A semente foi lançada em uma república universitária na cidade mineira de Viçosa, sede de uma das principais faculdades de agronomia do País. Brotou no solo de Luís Eduardo Magalhães, na fronteira agrícola do Oeste Baiano, a cerca de mil quilômetros dali.

Foi essa a distância percorrida entre ideia e realização da agtech Kalliandra, startup que atua com soluções de monitoramento agrícola que combinam sensores "plug and play", conectividade em áreas remotas e análise de dados para otimizar o manejo de recursos no campo.

Fundada em 2017, a empresa nasceu da amizade do CEO, Gabriel Ferreira, e do CTO, Waldir Denver, forjada na moradia estudantil que dividiram em Minas Gerais. Hoje, eles estimam já ter instalado 800 sensores em diversas fazendas do País.

Além de 35 propriedades atendidas diretamente pela companhia, a agtech ainda conta com um modelo B2B, que fornece o software para consultores. A meta é atingir 1,2 mil sensores nos próximos meses.

Sem citar valores absolutos, Gabriel Ferreira afirmou que a empresa deve ter uma alta de cerca de 30% neste ano em seu faturamento. O crescimento, ainda em ritmo bom, é inferior ao dos anos anteriores, em que costumava dobrar de tamanho. Mas, segundo o CEO, 2024 serviu para a empresa resolver alguns problemas de custo dentro de casa.

“Demos uma pausa na prospecção ativa e focamos em reestruturar a rede de equipamentos e algumas atualizações que reduzissem o custo de manutenção, que estava elevado”, afirmou.

Os 35 clientes diretos envolvem produtores de soja, milho, feijão, cacau, café, algodão, além de pecuaristas e agroindústrias. Na vertente B2B, a agtech instala os sensores e fornece, ao consultor, o acesso ao software.

Os equipamentos que a Kalliandra instala nas fazendas englobam pluviômetros, monitores de pivôs, sensores de umidade no solo, monitores de nível e pequenas estações meteorológicas. Tudo isso é combinado com dados diversos obtidos via satélite.

Ferreira afirma ainda  que os serviços da Kalliandra também ajudam produtores que precisam informar captações de água para órgãos públicos.

“Algo inviável de se fazer sem nenhum equipamento”, acredita. “Temos relatórios gerados para agências regulatórias que liberam outorgas de captação de poços”.

Para superar o problema de conectividade em regiões afastadas dentro das propriedades, os softwares e hardwares desenvolvidos pela Kalliandra e contidos nos sensores possuem repetidores de sinal de internet. Além do repetidor Wi-Fi, os equipamentos possuem painéis solares.

“Hoje toda sede de fazenda possui internet e nosso sensor funciona como um roteador. Um pluviômetro instalado aumenta a capacidade de conectividade da rede. Temos fazenda com distâncias de mais de 40 quilômetros e os sensores conseguem armazenar a informação, e caso a rede se desconecte, retêm o dado e passa para a sede quando a conexão voltar”, afirmou o CTO.

Os equipamentos são de fácil instalação, num esquema “plug and play”, segundo Denver, o que permite que os próprios consultores de irrigação instalem os sensores.

A origem da startup

Ferreira e Denver se conheceram durante a época de faculdade na Universidade Federal de Viçosa. Enquanto o CEO, foi seguir os passos do pai, agrônomo e com muita vivência nas lavouras, o CTO, cursava ciência da computação.

Morando juntos na mesma república, os dois notaram desde cedo que a união das expertises poderia virar um negócio no agro. Gabriel Ferreira já entrou na UFV na intenção de atuar com irrigação e, depois de formado, iniciou uma pós-graduação e desenvolveu um projeto para fazer manejo de irrigação com sensores.

Na intenção de empreender, Ferreira ligou para Waldir Denver e o convidou para se mudar para o Oeste Baiano. “Eu já tinha vontade de ter um negócio e resolvi apostar no projeto. Sabíamos que tínhamos uma boa ideia, o desafio era aprimorar e adaptar à realidade do agro”, afirmou o CTO.

Com investimento próprio, os dois ficaram de 2017 até 2019 focados no desenvolvimento da tecnologia, testes e prospecção de clientes. O CTO explica que a ideia inicial era ter uma plataforma de manejo alimentada por sensores que captassem de forma automática os dados. Ele explica que, no geral, plataformas de manejo inseriam manualmente os dados.

Focados inicialmente nos produtores com irrigação, a dupla começou a receber demandas de quem não tinha a tecnologia, a fim de mensurar outras informações.

No modelo de negócio da Kalliandra, o que é vendido são os dados obtidos pelos sensores. Todo o custo de instalação e manutenção dos equipamentos é da própria startup.

Num primeiro momento, os dois sócios compraram os equipamentos e soldavam no escritório. Depois, passaram a atuar com fornecedores.

Em 2019 a companhia foi acelerada pela Cyklo Agtech, que ajuda a desenvolver startups do agro no Matopiba. A empresa ficou de 2020 a 2021 na aceleradora em nesse período, incorporou ao sistemas imagens de drones.

“Foi aí que a ideia de ser um software de manejo de irrigação ficou um pouco de lado e a demanda por uma solução completa evoluiu”, contou Denver.

Até agora, a companhia não realizou rodadas de investimentos. Além do capital inicial e da aceleração, afirma que também utiliza antecipação com clientes para ajudar no dia a dia do caixa.

Apesar disso, uma rodada está no pipeline de Gabriel Ferreira. “Como não temos corda no pescoço, conseguimos entender melhor o perfil do investidor”.