“Há alguns anos, não daria para imaginar que o setor de ovos seria tão sexy”. A frase, dita ao AgFeed por um executivo de uma das maiores empresas do segmento no País, reflete o momento de uma indústria que, escondida por muito tempo, nos últimos meses ganhou os holofotes e espaço na mídia com transações milionárias – e até discursos inflamados em função da expressiva alta dos preços, tanto no mercado nacional quanto no internacional.
Nesta quinta-feira, 13 de março, os holofotes foram mais uma vez acesos. Desta vez, no centro do palco está a Granja Faria, uma das líderes do mercado nacional, e o enredo envolve uma possível expansão internacional do grupo.
Segundo informações antecipadas pelo site Brazil Journal, a holding Global Egg – que tem como sócio Ricardo Faria, controlador da Granja Faria – estaria próxima a anunciar sua entrada no mercado dos Estados Unidos através da aquisição de uma das maiores empresas americanas desse setor.
O negócio estaria sendo feito em parceria com o banco BTG Pactual e envolveria valores superiores a US$ 1 bilhão e viria apenas quatro meses depois de Faria (também através da holding) fazer outra aquisição internacional: por R$ 730 milhões, comprou o grupo espanhol Hevo.
E apenas poucas semanas depois de outro mega negócio sacudir o mercado brasileiro de ovos: a compra de metade do capital da Granja Mantiqueira, que marcou a estreia da gigante da proteína animal JBS nesse segmento.
Procurados pelo AgFeed, tanto a Granja Faria quanto o BTG Pactual afirmaram que não irão comentar o assunto.
Caso se confirme a aquisição, Granja Faria e Mantiqueira “exportarão” para os EUA a concorrência que tem crescido entre as duas pela liderança do mercado de ovos no Brasil.
A Mantiqueira já anunciou, logo após a entrada da JBS na sociedade, seu interesse em atuar no mercado americano. Nas próximas semanas, executivos do grupo devem fazer as malas e se mudar para os Estados Unidos com a missão de organizar as operações do grupo no país.
Já a Granja Faria também ensaiava o movimento há alguns meses. No final de fevereiro, durante conferência com investidores, André Esteves, sócio do BTG Pactual, deixou escapar que o grupo de Ricardo Faria prepara sua oferta pública de ações (IPO) na Bolsa de Nova York.
O interesse pelo mercado americano acontece em um momento peculiar. Assim como no Brasil, a discussão em torno do preço dos ovos tem mobilizado entidades de consumidores, governo e empresas.
Lá, a inflação dos ovos é consequência sobretudo da expansão dos casos de gripe aviária - que já causou o abate de mais de 130 milhões de animais desde 2022 e provocou uma redução na oferta de ovos para o consumidor.
Somente em janeiro, de acordo com dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), mais de 18 milhões de galinhas poedeiras foram afetadas pela doença.
Como resultado, os preços dos ovos mais que dobraram em um ano, passando de US$ 2,06 em março do ano passado para US$ 8,20 na primeira semana de março deste ano.
A alta dos preços no varejo impactou as empresas do setor, que vinham de um período de dificuldades e passaram a reportar melhora nas receitas. Algumas das líderes do segmento tornaram-se alvo de rumores de do mercado de fusões e aquisições.
Pelo menos três delas, segundo uma fonte indicou ao AgFeed, teriam perfil para se encaixar em uma eventual negociação dentro do perfil da Granja Faria.
Uma delas seria a gigante Cal-Maine Foods, empresa listada na Bolsa de Nova York, cujo valor de mercado é estimado em US$ 4 bilhões. Mas o que estaria em jogo seria a participação pertencente às quatro filhas do fundador Fred R. Adams Jr., que estariam interessadas em se desfazer de alguns ativos.
Comunicado emitido pela própria empresa na semana passada anunciou que as ações com direito a voto da família Adams seriam convertidas em ações ordinárias, para serem comercializadas no mercado.
Atualmente, a fatia das irmãs Adams está avaliada em mais de US$ 400 milhões e corresponde a cerca de 12% da participação econômica na companhia. No entanto, elas possuem a maior parte das ações com direito a voto.
Na mesma semana, a companhia anunciou que usaria parte do saldo do caixa para recomprar cerca de US$ 500 milhões em ações.
Com a mudança no status dos papéis, o poder de voto da família Adams deve cair de 53,2% para 12%, segundo comunicado divulgado pela empresa em 25 de fevereiro.
Fundada em 1957 no estado do Mississipi, a empresa viu seus papéis valorizarem mais de 50% no ano passado, saindo de US$ 59,40 no início de março de 2024 e chegando a US$ 115,80 em 30 de janeiro deste ano. Atualmente o principal cliente da companhia é o Walmart.
Outro potencial alvo é a texana Vital Farms, líder no mercado de ovos premium com galinhas criadas a pasto, que reportou receita de US$ 606 milhões no ano fiscal de 2024, 28,5% superior ao obtido em 2023.
Em tempos de influenza aviária, o modelo de galinhas criadas a pasto da Vital Farms é ainda mais favorável, já que dificulta a contaminação de animais e o avanço rápido da doença, em caso de contaminação.
A companhia é avaliada em US$ 1,41 bilhão. Como parte da estratégia para alcançar receita de US$ 1 bilhão até 2027, a Vital Farms ampliou o número de fazendas fornecedoras de ovos em seu portfólio, passando de 300 para 425.
Nessa semana, a companhia relatou erros contábeis em seus relatórios recentes, o que fez as ações da empresa despencarem 6% nesta quinta-feira, cotadas a US$ 29,32. Segundo os analistas “ a queda foi uma reação exagerada do mercado”.
Outra companhia que pode estar na lista da Granja Faria é a Rose Acre Farms, a única companhia não listada das três. Segundo a RockReach reports, a receita da companhia seria da ordem de US$ 701,5 milhões.
Fundada no estado de Indiana, a empresa é a segunda maior produtora de ovos do país e conta com 15 unidades de produção de ovos em sete estados. Além da produção de ovos, a família também investe na produção de milho.
Em meio à crise do setor avícola americano, duas das três companhias se viram envolvidas em uma série de denúncias de que estariam combinando preços e até mesmo limitando a oferta de ovos no varejo de forma proposital
Com isso, o Departamento de Justiça dos EUA abriu uma investigação no final da semana passada, para apurar denúncias de que a Cal-Maine Foods e a Rose Acre Farms estariam envolvidas em tais práticas.
Segundo reportagem da Fortune, em 28 de fevereiro, uma dúzia de ovos grandes no Meio-Oeste americano era vendida por cerca de US$ 8,41 no atacado, valor 200% superior ao mesmo período de 2024, segundo dados do Departamento de Agricultura dos EUA.