Juntar o time de gestão com o dono do dinheiro em um fundo de terras. Esse é o resumo da tese do Fiagro da recém-criada gestora Arar Capital, que está reunindo sobrenomes de peso do agro brasileiro.
A gestora apresentou sua tese com exclusividade para alguns jornalistas e clientes do banco Andbank, nesta terça-feira, na sede da empresa, em São Paulo. A boutique de private banking global tem 93 anos de história e já soma R$ 230 bilhões sob gestão.
Durante o encontro, os sócios da Arar, José Humberto Teodoro e Paulo Ciampolini, deram mais detalhes sobre o novo veículo que deve chegar ao mercado nos próximos meses.
Com uma meta de captar R$ 500 milhões para comprar terras e arrendá-las a bons operadores, o fundo já nasce com um time de governança parrudo.
Além de um representante da própria Arar, o fundo terá um comitê com a participação de membros da família Biagi, referência no setor sucroenergético, e da família Rodas, com experiência centenária no cultivo de café e na laranja. Os investidores que integram o comitê são Rodrigo Biagi, Roberto Biagi, Sarita Rodas e Lucas Rodas.
Dessa forma, qualquer decisão de investimento será tomada por meio desse comitê de três votos, alinhando os interesses de gestão e de cada uma das famílias, contemplando os “donos do dinheiro”. Essas famílias já investiram R$ 165 milhões para o fundo sair do papel.
“Nossa ideia é manter um diálogo aberto. Vamos colocar um modelo de governança de empresas listadas, fazendo call de resultados trimestrais. Por ter essa base qualificada de investidores, trazemos os donos do dinheiro para tomar a decisão em conjunto”, explicou Teodoro.
O diferencial do fundo, segundo o gestor, é alinhar o interesse do investidor com o próprio fundo. Numa situação normal, o administrador de um fiagro tende a tomar mais risco, pois se der certo, o retorno aumenta, mas se der errado, quem perde é o investidor. “Eles vão tomar decisão com base no dinheiro deles”, diz.
A própria gestão da Arar também carrega uma experiência longeva no agro. De um lado, Paulo Ciampolini, sócio fundador da Baraúna Investimentos, acumula anos de gestão de investimentos em agtechs como Umgrauemeio, Symbiomics e Cromai. Além disso, a gestora cuida do patrimônio das famílias que compraram a Nitro.
O outro sócio da Arar é José Humberto Teodoro, mineiro que vem de uma família de gerações de fazendeiros. Ao longo da carreira, passou a trabalhar como executivo do agro, tanto em bancos de investimento quanto em empresas.
Em 2006 liderou o projeto da criação e listagem da BrasilAgro, onde ficou até 2014. Nesse período, rodou todo o País comprando terras para a empresa. “A maior parte das fazendas que a companhia tem fui eu que comprei”. Quando saiu para se juntar à BRF, era o CFO e diretor comercial da empresa.
Na empresa de proteínas, ficou quatro anos, onde foi responsável por toda cadeia de suprimentos da dona da Sadia e Perdigão. De 2018 até o ano passado, atuou na Terra Santa, onde foi CEO antes e depois da listagem na bolsa.
A ideia é democratizar um pouco mais o investimento em terras. “Um investidor que possui um patrimônio de R$ 10 milhões não encontra uma fazenda de 1 milhão para comprar. Não é igual ao mercado imobiliário, que é mais acessível”, acredita Teodoro.
O fundo será distribuído para os clientes do AndBank. De acordo com Brunna Viana, private banker da instituição, a base de investidores tem demandado produtos do tipo.
“Nossos clientes demandam por teses no mercado agrícola. Estamos aproximando a Faria Lima do mercado agro e de terras”, afirmou. No banco, o ticket médio dos clientes é de R$ 8 milhões por CPF, sem contar investimentos fora do País, disse o CEO do AndBank no Brasil, Rodolfo Pousa.
A Arar pretende listar o Fiagro em bolsa no futuro, mas prevê postergar esse movimento ao máximo. A gestão acredita que o perfil de investidor, que será exclusivo para qualificados, deve fazer com que a liquidez de venda seja pequena.
O fundo buscará fazendas que valham, em média, R$ 100 milhões, com um ticket mínimo de R$ 30 milhões. O fiagro tem um prazo de duração de 10 anos, então a ideia é criar contratos de arrendamento de cerca de 5 anos. Nos próximos dois anos a gestora irá alocar o capital levantado.
José Teodoro percebeu que o mercado de Fiagros carece de um veículo de alocação de longo prazo, e por isso optou por essa estratégia.
Por que investir em terras?
O que explica a ideia de conectar a Faria Lima ao mercado de terras? A resposta é simples para José Teodoro: “porque o retorno é muito bom”.
Em um estudo apresentado por ele, a relação entre risco e retorno de quem comprou terra nos últimos 100 anos nos Estados Unidos é melhor frente a investidores do S&P, um dos principais índices de ativos listados por lá.
“Vi nas últimas décadas o fazendeiro ficar rico em relação a empresários de outros setores. Como outros segmentos não andaram tanto, ficou ainda mais gritante. Hoje, um agricultor com mil hectares agricultáveis no Brasil tem um patrimônio que beira os R$ 100 milhões”, estimou.
Um investidor que participava do café questionou Teodoro se o boom do preço das terras ainda deve continuar nos próximos anos, ou se atingiu um pico. Na visão do gestor, a alta deve persistir, principalmente por conta de uma demanda crescente por terras em todo o mundo.
Um estudo recente da consultoria Mckinsey estimou que, para garantir o abastecimento global de alimentos e energia, o mundo precisará de mais um "Brasil inteiro" em novas terras agricultáveis.
Nos cálculos da empresa, serão necessários entre 70 milhões e 80 milhões de novos hectares, algo próximo ao que o País cultiva safra após safra.
A instituição levou em conta três cenários, sendo que o mais favorável demandará apenas novos 30 milhões de hectares pelo mundo. No mais crítico, o mundo precisará de mais de 100 milhões de hectares. Cada cenário desses engloba a quantidade de eventos extremos climáticos nos próximos anos.
O Brasil tem um potencial de 100 milhões de terras que podem ser restauradas para uso agrícola, estimou a Mckinsey. É nesse tipo de oportunidade que o Fiagro da Arar Capital quer trabalhar, buscando produtores que estejam procurando compradores para suas fazendas.
“A escassez de área potencializa o preço de terra”, estima José Teodoro, da Arar Capital.
O fundo está ativo desde março, e já conta com algumas fazendas prospectadas. Nos cálculos de Teodoro, um funil que se inicia com 100 fazendas se torna 15 após uma primeira avaliação, e posteriormente viram 5 visitas a campo. Por fim, de duas propostas na mesa uma deve ser fechada.
A Arar olha principalmente o Cerrado, com foco em estados como Mato Grosso do Sul e Piauí.
Além de comprar a terra para arrendar, a tese envolve alguns investimentos para valorizar os hectares.
Ele explica que o fundo busca terras com potencial de migração de cultura, seja de pastagem que pode virar área de soja ou alguma terra com a oleaginosa que pode virar algodão.
Além disso, avalia terras com potencial de irrigação, de forma a aumentar o valor da área e a produtividade.
“Olhamos para áreas de fronteira agrícola. São aquelas de produtores que abriram área e viram suas margens apertar, e por isso estão dispostos a vender”, diz.
Ele ainda acrescenta que a gestora está de olho em fazendas de empresas que entraram em recuperação judicial, e que podem colocar os ativos à venda para ajustarem suas contas.
José Teodoro considera esse tipo de oportunidade como “terras marginais”, que mesmo que sejam menos eficientes que áreas já plantadas, podem suprir a demanda projetada para o futuro nos grãos brasileiros.