O Brasil conheceu nesta semana o nome escolhido pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva para ser o presidente da 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (COP30), que será realizada em Belém, capital do Pará, em novembro deste ano.

Trata-se do diplomata André Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio ambiente do Ministério das Relações Exteriores. Além de Lago, o governo também definiu o nome da Ana Toni, secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente para o cargo de diretoria-executiva da conferência.

Embaixador desde 1983, tendo chefiado já a representação do Brasil em países como Butão, Índia e Japão, Lago é um nome conhecido no campo das discussões climáticas. Ele ocupou o posto de negociador-chefe do País para mudança do clima (2011-2013) e para a Rio+20 (2011-2012).

A escolha agradou ambientalistas, empresários, terceiro setor e também nomes representativos do agronegócio.

“Eu acho que a indicação foi muito boa, positiva. Era quem a gente esperava mesmo, é um cara competente”, afirmou Pedro de Camargo Neto, ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira, uma das principais entidades representativas de produtores rurais no País, ao AgFeed.

“O André é um craque, é um diplomata que consegue circular, mas mais do que isso, consegue conversar e possui um incrível dom de saber ouvir os diferentes setores, em diferentes situações”, disse Marcello Brito, coordenador técnico do Centro Global Agroambiental e da Academia Global do Agronegócio da Fundação Dom Cabral (FDC).

Em novembro, Brito foi indicado para a cargo de “high level champion” do Brasil na COP30 em carta enviada ao presidente Lula por uma série de lideranças da sociedade civil, entre elas, os ex-ministros Roberto Rodrigues, Luiz Fernando Furlan e Izabella Teixeira, o CEO global da JBS, Gilberto Tomazoni, e o CEO da Verde Asset, Luis Stuhlberger.

O cargo de high level champion é um dos postos mais importantes na estrutura das COPs ao lado do presidente e do secretário-executivo. O governo ainda não respondeu se aceita a indicação de Brito para esse cargo.

“A escolha do embaixador André Corrêa do Lago para presidir a COP merece ser comemorada, porque, além de toda sua competência, experiência e conduta equilibrada, é um diplomata que conhece nossas qualidades e enaltece o Brasil”, disse a senadora Tereza Cristina (PP-MT), ministra da Agricultura durante o governo de Jair Bolsonaro.

Entidades representativas dos produtores rurais também se manifestaram. “A Sociedade Rural Brasileira, bem como toda a classe produtora rural, ficou muito satisfeita com a nomeação de André Corrêa do Lago e de Ana Toni”, disse o presidente da SRB, Sérgio Bortolozzo.

“[Corrêa do Lago é] um diplomata experiente, hábil e aberto ao diálogo, que vai contribuir para posicionar o nosso país como protagonista nesta agenda, reconhecer que o agronegócio é parte da solução para o combate às mudanças climáticas e implementar de forma efetiva as ações de mitigação”, afirmou o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Luiz Carlos Corrêa Carvalho.

Temas prioritários

Apesar dos elogios ao presidente da COP, ainda há muito por fazer. O Brasil precisa, por exemplo, definir com clareza as prioridades que levará à conferência.

Entre os temas mais relevantes, destacam-se questões cruciais para o agronegócio, como o combate ao desmatamento e a promoção da sustentabilidade na agricultura e nos sistemas alimentares – um tópico que também ganhou destaque na Cúpula de Líderes do G20, realizado no ano passado no País.

Marcello Brito afirma que não é possível ainda determinar com precisão quais serão os temas prioritários, mas acredita que a agricultura terá um papel central nas discussões, dado o imenso potencial dos recursos naturais do País.

“O Brasil está entre os cinco maiores produtores de alimentos, de minério e de energia renovável do mundo. São três fatos que devem estar no centro das nossas estratégias”, avalia.

Outro ponto importante é o tom que o Brasil vai dar às suas pautas, que nem sempre encontram consenso internacional.

“É necessário defender, por exemplo, a questão dos biocombustíveis, mesmo diante da resistência de alguns países. Alguns países da Europa acreditam que os biocombustíveis competem com a produção de alimentos pelo uso da terra, mas o Brasil já demonstrou que isso não é verdade”, argumenta Pedro de Camargo Neto.

Representantes do setor tem repetido que o agronegócio precisa ter um papel proativo, e não reativo.

“O setor precisa se adiantar aos formadores de opinião, ocupar espaços de debate para não deixar apenas um lado falando”, disse a presidente do Instituto Pensar Agropecuária (IPA), Tania Zanella, ao AgFeed na semana passada.

“Nós não temos que reagir a nada, nós somos proativos, nós somos a solução a uma questão. Nós não temos problema nenhum, o agro brasileiro é claramente uma solução”, afirma Pedro de Camargo Neto.

Diálogo necessário

Apesar da maioria das entidades seguir na mesma linha, há quem divirja da linha corrente.

É o caso, por exemplo, de um grupo de produtores da Amazônia, organizados na Associação dos Produtores Rurais Independentes da Amazônia (APRIA), que prometem a organização de um evento paralelo, batizado de “COP do Agro”, a ser realizado em outubro, em Marabá, também no Pará, um mês antes antes de a conferência da ONU acontecer.

A associação, liderada pelo advogado Vinicius Borba, defende que é necessário respeitar o agronegócio no bioma. “Engana-se quem acha que nós, produtores rurais da Amazônia, somos atrasados, isolados e criminosos. Respeite o agronegócio da Amazônia!”, diz um vídeo postado por Borba no Instagram.

No fim de 2024, Borba foi à Brasília e distribuiu convites a parlamentares da Câmara dos Deputados e do Senado, como o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Pedro Lupion (PP-PR), e o senador Zequinha Marinha (Podemos-PA).

Nessa semana, a Apria convidou publicamente até mesmo o novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para comparecer ao evento, em uma postagem em inglês em seu perfil no Instagram. "Você será bem-vindo, respeitado e terá a oportunidade de participar de discussões com pessoas genuinamente interessadas no crescimento do Brasil”, diz o texto.

Marcelo Brito avalia que os extremos – “uma turma que é contrária a tudo, a outra turma é do extremo ambientalismo”, diz ele – não devem estar em discussão.

“Não deveríamos perder tempo debatendo isso. O foco deve estar na grande oportunidade de discutir as estratégias para o Brasil e o caminho que o país deve seguir para ser o maior líder agrícola”, afirma.

Brito traz os resultados do G20 como um exemplo positivo. “Nós conseguimos, inclusive a estrutura de bioeconomia dentro do G20, algo que nunca existiu antes. Dentro dessa negociação, tinha a academia brasileira, a indústria, a agricultura, que eu participei dos diálogos. Todos os setores participando disso, que resultou nessa construção importante”, afirma.

Por mais que questões internas brasileiras – como a dificuldade de rastreio de animais e problemas envolvendo o Cadastro Ambiental Rural – não estejam dentro de uma conferência sobre o clima, Brito considera que o momento é importante para entender como o País pode resolver seus próprios problemas.

“Nós temos que ser inteligentes de aproveitar esse momento em que os líderes políticos mundiais e os líderes da economia mundial estarão no Brasil para que a gente possa discutir a solução e o planejamento futuro dos assuntos internos”, afirma ele.

Para Pedro de Camargo Neto, porém, esse é um ponto de fraqueza. “Se você tiver as (questões) internas resolvidas, é daí que você vai para fora. Agora, se você não tiver com as internas resolvidas, você chega fragilizado fora”, afirma Neto, citando como exemplo de uma questão que não foi bem resolvida é a exploração de petróleo na Margem Equatorial brasileira, alvo de disputa entre o Ibama e a Petrobras.

Alguns representantes, porém, ainda aguardam novidades, especialmente no que diz respeito ao negociador brasileiro na COP.

“A posição do Brasil ainda não está clara e quem é o negociador brasileiro também não está claro. Ele precisa ter uma posição forte, bem clara para poder ser defendida e, certamente, o embaixador André vai ajudar”, diz Pedro de Camargo Neto.

Sérgio Bortolozzo, presidente da SRB, tem posição semelhante. “Tenho a impressão que essa equipe vai ser bem definida, só que o Brasil não pode perder a oportunidade de negociar, aqui em nosso território, alguns termos e alguns acordos que tragam benefícios ao agro brasileiro e ao Brasil como um todo”, afirmou.

JBS

Enquanto a COP ainda está relativamente longe no calendário, representantes de governos e do setor privado participam de eventos paralelos ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, que acontece ao longo dessa semana.

Em um painel denominado De Davos a Belém: Definindo o caminho do Brasil para uma indústria de gado sustentável e de baixo carbono, com a presença do governador do Pará, Helder Barbalho, a JBS anunciou a doação de 3 milhões de tags para o rastreamento do rebanho bovino paraense.

Dos 3 milhões de brincos, 2 milhões serão direcionados apenas aos pequenos produtores do estado, atendendo a metade da demanda estimada para 2025 nesse grupo, segundo a JBS – sendo que 1 milhão serão doados pela ONG The Nature Conservancy e o restante diretamente pela empresa da família Batista.

Ao todo, o Pará tem 24,84 milhões de cabeças, distribuídas por quase 166 mil propriedades e estabeleceu como meta, anunciada durante a COP29, de Dubai, no fim de 2023, o rastreio individual de todas as suas cabeças de gado até o fim de 2026.

Em setembro do ano passado, foi identificado o primeiro animal, que recebeu dois brincos. A ideia é saber com precisão em qual fazenda o animal nasceu e por quais outras passou.