Novas áreas de cultivo, novas fontes de financiamento, mas com crescimento sustentado e governança ainda mais estruturada. Esses são alguns dos desafios do novo CEO de uma das maiores sementeiras do Brasil, a Girassol Agrícola, com sede em Rondonópolis (MT), por décadas conhecida pelo nome do seu fundador, o gaúcho Gilberto Goellner, que também já foi senador.
Quem assumiu o comando da Girassol, desde o fim do ano passado, foi o catarinense Gilmar Meneghini, que trabalhou boa parte da carreira na tradicional fabricante de pneus DPaschoal, mas também já passou por fundos de investimento e chegou a ser CEO do Grupo Rota Oeste, rede ligada à John Deere Construction .
Embora não tenha sido executivo de empresas do agro até então, Gilmar se diz um apaixonado pelo setor. “Com 9 anos eu já estava na lavoura dirigindo trator”, lembrou ele, em entrevista exclusiva ao AgFeed. Em Santa Catarina, seus irmãos trabalham na agricultura familiar.
Um dos motivos para ter sido escolhido, segundo ele, é a larga experiência em empresas familiares que buscam uma governança cada vez mais moderna, o que seria o caso da Girassol Agrícola.
Gilberto Goellner segue como presidente do conselho de administração e a antiga CEO, Neusa Lopes, passou a ser uma das conselheiras. Já os demais integrantes da família acompanham os negócios, porém sem ocupar cargos executivos.
Em tempos de juros altos e margens apertadas no agronegócio, a sementeira buscou também um profissional com expertise financeira.
Meneghini chegou a administrar uma fazenda de café, enquanto atuava em uma empresa familiar, mas acabou decidindo mudar completamente de ares e foi trabalhar no fundo internacional Advent, onde coordenou aquisições de revendas de autopeças.
“No fundo de investimento, a primeira loja que eu abri foi em Rondonópolis. Lembro quando eu apresentei isso para os caras da Faria Lima e tal, eles falavam que era melhor interior de São Paulo, mas eu defendia que Rondonópolis estava coberto de caminhão, sem o nível de serviço que precisa, que era lá que iríamos ganhar dinheiro”, contou.
Agora, no comando da Girassol, ele disse ao AgFeed que está voltando às raízes e que se diz inspirado pela história de Gilberto Goellner.
Como missão inicial, o CEO afirma que quer reforçar a proposta de crescimento, porém agregando diferenciais, como serviços na venda das sementes, com mais foco em qualidade, sem priorizar o melhor preço.
Além disso, avançar na governança é uma prioridade. Meneghini disse que a Girassol se organizou para que os membros da família estejam “presentes no dia a dia da empresa, mas sem interferir na gestão”. É um modelo que ele considera semelhante ao adotado na Amaggi, por exemplo, que ainda tem Blairo Maggi no conselho.
Em busca de novas áreas arrendadas
A Girassol Agrícola está cultivando atualmente cerca de 70 mil hectares, considerando primeira e segunda safra. A maior área é destinada à soja, com 39 mil hectares.
O crescimento tem sido constante. Quando o AgFeed conversou com a antiga CEO, em agosto de 2023, eram 50 mil hectares. Os resultados, no entanto, não vieram como o esperado, em função dos problemas climáticos que afetaram Mato Grosso na Safra 2023/2024, que derrubaram as produtividades, inclusive na Girassol Agrícola.
“O ano passado foi desafiador para o agronegócio, de forma geral no Mato Grosso. Por causas climáticas, a produtividade de sementes ficou abaixo do que se imaginava. Como 60% do nosso negócio está vinculado à venda de sementes, tivemos um ano mais difícil”, explicou Meneghini.
O faturamento que, há dois anos, já se estimava passar de R$ 1 bilhão, acabou fechando em R$ 750 milhões em 2024. Para este ano, a previsão é chegar em pelo menos R$ 1,1 bilhão, desta vez com a ajuda do clima, que garantiu uma safra recorde na Girassol Agrícola.
Na comparação com o ano passado a produtividade aumentou 28%, mas em relação ao melhor ano que a empresa já teve ainda assim o avanço é de 12%.
A expectativa é talvez superar essa meta porque na soja a produtividade ficou em 72 sacas por hectare. O milho segunda safra vem se desenvolvendo bem e as perspectivas para o algodão também são positivas, segundo o executivo.
Na safra 2024/2025 houve um avanço de 5 mil hectares de área plantada, em uma nova fazenda. Para o próximo ciclo, o plano é expandir ainda mais, passando dos atuais 70 mil para, quem sabe, 80 mil hectares.
“Nós estamos olhando muito o mercado porque está tendo algumas oportunidades em função de que muita gente está altamente endividado”, admitiu o CEO.
Ele ressaltou que os novos passos serão dados “de forma cautelosa, porque o custo do dinheiro está muito alto nesse momento, os juros estão muito altos e a agricultura precisa de investimento”.
Gilmar Meneghini contou que a empresa está analisando, por exemplo, duas áreas novas para arrendar. “O arrendamento está na nossa agenda o tempo todo, nós vamos procurar porque o nosso objetivo é continuar crescendo em área”.
As “oportunidades” estão relacionadas a contratos de arrendamento que foram fechados no pico dos preços das commodities em 2022, até 2023, que foram ficando inviáveis. Em função disso, a Girassol diz estar recebendo “ofertas interessantes de gente querendo passar as áreas”.
A Girassol já é líder no mercado de sementes de algodão e agora busca ganho de market share na soja.
Para isso, aposta em investimentos realizados recentemente, de R$ 100 milhões, para duas indústrias de beneficiamento de sementes (IBS).
“Hoje nós temos capacidade para produzir mais de 1 milhão e meio de sacas de sementes de 40 kg de soja e a gente vai continuar o crescimento de market em função de toda a tecnologia que colocamos”, afirmou.
O destaque seria o vigor acima de 95% e o chamado “Bag ATI”, um produto exclusivo que promete manter a temperatura e a umidade da semente por muito mais tempo no deslocamento na viagem. Também foi implementado um sistema de rastreamento para as sementes, por meio de um aplicativo, que permite ao produtor rural cliente acompanhar a saída do produto até a chegada na fazenda.
“A gente vai investir muito nisso para ter um grande market share através desses diferenciais, não é através do preço”, ressaltou, mencionando que grandes players do mercado, mais recentes, têm priorizado ganhar escala e volume, sem abrir mão da qualidade.
Outro argumento de venda é o fato de a sementeira ser também “um produtor rural”, já que 100% são áreas próprias. Outras empresas do setor vêm operando com produtores terceiros, que cultivam a semente, o que nem sempre garantiria a mesma qualidade.
Para 2025, estão previstos mais R$ 100 milhões em investimentos. “Queremos trazer velocidade com resultado e ter a habilidade de conseguir interagir com conselho pra ganhar velocidade”.

Financiamentos
Sobre a estratégia financeira da empresa, o CEO disse que traz um “olhar forte” para que se tenha uma estrutura adequada de custos das dívidas e de estrutura dos investimentos. “Mas não com DNA financeiro na veia, de que tem que ser tudo financeiro, mas ter um olhar que temos projetos pra fazer. Esses projetos têm uma necessidade de resultado e a gente junto vai organizar”.
A Girassol Agrícola já fez no passado a emissão de um CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio) de R$ 183 milhões, que será finalizado no ano que vem, segundo o executivo.
Ele garante que foi uma experiência positiva para a empresa, mas diz que o momento atual é bem diferente daquele em que houve a emissão, com juros mais baixos.
“Temos hoje 20 grandes cotistas e o feedback é muito positivo. São pessoas que, se fôssemos emitir um (novo) CRA, ficariam na mesma carteira. Mas os custos estão muito maiores, por isso vamos olhar outras possibilidades”, explicou.
A empresa diz ter pedido propostas para diferentes instituições financeiras. Uma das possibilidades seria o crédito em dólar, mas acompanhado de operações de hedge, além do uso de capital próprio.
Meneghini disse que tem acompanhado emissões recentes no mercado, como o CRA da Boa Safra, e considera o custo muito elevado, por isso avalia outras opções.
De qualquer forma, são operações para 2026. “A Girassol tem SAP desde 2018 e é auditada por big four há mais de 4 anos, então temos facilidade de acessar o mercado financeiro. Provavelmente vai ter um CRA (no futuro), mas em tamanho diferente”.
O CEO garante que a Girassol não foi afetada pelas recuperações judiciais, especialmente porque só vende sementes de soja à vista. As operações à prazo ficam restritas aos negócios com sementes de algodão.
Foco no eucalipto
Outro projeto conhecido da empresa de Gilberto Goellner é o plantio de eucalipto. O investimento em florestas plantadas no grupo começou bem antes do crescimento da indústria de etanol em Mato Grosso, que hoje cria uma forte demanda por biomassa.

Gilmar Meneghini revelou que a empresa está ampliando em 3 mil hectares ao ano a área plantada com eucalipto. No total, o grupo já tem 20 mil hectares cultivados com a árvore.
Na visão da Girassol, Mato Grosso, especialmente a região do Alto Araguaia, pode se tornar um grande polo produtor de celulose. Há conversas com grupos internacionais há anos e a expectativa é de que no curto prazo algum acordo venha a ser confirmado.
O CEO da Girassol disse que ainda não pode revelar os detalhes das negociações em andamento, mas se diz entusiasmado com o projeto. “É o legado do seu Gilberto, ele viu 20 anos atrás, agora é fácil ver pelas usinas de etanol”.
A demora para um acordo para instalação de uma indústria na região, segundo Gilmar, é pela complexidade da atividade.
“Você precisa ter muitos produtores, uma cadeia enorme, investimentos bilionários. Tem que sustentar essa engrenagem por no mínimo 30 anos”, ponderou.