A vida de Eduardo Goerl teve alguns capítulos marcantes nos últimos vinte anos, que, se colocados em sequência, parecem escritos por um roteirista de filmes. A introdução, com os créditos iniciais, mostraria um jovem que sempre teve o sonho de ser piloto de avião.

No primeiro ato, em 2008, já de cara um clímax: ele, instrutor para pilotos de aviação agrícola, vê o avião que voava para lecionar uma simulação com um aluno pegar fogo. “Algo comum para os aviões de pulverização, porque a manutenção é um elemento complicado no campo”, explica.

Logo depois, uma queda próxima à pista. Apesar dos machucados, os dois saíram vivos. “Ele tem algumas placas no rosto, e eu duas costelas a menos”.

Nos atos seguintes, o sonho de criança se cumpriu e, por 10 anos, Goerl foi piloto comercial na antiga TAM (hoje Latam), onde pilotou um Airbus A320.

Diante do trauma, era de se esperar que Eduardo ficasse longe do agro, mas não foi o que aconteceu. “No meio do caminho como piloto comercial, tive uma ideia, lá em 2014, de fabricar um drone de pulverização, por que perdi alguns amigos que faziam isso enquanto pilotos”, contou ao AgFeed.

Foi aí que surgiu a Arpac, sua startup. De lá para cá, continuou voando, mas diretamente do solo, e o negócio acabou trazendo frutos.

Goerl afirmou que neste ano a companhia deve faturar R$ 7 milhões, um avanço de 55% frente ao ano passado. “Hoje temos uma margem Ebitda positiva e a gente está com lucro líquido, que é uma coisa importante com a empresa do nosso estágio”, acrescentou o empresário.

O modelo de negócio atual se baseia em uma prestação do serviço de aplicação de insumos localizada, que deve somar 70 mil hectares no acumulado de 2025.

O setor mais atendido, responsável por 90% do faturamento, é o da cana-de-açúcar, onde atende Raízen e Atvos. Outros 5% estão na soja e o restante se divide em culturas diversas. Além dos clientes de peso, Goerl cita que a companhia já levantou cerca de R$ 20 milhões com investidores até hoje.

Depois de uma rodada com investidores-anjo, atraiu a Basf, que também acelerou a empresa, e a Ace Ventures, num aporte pré-seed. Em 2021, captou quase R$ 10 milhões com a japonesa Yahama.

O modelo de negócios não foi o mesmo desde o princípio. No começo, a Arpac construiu os próprios drones de aplicação de forma caseira. O então piloto conta que conhecia drones pequenos, que transportavam 20 gramas, o peso de uma câmera GoPro.

“Pesquisei e vi que haviam algumas empresas na Coreia do Sul com drones grandes porém leves. Comecei a buscar peças, fiz um pedido de patente ainda em 22 e comecei a fabricar o drone. Era um ‘MVP’ rústico, posso dizer”, comentou.

Na época, a DJI, que hoje é líder do setor, ainda não existia como empresa. Com o protótipo em mãos, e o primeiro investimento, a companhia iniciou aplicações de macrobiológicos com alguns primeiros clientes.

A máquina construída conseguia transportar 25 quilos de produtos, o que deixou muitos conhecidos de Goerl e alguns clientes em prospecção céticos com a ideia do negócio. “Eu comecei a tentar desatar esse nó, tentei validar com clientes sugerindo que aplicássemos na bordadura, por exemplo”, comentou.

A partir de 2018 que a situação ficou mais favorável para a Arpac. Foi naquele ano que a empresa entrou no programa AgroStart, da Basf. Mirella Lisboa, gerente de Inovação Aberta da Basf Soluções para Agricultura e head do AgroStart, explica que o programa é uma plataforma de inovação aberta e focada na aceleração de startups.

Goerl cita que, no seu caso, teve uma série de mentorias e reforçou sua agenda de contatos, o que ajudou na primeira captação de pouco mais de R$ 1 milhão em 2019.

Foi nesse ano que a empresa descobriu o nicho de atuação que persiste até hoje: aplicação localizada. A virada de chave veio durante a visita a um cliente para uma demonstração em um canavial.

Entre idas e vindas do drone, Goerl perguntou se o produtor havia feito pulverização em uma determinada área. O fazendeiro disse que a aplicação havia sido feita por aviões, e garantiu a qualidade do processo. “Os meninos do avião são bons”, teria dito a Goerl.

O CEO da Arpac então pegou um drone que estava com uma câmera acoplada e mostrou ao produtor que, na verdade, a aplicação havia deixado algumas falhas. Com isso, o produtor sugeriu a aplicação via drone para dar alguns “retoques”, com o outro drone, o da câmera, auxiliando o processo.

“Aí me virou a chave de fazer aplicações localizadas e economizar produto químico. Fizemos a aplicação do herbicida e o produtor adorou, pois resolveu um problema que ele tinha de ervas daninhas naquele talhão”, disse.

Foi aí que Goerl levou o projeto à Raízen. “Já que não tenho time de venda, preciso escalar na maior empresa possível”. A gigante sucroenergética gostou da ideia e alocou a startup no Pulse, seu hub de startups.

A companhia passou de uma aplicação feita em 45 hectares em 2019 para 45 mil hectares em 2020. “Eram pouco mais de 30 drones próprios da Arpac voando, e atendemos todas as usinas da Raízen no estado de São Paulo”. Posteriormente a empresa passou a atender terras também em outros estados.

De lá pra cá, a companhia deixou de ser fabricante de seus drones, e hoje utiliza drones da DJI para realizar o serviço. “Atendemos mais área, mas com oito equipamentos, quatro vezes menos drones”.

Nos últimos anos, Eduardo Goerl e a Arpac assistiram a uma verdadeira enxurrada de companhias de drones entrando no agro. Dentre algumas pouco profissionalizadas e outras mais, ele entendeu que o momento agora, com um assentamento dessas companhias, é de escalar.

Ainda muito exposta à cana, a ideia é diversificar. Isso porque, durante o inverno brasileiro, a cultura para, e consequentemente, as aplicações da Arpac também.

A companhia prepara uma nova vertical com três novos serviços. O primeiro, é uma aplicação de formicida para a cultura florestal. O segundo, sem cultura específica, é um serviço anti-chamas, que colocará o drone para impedir incêndios de se alastrarem e darem mais tempo para as equipes de bombeiros.

Na cana, a companhia projeta um serviço de aplicação focada no capim colonião, uma gramínea que é utilizada na alimentação de gado, mas nos canaviais, é considerada uma espécie invasora.

“É uma demanda específica do setor da cana, onde a aplicação entra com a cana já cortada”, explicou. Para ancorar essa nova fase da empresa, Goerl citou que a Arpac deve realizar uma nova rodada de investimentos do tipo Série A até o ano que vem. O valor que almeja captar ainda não foi definido.

Resumo

  • Eduardo Goerl, ex-piloto de avião agrícola, fundou a Arpac após sobreviver a um acidente. Startup de drones tem previsão de faturar R$ 7 milhões em 2025
  • A empresa começou fabricando seus próprios drones e foi acelerada pela Basf e recebeu aporte da Yamaha. E se consolidou com pulverizações localizadas, atendendo Raízen e Atvos
  • Agora, mira novos setores como o florestal, com aplicações de formicida e anti-incêndio, e planeja captar recursos em rodada Série A

Operação de pulverização da Arpac em canavial