Quase todo o brasileiro, em algum momento, já colocou no carrinho do supermercado produtos de marcas como Adria, Piraquê, Vitarella e Isabela, tradicionais em massas e biscoitos.
O que quase ninguém sabe é que a empresa proprietária dessas marcas começou como uma padaria, em 1951, no estado do Ceará, a padaria Imperial, “do Manuel”, mais precisamente, do Manuel Dias Branco. Algo soou familiar?
Sim, é esse o nome que dá origem a companhia M. Dias Branco, que tem papeis negociados na B3 com o ticket MDIA3, desde 2006.
A empresa hoje fatura quase R$ 10 bilhões, tem ao todo 20 marcas e é líder em massas e biscoitos, com cerca de 30% de market share, em nível nacional.
“A Vitarella é a maior marca de biscoitos do Brasil, não só da M.Dias, mas do País inteiro, tanto em volume, como receita, é líder absoluto em crackerrs”, contou Fábio Cefaly, diretor de relações com investidores e novos negócios da empresa, em entrevista exclusiva ao AgFeed.
A família M. Dias Branco segue proprietária de 80% das ações. O restante está no mercado, principalmente com investidores estrangeiros.
A estratégia de crescimento da empresa nas últimas décadas foi baseada em grandes aquisições. O cálculo é que 57% da receita venha das marcas que foram compradas.
O primeiro grande salto foi a compra da Adria, em 2003. Cinco anos depois foi adquirida a Vitarella. Várias outras marcas foram sendo compradas ao longo dos anos, incluindo a Piraquê, em 2018.
O movimento mais recente foi em 2022, quando a M. Dias Branco comprou a marca de produtos saudáveis Jasmine, no Brasil, e a Las Acacias, de alimentos variados, no Uruguai.
Com tantas aquisições, a empresa dobrou a receita líquida entre 2015 e 2022, saltando de R$ 4,6 bilhões para R$ 10,1 bilhões.
O faturamento recorde até hoje foi o registrado em 2023, com R$ 10,8 bilhões. Já no ano passado a M. Dias teve queda na receita e também no lucro líquido, que ficaram em R$ 9,7 bilhões e R$ 646 milhões, respectivamente.
Ao longo de 2024, as ações da empresa chegaram a registrar queda por alguns meses, em meio a boatos sobre fechamento de fábricas.
Na conversa com o AgFeed, o diretor Fábio Cefaly garantiu que atualmente todas as fábricas estão operando.
Segundo ele, foram realizados apenas dois ajustes. Na fábrica de Madureira, na cidade do Rio de Janeiro, a produção de massas foi interrompida, mas a linha de biscoitos segue funcionando normalmente.
Já em Lençóis Paulista (SP), a fábrica chegou a ter a produção paralisada em 2024, mas segundo a empresa, em agosto deste ano, os trabalhos foram retomados e a unidade agora está operando com 50% da capacidade.
Novas apostas, em ano de retomada
A empresa tem hoje 22 fábricas no País e a maior parte da produção ainda está na região Nordeste.
“É onde temos os maiores volumes vendidos, já que a empresa começou lá. Mas tem um investimento grande sendo feito no Sul e Sudeste na compra de empresas e na ampliação das fábricas atuais. Norte e Nordeste são 60% da receita. E a gente tem plano de crescer de forma mais acelerada nas outras regiões”, afirmou Cefaly.
A M. Dias Branco evita fazer qualquer previsão sobre o resultado deste ano, mas o diretor de novos negócios se diz animado com os resultados até agora, que passam pela meta de voltar crescer e “estão acontecendo dentro do esperado”.
Um dos sinais da retomada é o balanço do segundo trimestre que mostrou um lucro líquido de R$ 216,4 milhões, um avanço de 14% em relação ao mesmo período do ano passado.
“No segundo trimestre a gente mostrou que a companhia voltou a crescer, volume comparado ao primeiro trimestre cresceu, o mix de produtos cresceu, a gente voltou a ter ganho de market share, as despesas administrativas e comerciais estavam controladas, a companhia gerou muito caixa. A gente tem um plano de crescimento sustentável e consistente, e a gente acredita que isso vai acontecer”, avaliou o executivo.
Cefaly lembrou que o mercado já viu os números de forma positiva, com ganhos de 16% no valor da ação no dia da divulgação do balanço. “A expectativa é positiva para o segundo semestre”, completou
Um dos problemas que a empresa enfrenta ao longo dos anos é que a receita cresce, porém o volume de produtos vendidos não acompanha esse crescimento. O índice tem se mantido praticamente estável nesse período que a receita dobrou. A melhora financeira veio por meio da variação dos preços e também pela mudança no mix, com itens de mais valor agregado.
Para tentar mudar esse jogo, a empresa se reestruturou e dividiu sua operação em quatro unidades de negócio: core (massas e biscoitos, que responde pela maior parte da receita), food service, saudáveis e snacks e, por último, respondendo por 2% do faturamento atualmente, o pilar internacional.
Houve mudanças em algumas posições de diretores e também novos nomes para o conselho, como a chegada do ex-ministro Pedro Parente, que também foi presidente de grandes companhias como Petrobras e BRF.
Para seguir crescendo, além de ganhar mais market share nos produtos tradicionais em outras regiões do Brasil, a M. Dias também vem diversificando o portfólio.
Entre as novidades está um macarrão instantâneo lámen que, segundo Cefaly, não é frito, como as demais marcas vendidas no Brasil. A empresa diz usar uma tecnologia que conheceu na China e que é diferente da utilizada por aqui. O mercado de macarrão instantâneo é estimado em R$ 5 bilhões e a empresa já possui 10% de market share.
A M. Dias também é produtora de farinha, margarinas e gorduras e fornece esses produtos para o segmento chamado food service, B2B. O negócio está “em forte crescimento”, segundo a empresa.
No fornecimento de farinha de trigo para o food service, a companhia diz já ter 8% de participação, em um universo de R$ 22 bilhões.
Outra aposta são snacks e produtos saudáveis, um mercado estimado em R$ 20 bilhões e onde a M. Dias estaria com apenas 0,3% de share. O foco é ampliar essa participação.
Mais trigo importado
A M. Dias Branco é uma das maiores compradoras de trigo do Brasil, porque não possui apenas fábricas de massas e biscoitos. Muitas de suas unidades também possuem um moinho, já que a empresa também comercializa a farinha.
Um dos destaques é o moinho que foi adquirido de uma cooperativa em Rolândia, no Paraná, que está próximo de uma região reconhecida por produzir trigo de qualidade.
“O principal insumo que a gente compra é o trigo. O Brasil é importador estrutural de trigo. A gente compra por volta de um milhão de toneladas por ano. Esse ano deve dar uns 40% importado, mas depende muito de como é que vem a safra brasileira. Pode variar de 40% a 60%”, explicou Cefaly.
Em 2024, a empresa informou que usou 77% de trigo importado, principalmente da Argentina, mas também dos Estados Unidos e do Canadá, em função da localização de suas fábricas no Nordeste, que deixa o produto do Hemisfério Norte competitivo.
Caso consiga alcançar seus planos de aumentar também volumes de produção, o executivo afirma que haverá maior demanda pelo trigo brasileiro.
Segundo o diretor, a decisão sobre qual origem do trigo usar leva em conta não apenas a competitividade, mas também a característica de cada um. A empresa costuma fazer blends com diferentes variedades do cereal, para chegar aos ajustes de textura e sabor desejado.
“Alavancagem negativa”
Uma das curiosidades da M. Dias Branco é o fato de se manter, na maior parte de sua história, praticamente sem alavancagem.
“A gente tem uma alavancagem baixíssima. Somos AAA nas agências de rating. A gente tem uma geração de caixa muito boa”, destacou Cefaly.
Pelo dado mais atual, a relação entre dívida líquida e Ebitda da empresa, está em 0,1 vez, porém, negativo. Quer dizer, a empresa tem mais caixa do que dívida. Historicamente, desde o IPO, o índice na M. Dias é de 0,5 vezes.
O pior resultado neste aspecto que a empresa já registrou foi em 2022, quando a dívida líquida/Ebitda ficou em 1,8x. O índice se explica por ter sido um ano de aquisições importantes no Brasil e no Uruguai.
Segundo Cefaly, no atual momento, “sobra mais de R$ 200 milhões após quitar dívidas”. Além disso, 70% das dívidas da companhia seriam de longo prazo.
Sobre investimentos, o executivo informou que a M. Dias vem conseguindo manter uma média de R$ 300 milhões por ano, o que inclui uma implantação recente de sistemas como SAP, inteligência artificial e modernização das fábricas.
Resumo
- M. Dias Branco está otimista com a retomada do crescimento em 2025 e busca aumentar volume de produtos comercializados.
- Empresa de alimentos já compra cerca de 1 milhão de toneladas de trigo por ano e pode aumentar demanda, caso consiga crescer em volume.
- Ao AgFeed, companhia garantiu que não há mais fábricas paralisadas, já que a unidade de Lençóis Paulista (SP) retomou atividades em agosto, com 50% da capacidade.