Uma reunião técnica, a portas fechadas, no Parlamento Europeu nesta quinta-feira, 8 de junho, vai marcar um novo posicionamento brasileiro em relação ao Green Deal, novo conjunto de restrições socioambientais imposto pela União Europeia para a importação de produtos de origem agropecuária.

Liderada pelo embaixador Pedro Miguel da Costa e Silva, experiente negociador com mais de 30 anos de atuação na Organização Mundial do Comércio (OMC), a missão brasileira deve propor que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) sejam utilizados como ferramentas oficiais para comprovar se uma determinada fazenda está ou não dentro dos critérios de desmatamento exigidos pelos europeus.

A reunião em Bruxelas faz parte de uma extensa série que reúne representantes da UE e de países exportadores de commodities agrícolas em busca de detalhar de que forma será a operação da nova legislação.

Pela norma aprovada em abril passado, os exportadores têm até dezembro de 2024 para se adequarem aos critérios estabelecidos. As principais restrições dizem respeito a produtos oriundos de propriedades com desmatamento posterior a janeiro de 2021 ou que não atendam à legislação trabalhista em vigor em seus países.

“Serão 18 meses de muita negociação”, afirma Bernardo Pires, diretor de Sustentabilidade da Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove). Representante da cadeia da soja, a entidade tem sido uma das mais ativas em contestar pontos do Green Deal, que acompanha desde as primeiras consultas públicas, em 2019.

Segundo Pires, a UE não aceitou, anteriormente, sugestão semelhante, alegando que vai desenvolver um sistema próprio para a verificação do desmatamento.

Desta vez, porém, o Brasil deve adotar posição mais firme em defesa dos seus instrumentos, que são reconhecidos internacionalmente como avanços na área de controle ambiental.

O discurso brasileiro pode ganhar novos matizes também em relação à adoção de uma política de reciprocidade no que se refere a restrições socioambientais.

Em estudo no Itamaraty, a ideia pode ser transformada em projeto de lei que exigiria, de exportadores europeus, o rigoroso cumprimento das legislações ambientais e trabalhistas nas propriedades rurais daquele continente.

A percepção brasileira é a de que, embora endureça externamente, os governos europeus fazem vista grossa às práticas internas, sobretudo no que diz respeito ao cumprimento dos códigos sobre uso de recursos hídricos e à utilização de mão-de-obra informal nas fazendas.

O impacto do Green Deal

Segundo a Abiove, as adaptações necessárias para que as empresas brasileira do complexo soja cumpram as exigências europeias podem gerar um custo de cerca de US$ 500 milhões de dólares.

Segundo Pires, um dos maiores gargalos impostos pela nova legislação é a necessidade de se implementar uma estrutura logística segregada, que garanta que a soja colhida nas propriedades rurais aptas não seja misturada, em armazéns, caminhões ou portos, a produto de outra origem.

“É muito difícil executar isso, considerando que um silo, por exemplo, pode conter grãos de dezenas de fazendas”, argumenta.

Uma estudo, feito por duas tradings internacionais, que consistiu na exportação de um navio de soja segregada e separada para a Europa, demonstrou que o custo da tonelada de farelo ficou US$ 30 mais alto, gerando um impacto de 6% no preço praticado regularmente.

“A Europa não se dispôs a pagar mais quando exigiu soja não transgênica, não quis pagar mais quando passou a falar em certificação e não quer pagar mais agora também”, afirma.

“Assim como não conseguiram efetivar as exigências anteriores, também não conseguirão, com essa atitude, evitar desmatamento”.
A Abiove afirma que a demanda da Europa é legítima, mas que só será efetiva se passar a considerar o pagamento por serviços ambientais a produtores que, embora tenham direito legal de fazê-lo, decidirem não desmatar áreas de reserva excedentes aos limites impostos à lei.

Estudo da Abiove que mapeou mais de 25 mil propriedades na Amazônia aponta que mais de 3 mil delas podem ampliar legalmente sua área de produção. No Cerrado, há mais de 4 milhões de hectares de reservas excedentes.