O quadrilátero delimitado pelas avenidas Faria Lima, Rebouças, Paulista e Juscelino Kubitscheck, no coração financeiro de São Paulo, concentra boa parte do PIB financeiro do País.

Próximos dos bancos de investimento e das sedes de multinacionais estão também nomes de peso da pecuária nacional. Levantamento feito pelo Grupo DSM e obtido com exclusividade pelo AgFeed, multinacional de origem holandesa com forte atuação no segmento de nutrição animal, aponta que nessa região se concentra o poder de decisão sobre propriedades rurais responsáveis por pelo menos 3 milhões de cabeças de gado.

“O boi fisicamente não está aqui, mas temos muitos produtores e grandes projetos pecuários de vários estados brasileiros onde o centro da tomada de decisão está na capital paulista”, disse o diretor de marketing da DSM, Juliano Sabella, que busca atuar como um interlocutor entre o campo e a cidade.

A conta inclui rebanhos de pecuaristas tradicionais, como Jovelino Mineiro, Carlos Viacava e Luiz Carlos Marino, que mantêm suas bases de negócio na capital, empresas com foco na chamada pecuária comercial e operações de indústrias como JBS, Minerva Foods, Marfrig e Frialto, que além das plantas de processamento também gerenciam confinamentos em várias regiões do país.

Esse rebanho se mantém em crescimento há alguns anos, sobretudo com o avanço dos confinamentos, que seguem uma lógica mais financeira e industrial se comparados com a tradicional pecuária a pasto.

“Na minha concepção a pecuária é feita pelo criador e a terminação em confinamento é uma pré-indústria, um segmento mais preocupado com escala, que acessa mercado financeiro, usa mecanismos de crédito", explica o pecuarista Francisco Camacho, um dos maiores fornecedores de proteína animal do Brasil.

De seu escritório na região da Faria Lima, Camacho dirige a LFPec, que administra quatro confinamentos - localizados nos estados da Bahia, Mato Grosso, São Paulo e Pará - e a terminação de 100 mil cabeças por ano.

Mas nem sempre foi assim: neto de fazendeiro, ele primeiro buscou a tranquilidade do campo para tocar suas propriedades de cria e recria. Há pouco mais de dez anos, ao decidir investir em confinamentos, entendeu que precisava fazer o caminho de volta para a capital paulista.

“O pecuarista ‘Faria Lima’ tem conhecimento maior de ferramentas financeiras, tanto para buscar capital, financiamentos, quanto para emitir títulos de dívidas junto à bolsa e a investidores”, define a analista da Agrifatto, Lygia Pimentel.

Com base administrativa e financeira no bairro dos Jardins, a meio caminho entre a Faria Lima, José Roberto Ribas, vice-presidente da Associação Nacional de Pecuária Intensiva, conhecida como Assocon, e proprietário de um “boitel” em Lins, no interior de São Paulo, onde só este ano deve operar 12 mil cabeças, confirma esse perfil.

“O ticket médio deve ser de 300 cabeças por pecuarista, então vamos operar a terminação de cerca de 50 fazendas este ano”, explica Ribas sobre seu negócio, que consiste em receber animais vindos de outras propriedades para a engorda em seu confinamento e, posteriormente, venda aos frigoríficos.

“Trata-se de uma operação muito diferente de uma fazenda, pois exige gestão, processos e controles semelhantes ao de uma indústria”.

O segmento de atuação dos dois empresários segue uma tendência já consolidada em outros países, na qual a terminação do rebanho se dá de forma intensiva.

“Nos Estados Unidos, 99% da engorda do rebanho acontece em confinamentos e, aqui no Brasil, estamos chegando a 40% do rebanho", estima Camacho.

Diversificação de ativos

Nem são apenas os grandes pecuaristas que engordam os ‘bois Faria Limers’. Eles dividem espaço com investidores que vêm na pecuária um campo para diversificação de ativos.

A FinPec, agtech fundada em 2018, tem contribuído para aumentar o número de cabeças no centro financeiro de São Paulo fazendo operações de arbitragem entre grandes confinadores e investidores, entre eles bancos e até pessoas físicas.

“Cerca de 32% dos nossos investidores estão na capital paulista”, afirma Fernando Sartori, CEO da FinPec. “O ticket varia muito, vai de R$ 10 milhões até R$ 500,00”.

Segundo Sartori, desde a sua fundação a empresa já movimentou cerca de R$ 800 milhões, o equivalente a 160 mil cabeças, intermediando a venda para mais de 600 pecuaristas.

A boa imagem do agronegócio é o grande estímulo desta aproximação da Faria Lima com a pecuária. Segundo a analista de mercado Lygia Pimentel, o bom desempenho do Agro em 2020 e 2021 fez o mercado financeiro ver o setor com mais segurança e o pecuarista, por outro lado, cada vez mais precisa ter acesso aos mecanismos financeiros para travar preço e ter acesso a crédito.

“Em 2015, apenas 3% dos pecuaristas usavam algum tipo de ferramenta financeira para comercializar o rebanho - mercado a termo, mercado de opções ou mercado futuro -, e hoje esse número subiu para 6,5% dos produtores”, calcula a analista.

Para empresas como a DSM, cuja sede também fica na região, essa proximidade ajuda a fazer negócios, embora não substitua o trabalho de seus profissionais que percorrem todo o País.

“Trazemos as informações coletadas pela equipe de vendas nas fazendas e abastecemos os escritórios em São Paulo, porque nem sempre o decisor tem tempo de visitar todas as propriedades”, explica Sabella. “Assim prestamos um atendimento personalizado”.