O roteiro foi um pouco diferente do que se esperava para o desfecho da novela da conquista da BRF pelo bilionário Marcos Molina, controlador do grupo Marfrig.

A assembleia que selou a nova emissão de ações da empresa, nesta quinta-feira 13, terminou com uma bem sucedida injeção de R$ 5,4 bilhões no caixa da dona das marcas Sadia e Perdigão, mas com algumas perguntas ainda no ar sobre o seu futuro.

Tinha-se como certo de que a Marfrig, de Molina, e o fundo saudita Salic seriam responsáveis pela maior injeção de capital, fazendo cheques bilionários. Isso aconteceu, mas as cifras foram menores do que as anunciadas na assembleia anterior, quando foi aprovada a proposta da emissão.

Mas, ao invés de 250 milhões de novas ações, como havia previsto, a Marfrig subscreveu pouco mais de 200,3 milhões de ações, algo em torno de R$ 1,8 bilhão. Já o Salic, convidado de Molina para essa festa e que prometia entrar com a mesma fatia, subscreveu 180 milhões de papéis.

Caso cumprissem o anunciado, os dois parceiros mudariam de forma relevante a estrutura acionária da companhia. Molina, por exemplo, poderia passar da posição de 33,27% para algo em torno de 38% do total das ações.

Somado a isso, a expectativa era de que o Salic passasse a deter 15% da BRF. Com isso, eles teriam juntos mais de 50% de toda BRF, formando um bloco de controle.

No fim, o que se viu foi Molina mantendo sua participação de 33,27% e o fundo subscrevendo menos ações que o esperado, passando a ter 10% da BRF. Na prática, ao invés do bloco composto por Molina e os sauditas ter 53% da BRF, como era esperado, os dois acionistas passarão a controlar 43%.

A expectativa de tomar o bloco de controle era tão forte que em uma assembleia no início do mês, os acionistas da empresa retiraram a necessidade de acionar a chamada poison pill do processo.

Essa cláusula faz com que, se alguém ultrapassar os 33,33% de uma empresa, tem de propor a compra da participação dos demais acionistas. A extinção deste artigo do follow-on fez o mercado acreditar que a Marfrig iria ultrapassar o percentual e tomar controle, de fato, da BRF.

O ponto é que, se, além dos sauditas, Molina tiver algum terceiro player na jogada, pode ter conseguido um controle prático da companhia tendo gasto menos que o planejado, já que, para a Marfrig atingir os 38%, teria que desembolsar R$ 2,25 bilhões, bem acima dos R$ 1,8 bilhão gastos para manter a posição.

Antes da entrada do Salic na BRF e do follow-on em si, uma gestora que possui participação na empresa conversou com o AgFeed e afirmou que via com bons olhos a injeção de capital.

Além disso, se mostrou alinhado com os comandos da Marfrig na BRF ao avaliar que a entrada de Miguel Gularte como CEO em agosto do ano passado, que veio da primeira para a segunda, “melhorou bastante a operação”.

Até quarta-feira, antes da assembleia, os maiores acionistas depois da Marfrig eram a Previ, com 6,2% dos papéis, a BlackRock, com 5,8% e a gestora Kapitalo, com 5,14%.

A BlackRock, inclusive, aumentou sua participação para esse patamar, que é equivalente a algo em torno de 54 milhões de ações, em julho deste ano, pouco antes do follow-on.

Agora, Molina e sua empresa possuem influência sobre o CEO da BRF, indicado por ele, e um bloco de apoio de 43% dos acionistas.

No follow-on, a dona da Sadia e da Perdigão levantou R$ 5,4 bilhões com a emissão de 600 milhões de papéis cotados a R$ 9, um valor 5,7% menor que o visto no fechamento de quinta na B3.

Essa quantidade de papéis emitidos inclui as 500 milhões de novas ações que já estavam acordadas e que trariam algo em torno de R$ 4,5 bilhões, e mais as 100 milhões do lote adicional.

Segundo a BRF, essas novas ações entrarão no mercado no dia 17, a próxima segunda-feira. Só então a BRF irá divulgar o novo quadro acionário.

Mercado animado

Independentemente de quem estará ao lado de Molina, o follow-on já era visto como um sucesso e comemorado pelo mercado mesmo antes de acontecer.

O primeiro motivo a animar analistas é que a injeção desse capital pode diminuir a dívida da empresa, o que ajuda a desafogar o operacional do frigorífico.

Nos cálculos da XP, nesse cenário de R$ 5,4 bilhões injetados, a BRF terá uma queda de 36% na sua dívida líquida, passando dos R$ 15 bilhões ao final de março para R$ 9,6 bilhões.

O analista João Abdouni, da Levante Investimentos, diz ter gostado do follow-on, e acredita que a alavancagem, a relação entre a dívida líquida da companhia e o lucro operacional medido pelo Ebitda, do frigorífico deve abaixar.

Segundo uma simulação da XP, o nível de alavancagem da BRF pode recuar do patamar atual de 3,4 vezes para 2,1 vezes, no melhor cenário.

Abdouni ressaltou que essa possível alavancagem vista pela XP pode trazer o indicador abaixo dos pares setoriais, que na sua visão, estão bastante alavancados.

A JBS, por exemplo, tem uma alavancagem de 3 vezes, enquanto a Marfrig tem 3,15 vezes e o Minerva possui 2,8 vezes.

Outro ponto importante do follow-on é a entrada do fundo saudita na empresa, que pode ajudar a destravar negociações da BRF com o mercado árabe, que já é um dos principais destinos das exportações brasileiras de carne de frango.

O Salic, vale dizer, é o maior acionista de outro frigorífico brasileiro, o Minerva, com quase 31% das ações.