porcentagem do negócio, ou por um M&A.
“Num período de cinco anos, queremos fazer ela aumentar de valor exponencialmente. Nós entramos na estruturação de uma startup para que ela vire uma S.A. e se prepare para receber um novo aporte”, diz. O venture builder ainda auxilia em toda parte jurídica e de governança do negócio.
Portfólio de milhões
Dias estima que o valor do portfólio da NovoAgro, somando todos os valores de mercado de suas agtechs, esteja em R$ 419 milhões.
O ramo de atuação é variado e a NovoAgro possui em seu portfólio empresas que atuam junto a produtores de café, hortifruti, cana, pecuária, sementes e até irrigação, créditos de carbono e seguro agrícola.
Dentro das 30 empresas hoje sob o guada-chuvas do grupo, há diferentes níveis de maturidade.
O grande case de sucesso fica com a Arado, marketplace que conecta pequenos produtores à redes de supermercados.
Em 2023, a agtech levantou R$ 60 milhões em uma rodada do tipo Série A liderada pela Acre Venture Partners. Além dela, participaram a Syngenta Group Ventures, Globo Ventures, Valor Capital, MAYA Capital, e SP Ventures.
Antes chamada de Clicampo, a companhia iniciou sua jornada junto com a Rappi, explica Dias, atendendo restaurantes e hortifrutis. Segundo o CEO da NovoAgro Ventures, a empresa enfrentou uma dificuldade no começo de sua trajetória, pois os produtos dos pequenos fazendeiros não chegavam nas condições ideais para serem vendidos aos varejistas.
Foi aí que o venture builder entrou e estruturou três programas com produtores que atendem a startup para que essa entrega fosse feita de forma adequada, seguindo o propósito inicial da agtech.
A NovoAgro tem menos de 1% da startup, segundo Dias, mas é uma empresa estratégica que dobrou de valor desde que entrou no portfólio, passando de R$ 100 milhões para mais de R$ 200 milhões. “É uma startup que pode até comprar novas startups que estejam no nosso portfólio, pelo seu porte”, pondera.
Outra empresa do portfólio que brilha os olhos do CEO é a Fuga Pras Colinas, agtech que ajuda produtores a acessarem a melhor opção de internet de boa qualidade no campo. O negócio foi acelerado em 2021 pela Meta, dona do Facebook e do Instagram, em parceria com a aceleradora Baita, que possui sede na Unicamp.
O CEO Arthur Cursino recebe as demandas de produtores que buscam conectividade, testa e indica ou revende a melhor solução para cada região.
Atualmente, a NovoAgro também está reavaliando algumas startups do seu portfólio. Algumas que não performam tão bem operacionalmente ou possuem dificuldades para escalar podem sair da carteira nos próximos meses.
“Como não colocamos dinheiro de forma direta é mais fácil sair. Queremos substituir empresas porque subimos a nossa régua de captação. Tem empreendedor que está feliz em fazer um negócio pequeno”, explica.
Esse processo de busca por startups é contínuo e atualmente a NovoAgro afirma ter mais de 2 mil startups do agro mapeadas.
O venture builder atingiu sua meta de chegar a 30 empresas neste quarto ano, número que considerava ideal para acompanhar simultaneamente. Hoje, Dias se questiona se o número não poderia ser menor.
O radar da NovoAgro
Dias conta que a empresa olha de tudo, mas algumas teses têm chamado mais atenção nos últimos meses. O universo dos dados no agro é uma delas. O empreendedor diz que está em busca de uma empresa que consiga processar todo o banco de dados da Faemg para gerar insights precisos na gestão de cada produtor.
Ele exemplifica que a federação possui cerca de 10 mil produtores de leite assistidos e, portanto, muitos anos de dados compilados. “Uma solução que agrupe isso pode dar previsibilidade de custos, insights para uma compra de insumos mais efetiva e até projetar preços de venda. A Faemg tem os dados, mas precisa de um algoritmo para ter essa predição”, conta.
O tema dos biológicos também chama a atenção da NovoAgro, que atualmente, a iniciativa já possui uma empresa no seu portfólio. A DroneFy utiliza drones para pulverizar insumos naturais em plantações de cana e já soma mais de 40 mil hectares tratados.
O venture builder está de olho também em tecnologias que auxiliem os mais de 400 sindicatos associados à Faemg, como por exemplo uma plataforma de leilão que utilize inteligência artificial. A ideia, segundo Dias, é gerar informação para os sindicatos e não concorrer com leiloeiras tradicionais.
No mercado de carbono, a NovoAgro busca uma empresa que consiga trazer essa realidade de créditos para um pequeno produtor. “Hoje se fala no crédito de carbono e nas agroflorestas, mas apesar de muita discussão existe pouca entrega. O produtor grande é mais assistido nessa temática, mas temos foco de ajudar o pequeno e médio, que não tem crédito por enquanto”, afirma.