Aos 72 anos, com a sucessão resolvida no Grupo RZK, o empresário José Ricardo Rezek poderia estar pensando em usufruir de uma rotina mais tranquila longe das empresas, agora comandadas pelo filho mais novo, que carrega o mesmo nome do pai, com uma diferença no sobrenome (Lemos Rezek).

Ele ainda não pensa nisso, pelo menos por enquanto. Prova disso foi a meta que estabeleceu a si próprio – e, por consequência, ao conglomerado, do qual é fundador e presidente do Conselho de Administração – quando completou 70 anos: dobrar, em seis anos, a área de terras do braço agropecuário do grupo.

“Nós sentamos e montamos uma estratégia de crescimento”, contou o Rezek pai ao AgFeed.

“A minha e a do grupo. A do grupo ficou sob a responsabilidade dele (aponta para o filho). Eu fui bem rápido e falei assim: ‘A minha você me deixa tocar do jeito que eu quero. E era o crescimento, dobrar a quantidade de terra em seis anos’”.

Fundado em 1980, o Grupo RZK é hoje bastante diversificado. Tem negócios que vão da agropecuária à concessão de serviços públicos, passando por distribuição e locação de máquinas agrícolas, conectividade, serviços digitais, incorporação imobiliária e energia. A receita é estimada em mais de R$ 3 bilhões anuais.

“Mas a paixão dele, o que o motiva, no final do dia, é o agronegócio, a parte produtiva, as fazendas”, afirma o filho. “Ele é nossa gasolina, sabe fazer isso com uma maestria”.

E está fazendo. Dois anos depois do desafio, diz que faltam apenas 36 mil hectares para atingir sua meta. “Agora está facinho”, brincou.

Assim, mais da metade do caminho ele já cumpriu – e ainda faltam quatro anos de prazo. Quando começou, o Grupo RZK possuía mais cerca de 82 mil hectares.

Hoje, são 128 mil hectares produtivos sob sua gestão – e mais 11 mil que, desde julho, fazem parte da Fazendas Preciosa, uma joint venture formada com a SLC para o cultivo de soja, milho e, futuramente, algodão em Querência, no Mato Grosso.

A conta, portanto, prevê chegar a 164 mil hectares em 2028.

O bancário que virou pecuarista

“Tenho inúmeros planos ainda, pela minha juventude”, afirmou Rezek nesta rara entrevista. Animado e amistoso, ainda congratulou o repórter: “Parabéns, você foi o primeiro que conseguiu me laçar”.

Com estilo low profile e avesso as fotos (pediu para que não sua imagem não fosse exibida na reportagem), o empresário construiu, nas últimas quatro décadas, uma impressionante trajetória.

Filho de um próspero comerciante de Barretos, no interior de São Paulo, ele começou a vida profissional aos 19 anos, como bancário no extinto BCN.

No banco da família Conde se aproximou mais do agronegócio. A atividade pecuária movia a economia de Barretos, com o frigorífico Anglo sendo um dos principais negócios da cidade.

“Todo o dinheiro que eu ganhava, eu aplicava em bois. Comprava bezerro. Então, eu tinha duas vertentes. Eu comprava bezerros e vendia. E aí comprava minhas bezerras. E, quando elas viravam na idade de reprodução, eu as vendia e comprava bezerro de novo, dobrando o meu número. E aí começou a história”.
Pouco tempo depois, em meados dos anos 1970, Rezek já tinha a primeira fazenda, uma boiada e estava “contaminado” pelo vírus do agro. Nessa época, o BCN tinha grandes propriedades e investia em pecuária, inclusive no Mato Grosso, estado que começava a ser desbravado por produtores rurais vindos do Sul.

“Aquilo era o Sertão”, lembrou. “E ali precisava de pessoas que tivessem compromisso com o negócio”.

Rezek comprou primeiro a ideia, depois uma fazenda, onde hoje é o município de Doverlândia.

Ao comunicar o então chefe no banco, acabou convidando-o para ser sócio na propriedade, de 200 alqueires. O ano era 1979 e a decisão que moldaria sua vida estava tomada.

“Aí eu já tive que começar a me desfazer do meu gado. E aquilo doía. Até que apareceu uma segunda oportunidade e eu fui rápido”. Os dois atraíram mais um sócio, um diretor do banco, e compraram uma segunda fazenda, vizinha da primeira, dando origem a uma propriedade que está no grupo até hoje, a Fazenda Três Companheiros.

Posteriormente, Rezek adquiriu a parte dos sócios, mas manteve o nome da propriedade, que ainda viria a crescer muito mais.

“E aí ninguém me segurou mais, né? Hoje eu falo que os Três Companheiros são minha esposa e meus filhos”, afirmou.

Comprador de vizinhos

A atual formatação da propriedade, construída com mais 26 aquisições de fazendas vizinhas, explica bem o estilo empresarial de Rezek, assim como a estrutura da RZK Agrícola, braço agropecuário do grupo.

O fundador não gosta de falar em fazendas, mas em núcleos de fazendas, já que cada um deles é resultado de uma soma de propriedades compradas ao longo dos anos.

“Sou um eterno comprador dos vizinhos”, disse Rezek. “Os vizinhos já ligam para ele e na conversa, na brincadeira, ele sempre fala assim: ‘Você manda no preço, eu mando no prazo’”, emendou o filho.

Assim, muitas dessas aquisições renderam histórias e amizades para muito tempo, que Rezek relata com indisfarçável orgulho. O apreço pelas negociações está no sangue desse descendente de sírios e libaneses.

“No final do dia, quando meu pai compra uma fazenda, ele quer continuar uma história, não fazer só a história dele”, definiu o jovem José Ricardo.

Hoje o grupo tem cinco núcleos de fazendas, onde se produz soja, milho e arroz. Cerca de 55 mil hectares são reservados à pecuária de ciclo completo, com um plantel total de 47 mil cabeças.

Na fazenda Três Companheiros o grupo mantém um confinamento, onde é feita a fase de engorda do rebanho das raças Nelore e Angus, destinado à produção de carnes para exportação. O rebanho total ultrapassa 47 mil cabeças de gado Nelore e Angus e é produzido com padrão para exportação para o mercado europeu.

O resíduo do confinamento é transformado em adubos para as lavouras. A infraestrutura de armazenagem tem capacidade para cerca de 2 milhões de sacas de grãos, segundo o site da companhia.

Negócio atrai negócio

O estilo Rezek de fazer negócios, com muita conversa e atenção às oportunidades, abriu caminhos para a formação de um grupo diversificado. O lado imobiliário, por exemplo, surgiu da observação do mercado nos tempos em que atuava na área imobiliária do BCN.

Com a ideia de construir um edifício, mais uma vez ele recorreu ao antigo sócio em busca de capital. Ao invés de juros, ofereceu participação nos lucros do negócio e, assim, na segunda metade dos anos 1980, o grupo já tinha um novo ramo de atuação.

Hoje, a RZK Empreendimentos é responsável por um dos maiores projetos em execução na Grande São Paulo, um complexo de 59 torres às margens da Rodovia Raposo Tavares, no município de Osasco.

“Nada se dissocia”, explicou Rezek. “Daí para frente, o dinheiro que sobrava ia para comprar a fazenda e o que ganhava no prédio, misturava no caixa e fazia mais um prédio”.

Já o negócio de máquinas agrícolas nasceu da própria necessidade. Rezek já havia adquirido novas áreas, inclusive formando um novo núcleo de fazendas no município de Querência, no Mato Grosso. Mas não encontrava os equipamentos e os serviços que necessitava para avançar com a produção por ali.

Então, em 2008, procurou a fabricante de máquinas John Deere e propôs comprar uma concessionária para atender a região.

“Tivemos que comprar, porque a gente não tinha serviço e a gente enxergava uma grande oportunidade”, afirmou José Ricardo filho. “A concessionária veio naturalmente”, reforçou o pai.

Naturalmente, ao seu estilo, foi ampliando seu olhar, comprando outras revendas da marca, sempre em acordo com a montadora, até formar uma rede que hoje conta com 10 lojas nas principais cidades agrícolas de Mato Grosso e Goiás.

Rezek entende que, neste segmento, ainda há muitas oportunidades a serem aproveitadas. “O processo de consolidação na John Deere ainda está acontecendo”, disse. “Nós queremos estar em destaque como temos tido ultimamente. Temos vontade de continuar adquirindo”.

Nessa área, um dos mais novos negócios do grupo é o que deve, segundo o fundador, receber grande atenção: a área de aluguel de máquinas, com a RZK Rental.

“A gente tem buscado, na Rental, ajudar o nosso cliente a trabalhar de maneira mais leve, porque a aquisição de máquinas exige muito Capex”, afirmou.

No grupo, um negócio gera uma nova necessidade, que gera outro negócio. A Sol by RZK, empresa de infraestrutura de conectividade no campo que é a caçula do conglomerado, surgiu, por exemplo, da demanda de tirar maior eficiência da tecnologia embarcada nas máquinas que usam e vendem.

“Nossas máquinas chegaram num nível de tecnologia que, sem conectividade, você não conseguia extrair valor para o cliente”, resumiu.

Mas não era só isso. Para o negócio de concessionárias, ter o cliente conectado oferecia a oportunidade de atender de forma mais rápida, à distância, ao invés de ter de enviar um técnico até fazendas distantes para fazer um diagnóstico, que depois podia gerar uma nova viagem para buscar uma peça e substitui-la, por exemplo.

“Hoje, com a conectividade, você vai lá de forma remota, descobre o código de erro, abre uma ordem de serviço e então leva as peças. Aquilo do passado era tempo de máquina parada, a tal da ineficiência setorial”, disse José Ricardo.

O atual diretor executivo do grupo acredita que o uso mais intensivo da tecnologia vai destravar um grande potencial produtivo que está represado em várias regiões do Brasil.

E se orgulha de o fato de a conectividade levada pela Sol contribua também para levar telecomunicações, além das fazendas clientes, para regiões e até cidades não atendidas por esse tipo de serviço.

“A gente, como empresário, também tem de contribuir para o cenário de desenvolvimento nacional do nosso país. E eu acho que contribuímos”.

Para onde o RZK olha

O comprador de vizinhos não olha apenas para o outro lado de suas cercas. Rezek está atendo ao mercado imobiliário rural, que, segundo ele, “perdeu liquidez nos últimos tempos”.

“Eu acho que tem boas oportunidades imobiliárias. O grande e o médio produtores, agora, estão numa condição de consolidação do negócio, de ter essas oportunidades e absorvê-las”.

Ele vê esse movimento acontecendo sobretudo a partir do Mato Grosso, com os grandes grupos formados ali ampliando suas áreas para o Piauí e para o Maranhão.

Mas os olhos de Rezek brilham um pouco além. “Agora a grande vertente é o Pará”, afirmou. “Nós elegemos o estado do Pará, pelo desafio e pela oportunidade. Lá é a fronteira que vai um dia fazer sombra ao Mato Grosso. Pelo porte, pela condução política e pelo índice pluviométrico”, explicou.

Rezek se apoia nas contas. Segundo ele, a infraestrutura de portos na região permite obter um dólar a mais que o Mato Grosso por saca de soja e, em outra mão, pagar menos pela tonelada de adubo.

“A gente detectou isso e vai ser lá. Isso não quer dizer que eu não vou continuar comprando em Goiás, no Mato Grosso. Eu estou sempre atento aos vizinhos”.

O apetite por aquisições precisa, entretanto, ser saciado com recursos. Ex-bancário, Rezek disse que prefere evitar dívidas de longo prazo e busca, assim, financiar o crescimento com recursos provenientes dos negócios do próprio grupo.

“Eu tenho investido todo o nosso ganho nas operações”, disse. “É a tese do grupo, por isso que nós crescemos nessa velocidade. E nós temos um problema, que é o tanto de banco que bate aqui na porta querendo nos dar dinheiro”.

Rezek deixa as questões cotidianas nas mãos do filho para pensar o futuro. “A sucessão foi uma coisa maravilhosa que ocorreu na família. A gente teve muito cuidado e teve uma bênção incrível pelo posicionamento da minha filha (Maria Beatriz Rezek). Ela reconheceu o meu filho, que ele seria a sequência do nome da família, embora ela fosse mais velha”.

Depois dos 76 anos, com a sua meta pessoal batida, diz que quer criar, com a esposa, o “Grupo RZK2”, se consoricando com outras companhias em busca de outros propósitos.

“Eu tenho projetos maravilhosos e definidos. E o grupo vem sendo preparado com executivos de primeira. É mais uma qualidade do meu filho. Ele é um excelente headhunter e é um talento também na montagem da estrutura do grupo para poder crescer”.