Desde que assumiu o comando da Raízen, em novembro passado, o executivo Nelson Gomes vem promovendo mudanças na estrutura interna e na estratégia da gigante de bioenergia.
O redirecionamento de negócios, que começou com a alienação de ativos não diretamente ligados com o principal segmento da companhia, deve passar também pela venda da participação na rede OXXO, de lojas de conveniência, e chegar até ao ambicioso projeto de expansão do grupo nos últimos anos, a produção de etanol de segunda geração (E2G).
Há a expectativa de que Gomes redimensione o projeto, que previa a implantação de 20 unidades de E2G até 2030, com uma redução substancial desse número.
Nesta quarta-feira, 8 de janeiro, uma nota divulgada pelo BNDES colocou um pouco de combustível para energizar esse programa, garantindo recursos para a construção de uma dessas usinas.
O banco estatal anunciou a aprovação de um financiamento de R$ 1 bilhão para a implantação da planta de E2G em Andradina (SP), cidade próxima da divisa de São Paulo com o Mato Grosso do Sul.
A nova unidade terá capacidade instalada de produção de até 82 milhões de litros de etanol celulósico por ano.
O recurso virá de duas linhas de financiamento do banco público: programa BNDES Mais Inovação, com R$ 500 milhões, e do Fundo Clima, que vai garantir os R$ 500 milhões restantes.
O projeto tem investimento total previsto de cerca de R$ 1,5 bilhão, segundo o BNDES, e deve gerar mais de 1,5 mil empregos diretos durante a construção e 200 empregos ao longo da operação.
“O apoio do BNDES para a construção de uma unidade de etanol avançado vai contribuir para a expansão da fronteira tecnológica brasileira, além de atrair mais investimentos para a cadeia de fornecedores de insumos, máquinas e equipamentos", afirmou o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, na nota.
Procurada pelo AgFeed, a Raízen informou que não iria comentar a operação.
O etanol de segunda geração é produzido a partir do bagaço e da palha da cana-de-açúcar e permite aumentar em 50% a produção de etanol sem a necessidade de novas áreas de produção.
O projeto de E2G foi a estrela do IPO da Raízen, em 2021. Na época, a companhia estabeleceu o plano de implantar as 20 plantas até 2030, o que lhe daria a capacidade de produção de 1,6 bilhão de litros de etanol celulósico por ano.
Até o momento, a Raízen já anunciou a construção de nove unidades e tem outras onze ainda em projeto.
Duas dessas plantas de E2G já estão em operação, uma delas na usina Costa Pinto, em Piracicaba (SP) e a outra, dentro do parque de Bonfim, em Guariba (SP), inaugurada em maio do ano passado.
Mais duas unidades produtoras de E2G devem entrar em operação em breve: as plantas Barra, localizada em Barra Bonita (SP), e Univalem, em Valparaíso (SP).
As duas plantas terão capacidade nominal de produção de 82 milhões de litros por ano e custaram, cada uma, R$ 1,2 bilhão aos cofres da companhia.
O financiamento do BNDES é importante para ajudar a Raízen a resolver um problema elementar: conseguir recursos para botar de pé seu ambicioso projeto de E2G.
Na avaliação do banco BTG Pactual, segundo relatório distribuído a clientes no mês passado, as plantas representam "desafios financeiros significativos devido aos altos custos de produção".
Segundo as estimativas da instituição financeira, a taxa interna de retorno (TIR) com o E2G é de apenas 9%, montante considerado baixo tendo em vista o risco do empreendimento.
Por enquanto, a mudança nos planos futuros envolvendo o E2G está só no campo das especulações, mas já há, no mercado, quem crave que a Raízen vai mesmo ter de alterar seu planejamento de instalação de usinas.
Para Gabriel Barra, analista responsável por agronegócio, petróleo e gás no Citi Brasil, o cenário macroeconômico deve atravancar o planejamento da companhia.
Quando a Raízen anunciou seus projetos para E2G, a taxa Selic estava em 2%, nível muito distante dos atuais 12,25% – com novos aumentos já contratados pelo Comitê de Política Monetária (Copom) no começo de 2025.
“Pelo nosso modelo, não serão 20 usinas (2G), mas um número bem menor. O cenário do IPO da companhia, em 2021, mudou e os juros e as perspectivas são bem diferentes atualmente”, afirmou Barra.