As emissões de gases de efeito estufa das cadeias pecuárias têm sido o principal argumento para sustentar investimentos (muitas vezes bem generosos) em startups que se propõem a produzir a chamada carne de laboratório.

Um novo estudo realizado por pesquisadores da Universidade da Califórnia em Davis (UC Davis), nos Estados Unidos, pode agora colocar por terra essa tese e complicar ainda mais um segmento que vem enfrentando dificuldades em entregar o que prometeu aos investidores.

Ao analisar o cliclo de vida de todo o processo de produção e comercialização da indústria de carne cultivada a partir de células dos próprios animais, os cientistas concluíram que seu impacto ao meio ambiente é potencialmente maior do que os da pecuária tradicional. E não é pouco: para se obter um bife produzido dessa forma pode emitir entre e 4 e 25 vezes mais CO2, dependendo do processo utilizado.

Publicado na edição de maio da revista de divulgação científica IFL Science, o trabalho traz uma ressalva: ainda não foi avaliado pelo restante da comunidade científica, como é de praxe nesses casos. De qualquer forma, repercutiu na comunidade de investidores e startups, a começar pela própria Califórnia, principal polo de inovação do mundo.

Esse é o primeiro estudo do gênero que coloca as carnes alternativas em situação de desvantagem ambiental em relação aos processos pecuários. Ele contrasta com análises anteriores sobre a produção de carnes baseadas em células animais, que indicavam emissões menores.

Os pesquisadores da UC Davis explicam a contradição com a metodologia aplicada. Segundo eles, os trabalhos anteriores não representam com precisão o impacto ambiental das tecnologias atuais usadas nos conjuntos de suposições para previsões nos modelos tecnoeconômicos.

Eles alegam, particularmente, que as emissões de uma fase importante do processo – a purificação do meio de crescimento das células – não foram devidamente contabilizadas em estudos anteriores. De acordo com os pesquisadores da UC Davis, aqueles estudos apresentaram “altos níveis de incerteza em seus resultados e falta de consideração” para o que eles acreditam ser a remoção de endotoxina necessária para o meio de crescimento.

E sugerem que, antes de acelerar a comercialização de seus produtos, a indústria de carne cultivada se concentre em resolver, tecnologicamente, essas questões, buscando soluções alternativas não apenas para a carne, mas para os próprios insumos que utiliza.

“Talvez o foco no avanço desses avanços científicos pré-competitivos possa levar a um resultado melhor para todos”, escrevem eles.

Embora ainda falte a revisão do artigo pelos pares, a repercussão também se dá pela qualificação dos autores, cujos currículos indicam que dificilmente colocariam seu nome em um estudo que pudesse ser colocado sob suspeita.

O trabalho coloca mais um tempero indesejado pelos investidores no mercado de carnes alternativas. O desempenho de vendas, combinado com o aumento do custo do capital, já havia promovido demissões em massa e corte de despesas em algumas das empresas mais conhecidas do setor, como Impossible Foods e Beyond Meat, que produzem canes a base de plantas.