Dos 27 anos de existência da Santos Brasil, Antonio Carlos Sepúlveda atua na companhia e acompanha sua evolução há 24. E desde 2010 como diretor-presidente, com resultados que incluem por exemplo, uma valorização de quase 120% nas ações da empresa nos últimos cinco anos.

O CEO da Santos Brasil recebeu o AgFeed, para uma entrevista exclusiva, no escritório da empresa, no bairro do Itaim, na capital paulista, animado com o teor da conversa – falar sobre o agronegócio e suas oportunidades para seguir crescendo no comércio exterior, algo que, sem dúvida, tem beneficiado a companhia.

A Santos Brasil já é a terceira maior empresa de infraestrutura do Brasil em valor de mercado, perdendo apenas para a Rumo Logística e para a CCR, concessionária de rodovias.

A companhia responde por cerca de 18% do total de movimentação de contêineres no País, com 3,5 mil funcionários, 8 concessões portuárias e uma empresa de logística.

Além da forte operação em Santos (SP) e investimentos recentes no Porto do Itaqui, no Maranhão, está presente no Pará e em Imbituba, Santa Catarina.

“O agro tem um papel muito importante na Santos Brasil. Dos contêineres de exportação que passam por aqui, 55% são produtos do agro”, ressaltou Antonio Carlos Sepúlveda. Esta fatia agro para a empresa era de 35% em 2006, época em que a companhia fez o IPO.

A empresa não participa de uma boa parte das exportações do agronegócio, já que produtos como soja e milho são prioritariamente embarcados em graneleiros, com outro tipo de operação, mas a Santos Brasil é especializada em contêineres e o agro também vem crescendo neste segmento.

Os dados do Porto de Santos mostram que a exportação de açúcar por contêineres, por exemplo, foi o maior da história em 2023, movimento que beneficia a Santos Brasil. O embarque ficou próximo de 2,9 milhões de toneladas, crescimento de 77% em relação ao ano anterior. O maior volume havia sido em 2020, com 2,5 milhões de toneladas.

Sepúlveda diz que o açúcar já ultrapassou a celulose (uma parte da exportação brasileira ocorre em contêineres) no ranking, seguida por proteína animal, principalmente carne bovina, café e algodão.

A Santos Brasil é bastante conhecida pela especialização em operar contêineres refrigerados e foi beneficiada pelo boom nas exportações brasileiras de carnes, especialmente a partir de 2018.

Para este tipo de embarque são necessárias estruturas específicas, como tomadas e fornecimento de energia elétrica ao longo de toda movimentação, inclusive no terminal. Os grandes exportadores, como Minerva e JBS, estão entre seus clientes.

Um dos diferenciais para crescer no agro é o fato de que a importação de produtos acabados da China, por exemplo, cresceu muito. E com isso abriu a possibilidade de que estes contêineres voltem para a Ásia, com frete competitivo, levando produtos como celulose e até soja.

“Tem mercados menores onde não dá para entrar com um navio inteiro. É necessário um estoque enorme no porto e no destino também tem que ter um armazém enorme. No contêiner não, você pode mandar 10 por dia para o porto. Funciona de forma parecida com a aviação. O contêiner tem oferta super frequente de espaço e com espaços menores”, explicou o CEO.

Em paralelo, a empresa segue forte nas cargas “cativas” de café, proteína animal e algodão, que hoje praticamente só são exportadas por contêineres.

Desafios em 2023

Apesar dos bons resultados financeiros que seguiu apresentando, o ano de 2023 foi marcado pela queda nos volumes movimentados em contêineres e, com a Santos Brasil, não foi diferente.

Se considerados os embarques e desembarques, o Porto de Santos reportou na semana passada que houve uma queda de 2% nos volumes, em toneladas. Já em TEUs, que é a medida mais usada pelas empresas que operam nos portos, o recuo foi de 4% em 2023, na comparação com o ano anterior, ficando em 4,8 milhões de TEUs.

O TEU é uma medida que equipara contêineres de diferentes tamanhos, na tradução do inglês seria “Unidade Equivalente a Vinte Pés”. A boa notícia é que, em dezembro, houve uma recuperação nos números, com crescimento de 15,5% nos embarques e desembarques de contêineres em TEUs, em Santos como um todo, considerando todas as empresas.

No caso da Santos Brasil, o balanço com o fechamento do ano será divulgado somente em março. Até o terceiro trimestre acumulava uma queda de 11,9% na movimentação de contêineres, mas no guidance que foi divulgado, previu um recuo no ano de no máximo 8%.

Ainda assim, nos primeiros nove meses de 2023 a Santos Brasil atingiu Ebitda de R$ 633 milhões, aumento de 3,5% na comparação com o mesmo período do ano anterior.

“O agro foi o que salvou 2023, já que houve uma queda grande de importação”, disse o CEO. Ele lembrou que o início do ano foi bastante desafiador, com juros altos e “todo mundo super estocado, preparado para uma demanda maior, caiu o volume no porto de Santos e caímos com eles”.

A Santos Brasil também é a empresa que opera boa parte dos volumes importados no País de insumos para fabricar produtos como defensivos agrícolas, com clientes como Bayer e Basf, embora não divulgue dados específicos sobre este tipo de carga.

Otimismo para 2024

O CEO da Santos Brasil acredita que o porto de Santos deve registrar um aumento de pelo menos 4% na movimentação de contêineres em 2024, “já que é comum crescer o dobro do PIB”.

Neste cenário, disse ao AgFeed que a empresa prevê avançar acima deste patamar. “Esperamos ganhar market share esse ano e crescer mais que o porto, em Santos”, afirmou.
Sepúlveda acredita que 2024 será melhor que o ano passado para o Brasil, de modo geral, “apesar da geopolítica ainda muito complicada”.

“O agro não vai crescer tanto, mas vai crescer, e isso suporta os volumes nos nossos terminais. Temos tanto Vila do Conde (PA) e Santos com uma conexão muito grande na exportação com o agro”, destacou.

Além de historicamente exportar produtos como café e celulose, o executivo lembra que a empresa também tem um terminal de veículos. “E exportamos muita colheitadeira John Deere. É um grande cliente nosso”, lembrou.

O executivo admite que está curioso para saber se haverá efeito do El Niño nas exportações da empresa, mas como não depende de soja e milho para seus resultados, acompanha com atenção o mercado do café, que utiliza o contêiner, e segue apostando no crescimento do algodão.

“Hoje 100% do algodão vai por contêiner. No ano passado a safra veio tarde, mas veio muito forte, o Brasil produzir e exportar mais algodão é boa notícia para nós”, afirmou.

De qualquer forma, as exportações de soja em contêineres também vêm crescendo. Em Santos, o volume chegou a 23 mil toneladas, aumento de 325%. Segundo a Santos Brasil, a exportação de sementes também vem registrando maior procura.

Investimento para atender o agronegócio

O CEO da Santos Brasil diz que a empresa investiu R$ 680 milhões em seus terminais em 2023. Quase metade foi direcionada a Itaqui, onde o foco são granéis líquidos, com a importação de óleo diesel, que abastece a demanda crescente da região agrícola do Mapito, entre Maranhão, Piauí e Tocantins.

“Lá ganhamos a licitação de dois terminais, um greenfield e dois brownfields. Começamos com 25% da capacidade operacional, no final de 2022”, disse Sepúlveda sobre Itaqui.

Em 2024 a capacidade subirá dos atuais 50 mil metros cúbicos para 110 mil, até chegar a 100%, em 2025, com 190 mil. “É a energia que movimenta o agro, caminhões e colheitadeiras”, ressalta.

No Tecon Santos, o projeto é fazer a atual capacidade de 2,4 milhões de TEUs para 2,6 milhões em 2025 e 3 milhões em 2031. O investimento estimado até lá é de R$ 2,6 bilhões. Atualmente cerca de 12% do volume total movimentado na operação da empresa em Santos (incluindo importações, onde prevalecem produtos acabados) é agro.

Além dos carros-chefe açúcar, celulose, café, algodão e carnes, há também entre os primeiros do ranking as exportações de frutas, vegetais e flores.

A Santos Brasil também está presente em Vila do Conde, em Barcarena, no Pará, onde foram investidos R$ 56 milhões nos primeiros 9 meses de 2023. Segundo o executivo, no Tecon Vila do Conde os destaques são madeira, carne bovina, couros peles e penas, além de também frutas e flores.

Em Imbituba, o foco é a operação de cabotagem e, ainda assim, o agro representa 43% da movimentação total, segundo o executivo, principalmente em função do arroz que é produzido majoritariamente no Rio Grande do Sul e é distribuído para o Norte. Há também o chamado “feeder”, quando navios menores, levam as cargas para locais em que saem as embarcações de maior porte.

Para 2024, o investimento previsto em todas as operações foi estimado em até R$ 600 milhões. Sepúlveda destaca que objetivo é servir o comércio exterior brasileiro, que hoje é suportado por commodities, especialmente agrícolas, petróleo e minério de ferro.

“A nossa estratégia sem sombra de dúvida começa no agro. Porque é o setor que cresce no Brasil. Não tem expectativa de ter uma indústria crescente para a exportação. A nossa expectativa é a conexão com o crescimento de exportações de produtos agrícolas” ressaltou.

Uma das oportunidades para crescer no agro, segundo o executivo, está nas políticas ESG que a Santos Brasil vem adotando.

“A Santos Brasil já é carbono neutro no escopo 2, portanto a proteína que chega no terminal já recebe energia neutralizada. E o terminal caminha para neutralizar 70% de suas emissões até o ano de 2040”, revela.

Ele acredita que as empresas exportadoras do agro serão cada vez mais cobradas por metas de descarbonização e que a empresa poderá contribuir com os clientes para que atinjam estes objetivos. “Como nossa operação é mais limpa isso beneficia a pegada de carbono deles”.

Ele lembra que quem não é cobrado pelo cliente é cobrado pelo acionista, por isso considerada a descarbonização hoje o item número 1 do ESG na logística.

“No final do ano passado chegaram 10 guindastes, todos elétricos, estamos trocando diesel por elétricos, estamos eletrificando nossa movimentação de carga horizontal”.

Terminal de contêineres no Porto de Santos

Logística no limite?

O CEO da Santos Brasil discorda da afirmação frequente entre líderes do agro de que “a logística no Brasil está no limite”.

“A logística em todo o mundo custa muito caro. Quanto custaria você ter um estoque de logística disponível? Então não significa dizer que os projetos existentes não podem aumentar sua capacidade. Todos os operadores logísticos estudam a demanda e vão se preparando para o futuro”, afirmou.

Ele citou investimentos “grandiosos” que vêm sendo feitos no porto de Santos, em ferrovias, em terminais de contêineres. “Tem um de fertilizantes que vai dobrar de tamanho, com a transferência de um terminal de passageiros para outro lugar”, deu como exemplo.

Na opinião de Sepúlveda, muitas vezes se olha “a fotografia” de determinado período. “Teve muito evento climático que desarrumou a logística, enchente no sul, seca no norte. Quando tem isso em algum lugar acaba tendo um estrangulamento. Foi o que aconteceu num mês pontual, principalmente em novembro”, lembrou.

“Se olharmos para a BR 163 e o investimento em ferrovias, acho que o Brasil está numa situação que nunca teve na vida. O Arco Norte todo sendo construído de uma maneira muito sofisticada”.
O executivo diz, no entanto, que sempre há algo para melhorar e aponta como principal preocupação o “last mile”, a área que fica na chegada ao porto.

“Temos que ter atenção muito grande em Santos no sistema Anchieta-Imigrantes, foi o que deu problema em 2023, com soja atrasando. Teve soja em dezembro e a chegada a Santos ficou supercongestionada”, alertou

O executivo se disse animado com a proposta do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, de construir uma terceira pista no sistema Anchieta Imigrantes.
Sobre o adiamento do plano de privatizar o porto, evitou comentar, garantindo que não há reflexos para a empresa.

Sepúlveda garantiu que a Santos Brasil está operando sempre com capacidade suficiente para aumentar movimentação, se for necessário.

“Temos 2,4 milhões de TEUs de capacidade. E vamos fechar o ano com 2,084 milhões, então estou com buffer de 300 mil TEUs de capacidade e estou fazendo mais, vai chegar 2025 com 2,6 milhões de TEUs. Lá, estaremos olhando na frente para ver ampliações. O gargalo de 2023 foi o last mile”, reforçou.

Sobre a possibilidade de a empresa investir em terminais de graneis sólidos com foco em grãos, por exemplo, o executivo disse que não está nos planos.

“Nossa estratégia é terminal de contêineres, logística de carga em contêineres e terminal de granel líquido. Vamos crescer nestas três áreas”, afirmou.

Admitiu que já estudaram este time de investimento, mas consideram muito verticalizado, onde grandes tradings dominam, por isso seria um investimento grandioso e arriscado. “Nestas três avenidas enxergamos que conseguimos melhor retorno”.

Para os próximos investimentos, se diz em posição confortável, financeiramente. “A empresa investe entre R$ 600 e 700 milhões por ano e a dívida é da ordem de R$ 400 milhões, se mantém constante”.

“Dentro do nosso compromisso estratégico está não deixar faltar capacidade no porto de Santos, por isso tem agenda de investimento muito forte, o agro pode esperar, vamos atender a demanda”.

Ele reforça que, desta forma, pretende ajudar a evitar filas, que para exportações de café, açúcar, celulose, carne bovina, entre outras, poderia acabar trazendo fretes mais caros, para pagar a ineficiência.

Eficiência cresce

Tendo acompanhado 24 anos da história da Santos Brasil, Antonio Carlos Sepúlveda gosta de contar a evolução da operação portuária “que se confunde com a trajetória da própria empresa”.

Segundo ele, quando a empresa foi criada, em 1997, o Brasil tinha um dos piores índices de produtividade nos portos do mundo, em relação a contêineres.

A Santos Brasil nasceu de uma das primeiras privatizações feitas no setor, com a missão de profissionalizar as operações.

“Nesta época a produtividade de carregamento de um navio de contêiner era de 11 movimentos por hora. Hoje nossa média é de 106”, contou. A medida se refere a quantos contêineres que estão no pátio se consegue colocar em um navio, ao longo de uma hora.

O executivo lembra que nessa época o agro tinha menos importância, o maior volume era a exportação de café.

Um fundo do banco Oportunity está até hoje entre os principais acionistas, que na época também contava com diversos fundos de pensão e o Citibank.

A expansão da empresa ocorreu principalmente após o IPO, em 2006, quamdo foram comprados o Tecon de Vila do Conde e também de Imbituba, além de uma empresa de logística. Já o terminal de graneis líquidos em Itaqui foi adqurido em 2021.

“Teve um trabalho forte de evolução, com muito investimento. Nesta época o terminal tinha 366 mil metros quadrados e 500 m de cais. No começo movimentava 300 mil TEUs. Agora, encerramos com 2,4 milhões de TEUs em 2023”.

A área do Tecon Santos hoje tem 650 mil metros quadrados e quase 2km. “Esse crescimento foi puxado muito pelo agro. Começaram a vir navios grandes, começou a fazer transbordo de outras localidades que vão principalmente para a Ásia” disse o CEO.