O termo “hedge” é muito utilizado no mercado financeiro, mas operações desse gênero não são fáceis de entender para o público em geral. Mas foi ele que garantiu, segundo o próprio setor, o vigoroso crescimento de 21,6% do agronegócio brasileiro no primeiro trimestre de 2023, comparando ao quarto trimestre de 2022.
A variação é a maior para o setor desde 1996 e praticamente garantiu, sozinha, o desempenho positivo de 1,9% para toda a economia brasileira, segundo dados do Produto Interno Bruto divulgados nesta quinta-feira, 1 de maio, pelo IBGE.
O hedge corresponde, em tradução livre, a proteção. Segundo Francisco Matturro, vice-presidente da Associação Brasileira de Agronegócios (Abag), este instrumento adotado por grandes e médios produtores para se proteger da queda de preços vista neste início de 2023 foi decisivo para o resultado.
“Os produtores costumam travar os preços antes da venda efetiva do produto, e neste primeiro trimestre, por conta desta antecipação, o valor conseguido foi maior que os preços praticados pelo mercado a vista, que estão em baixa”, explica Matturro.
Com a proteção de preços, muitos produtores rurais conseguiram “prolongar”, pelo menos por um período um pouco maior, o cenário positivo vivido nos últimos anos, em que as commodities agrícolas foram comercializadas a preços bastante positivos.
Assim, o resultado do PIB contrasta com a realidade do campo nas últimas semanas. Com previsões de supersafras de grãos (soja e milho) tanto no Brasil como nos Estados Unidos e estoques globais elevados, as cotações caíram e geraram apreensão no setor, com adiamento de vendas de safra e de encomendas de insumos e máquinas.
Matturro mantém, no entanto, o otimismo. Para o restante do ano, ele acredita que a tendência de bons desempenhos do agronegócio deve continuar.
“Precisamos esperar a colheita da safra nos Estados Unidos, para saber se os preços vão continuar baixos. De qualquer forma, já temos uma diminuição nos preços dos insumos, o que garante uma boa margem nos preços”.
O resultado excepcional levou economistas de bancos e do mercado financeiro a, mais uma vez, ressaltarem a relevância do Agronegócio para o resultado da economia brasileira no começo de 2023.
Felipe Kotinda, economista do Santander, estima que o PIB brasileiro cresceria apenas 0,3% se o agro fosse retirado da conta.
“O setor conseguiu quebrar a sequência de três trimestres seguidos com piora no desempenho. Os fortes volumes nas safras de verão puxaram o resultado”, diz Kotinda.
Para Rodolfo Margato, economista da XP, a soja foi o grande destaque do PIB do Agronegócio. “As projeções da Conab e do IBGE tratam de um crescimento de 25% na safra da soja em grão. Os outros grãos também tiveram uma performance robusta, com crescimento médio de 15% nesta safra”, afirma o economista.
Margato destaca o ganho de produtividade nas propriedades rurais. “O agro no Brasil mostra aumento de produtividade consistente já há duas décadas. Tivemos também condições climáticas favoráveis na maior parte do país, mesmo com a quebra de safra no Sul”.
Em comentário sobre o resultado, o consultor Octaciano Neto, da Suno Investimentos, destaca que o resultado do primeiro trimestre não foi surpresa para quem acompanha de perto o setor.
“Com muito empreendedorismo e desenvolvimento tecnológico de sementes, mudas, herbicidas, fertilizantes, herbicidas, irrigação, produtos, máquinas e equipamentos, o agro se tornou o setor com mais vantagens competitivas do Brasil”, diz Neto.
Além da contribuição para o crescimento, o desempenho do agronegócio ajuda também no controle de preços, como destaca o economista-chefe do Banco Fibra, Marco Maciel.
“É realmente um resultado espetacular para o crescimento econômico e que vai na direção da desinflação de alimentos no domicílio ao longo do ano, principalmente durante o segundo semestre”, afirma Maciel em relatório.
A XP espera que o ritmo de crescimento diminua nos próximos trimestre, por conta do ciclo da soja, principalmente. “Mais de 60% da safra de soja é contabilizada entre janeiro e março. Mas de qualquer forma, em termos anuais, projetamos um crescimento do PIB agro superior a 10%”, diz Margato.