JPN FIV Eva e Srtela FIV. Olhando fora de contexto, parecem códigos de empresa do mercado de ações ou nomes de fundo de investimento. Na Expozebu, maior evento da pecuária nacional, que acontece esta semana em Uberaba (MG), onde fica a sede da ABCZ (Associação Brasileira dos Criadores de Zebu), é nome de estrela.

Vacas da raça Nelore, Strela e Eva (para simplificar) foram as donas das atenções de criadores e investidores no leilão Elo da Raça, realizado no último domingo na tradicional Fazenda Mata Velha, do empresário Jonas Barcellos.

Não deixam de ser, também, valiosos ativos financeiros. Pelo menos na visão de investidores que ofereceram por elas (ou participações na sua propriedade) os maiores valores registrados até o momento nos eventos relacionados à Expozebu.

Quando o martelo bateu, ambas passaram a ser valoradas acima dos R$ 5 milhões cada, refletindo o vigor do mercado da pecuária de alta genética, que comercializa animais diferenciados, destinados ao melhoramento genético do rebanho como um todo.

Cercado de luxo e com rendimentos difíceis de encontrar em outras atividades, os leilões do chamado gado de elite mantêm a tradição de atrair nomes conhecidos do mundo corporativo para investir na pecuária.

Os leilões de animais são conhecidos como grandes shows de venda da pecuária e atingiram R$ 600 milhões de faturamento em 2022.

A cada ano, novos nomes despontam como grandes compradores, retroalimentando os negócios e gerando retorno – que em casos de animais excepcionais, como Strela e Eva, podem chegar a mais de 50% em um ano – para quem está na atividade há mais tempo.

O negócio que envolveu a vaca Eva é bem representativo desse mercado. O lote arrematado no leilão deste ano representava os direitos por 50% do animal.

O comprador foi Ney Pereira, dono da Agropecuária Napemo, nome que desponta como força emergente no mundo dos leilões. Sócio da Click Telecom, empresa de telecomunicações com sede em Araxá (MG) e atuação em todo o Triângulo Mineiro e no Alto Parnaíba.

Ele desembolsou R$ 2,5 milhões por 50% de Eva. Em 2022, já havia sido destaque do mercado ao arrematar, por um total próximo a R$ 4 milhões, dois lotes de 25% da vaca Viatina-19 FIV Mara Moveis, numa transação recorde que levou o animal ao valor de mercado de R$ 7,98 milhões.

As duas vacas têm uma mesma origem: a Casa Branca Agropastoril, da família do empresário Paulo de Castro Marques, sócio da Biolab, uma das principais indústrias farmacêuticas do País.

Destaque no lado vendedor nos últimos anos, a Casa Branca Agropastoril não é exatamente novata na pecuária. Durante anos Marques investiu em raças como Angus, Brahman e Simental, mas só recentemente ingressou no pelotão de elite da raça Nelore.

Em apenas três anos, adquiriu plantéis fechados de genética e, hoje, é considerada número um em pista de julgamentos dessa raça. A estreia nos leilões se deu em grande estilo em 2022, sob o comando da filha de Paulo, Fabiana Marques Borrelli, no tradicional Elo de Raça, um ícone do glamour e considerado o grande termômetro do mercado, já que abre a Expozebu.

Ney Pereira, da Agropecuária Napemo

Para Pereira, a aquisição de Viatina mostrou-se um bom negócio. Nos primeiros 11 meses após a compra, foram vendidas 11 prenhezes da vaca, o que totalizou uma receita ao empresário de R$ 4,089 milhões, sem sequer pensar em vender o animal.

Na edição 2023 do Mata Velha, aspirações (procedimentos para coleta de embriões) de Viatina-19 foram comercializadas por R$ 1,2 milhão cada.

A venda de Strela segue roteiro semelhante. Também parte do plantel da Casa Branca, teve 50% de seus direitos adquiridos pela Agropecuária Nelore Paranã, de Jaciara (GO).

Entre os sócios da empresa está Aguinaldo Gomes Ramos Filho, presidente da J&F Investimentos, também nome em alta na nova safra da pecuária de alta genética.

A Nelore Paranã esteve entre as organizadoras do leilão recorde de movimentação financeira no ano passado, com faturamento de R$ 39,8 milhões.

O Primeiro Leilão Fazenda Terra Prometida foi chamado de "Rock in Rio" do Nelore, pelo tamanho da estrutura de show que foi montada para o evento.

Foi realizado em Palmas, no estado de Tocantins, na fazenda da dupla sertaneja Henrique e Juliano. Na pecuária, atuam com a marca HEJ, outra emergente do mercado de leilões

O segundo leilão com maior faturamento foi o PSJ Trancoso, também organizado por novatos na área: os empresários Leonardo e Karina Santana, da Pecuária São Jorge, do Pará.

Em 2020, eles compraram a vaca Íris 8 FIV da Valônia, que era do criador João Aguiar Alvarez, um dos herdeiros do Bradesco, falecido em 2021.

O preço pago pelo animal foi de R$ 3,18 milhões. Eles “trabalharam” dois anos com a vaca e venderam um embrião na Bolívia por US$ 120 mil.

No ano passado, no evento realizado em Trancoso, na Bahia, venderam metade do animal por R$ 4,8 milhões. Assim, segundo os assessores pecuários, a vaca se tornou o animal mais valorizado de todos os tempos da pecuária brasileira, valendo hoje R$ 9,6 milhões.

Mercado em expansão

O sucesso desses leilões mostra, além de novos rostos, uma tendência do eixo dos grandes negócios na pecuária de elite, que sempre esteve em Uberaba.

Foi lá que no início dos anos 2000 dominavam os leilões nomes frequentes como Jonas Barcellos, (Grupo Brasif), Pedro Novis (Odebrecht), Mário Mesquita Serva (Unimar), Pedro Grendene e João Carlos Di Gênio (Unip-Objetivo).

Anteriormente, a essência deste tipo de negociação era presencial, com relacionamento direto com o público. Acreditava-se que o mercado de elite da genética da raça Nelore só poderia alcançar altos valores por meio de vendas frente a frente com a clientela.

A transmissão dos leilões pela televisão em canais especializados por assinatura ou parabólica, mudou o cenário e atraiu investimentos, fazendo com que o público urbano passasse a olhar com mais atenção para o campo.

O modelo virtual segurou os negócios durante a pandemia, em que os encontros presenciais foram suspensos. A retomada, no entanto, mostrou que o apetite pelos leilões ao vivo continua alto.

O faturamento com leilões cresceu 15% em 2022 na comparação com o ano anterior, estima Heitor Pinheiro Machado, um dos sócios da SAP - Sucesso Assessoria Pecuária.

Heitor tem 23 anos de atuação na pecuária e é neto de Antônio Carlos Pinheiro Machado, um dos pioneiros na expansão dos leilões pelo Brasil.

Ademir Jovanini, proprietário da Premier Assessoria em Pecuária, que promoveu 73 leilões em 2022, afirma ter tido um crescimento de 21% em relação ao anterior. Ele considera que, mesmo com a pandemia, 2020, 2021 e 2022 foram os melhores anos vividos pela pecuária seletiva.

"Quebramos todos os recordes, os paradigmas, tivemos o melhor leilão da história, com vacas mais valorizadas e quatro quebras de recorde em 2022”, ressalta o empresário.

Diretor-presidente da maior leiloeira do país, a Programa Leilões, Paulo Horto afirma que não existe mais aquele protagonismo na pecuária de elite, pois o mercado está cada vez mais pulverizado.

Segundo ele, no último trimestre de 2022, o ciclo da pecuária enfrentou desafios com preocupações sanitárias e turbulências políticas, o que impactou de forma menos favorável.

Este ano, houve uma pausa na entressafra dos leilões nos meses de janeiro e fevereiro, mas os negócios realizados a partir de março serviram como parâmetro para retomar o otimismo do setor para 2023.

"Decolamos bem e percebemos que a ferramenta genética é o que vai levar o Brasil, em um prazo que considero de cinco anos, a ser o maior produtor de carne vermelha do mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos", afirma Horto.