No agronegócio, onde cada investimento precisa gerar retorno claro, armazenar dados sem extrair valor se tornou um desafio, e, em muitos casos, uma fonte silenciosa de ineficiência.

A nuvem chegou ao campo como promessa de escala e inteligência, mas frequentemente tem se transformado em um custo mal dimensionado. O setor está migrando para ambientes digitais, mas ainda sem a base necessária para que a tecnologia entregue todo o seu potencial por meio da inteligência artificial.

Costuma-se apontar a conectividade limitada como a grande barreira, e, de fato, ela é relevante. Mas há dois fatores igualmente críticos que ajudam a explicar por que a transformação digital no agro avança abaixo do esperado.

O primeiro é a forma como os dados são armazenados, de forma desorganizada, em múltiplos formatos e fontes, sem padronização nem catalogação.

O segundo é a adoção de soluções em nuvem sem um plano de integração de sistemas, sem governança de dados e sem critérios claros para uso inteligente das informações.

Em vez de gerar inteligência aplicada, acumulam-se megabytes e faturas mensais, com pouco retorno prático.

O que deveria ser um ativo estratégico transforma-se, muitas vezes, em um passivo operacional. E a nuvem, que poderia democratizar o acesso à inteligência e escalar decisões no campo, acaba ampliando a diferença entre quem consegue extrair valor dos dados e quem apenas os armazena.

Grandes operações, com equipes de TI e suporte técnico especializado, já começam a capturar ganhos reais. Mas a maior parte do setor ainda vive uma realidade híbrida e fragmentada, planilhas descentralizadas, sensores que não se comunicam e ausência de processos estruturados para transformar dados em decisões.

A digitalização do agro depende menos de velocidade e mais de estrutura. A nuvem não é um destino, é uma ferramenta que exige preparo, estratégia e organização de dados.

E é exatamente aí que reside uma oportunidade rara. Diferente de setores que digitalizaram às pressas no passado, o agro pode crescer com estrutura desde o início.

A adoção de cloud, inteligência artificial e modelos preditivos ainda está em fase inicial em boa parte do setor, o que permite fazer diferente, colocar a governança de dados como prioridade, estimular integrações desde a origem e oferecer ferramentas acessíveis para que o campo trate dados como insumos, não como subprodutos.

Sem dados organizados, a inteligência artificial não entrega todo o seu potencial. Ela depende de uma base limpa, estruturada e conectada para transformar dados em decisões. Caso contrário, apenas acelera a desordem e eleva os custos.

O mercado de computação em nuvem no Brasil deve crescer acima de dois dígitos ao ano nesta década e o agro tende a ser um dos principais vetores dessa expansão.

Mas esse avanço só se converterá em valor real se a conversa sobre dados mudar de foco. Não se trata apenas de onde estão armazenados, mas de como são coletados, estruturados e, acima de tudo, utilizados com eficiência.

A tecnologia nos permite fazer mais com menos. Mas isso só acontece quando a estrutura de dados está preparada para essa transformação.

A nuvem, isoladamente, não resolve. Ela é um meio, não um fim. Sem base organizada, ela apenas transfere o problema para outro lugar. Com um agravante, a conta, agora, é em dólar.

O agro vive uma janela de decisão: repetiremos os erros de setores que digitalizaram para só depois tentar se organizar? Ou usaremos este momento para plantar os dados certos, irrigar com inteligência e colher decisões mais rápidas e precisas?

Porque, no fim das contas, se os dados são o novo petróleo, no agro eles ainda estão brutos. E como aprendemos desde cedo no campo, quem não cuida bem do solo, não colhe.

Fernando Rodrigues é fundador da Rural.com.vc.