Como esperado, o agronegócio brasileiro deve surfar positivamente na guerra comercial iniciada pelo presidente norte-americano Donald Trump e respondida por Canadá, China e México.

Como único grande fornecedor de várias commodities, o Brasil pode escoar excedentes por preços remuneradores para esses mercados, após as altas nas tarifas para soja, milho e algodão, por exemplo.

Mas a nova e conturbada política externa norte-americana pode transformar a atual onda favorável em um tsunami contra o País no futuro, avaliou Rodrigo Lima, sócio-diretor da Agroicone, em entrevista ao AgFeed.

Exemplo recorrente, a exportação brasileira de soja e algodão para a China deve ganhar competitividade e crescer com a taxação do país oriental sobre as duas commodities oriundas dos Estados Unidos.

“Momentaneamente, a China pode buscar aqui uma alternativa para suprir a oferta norte-americana mais cara”, disse Lima. “Mas é um surfe de curtíssimo prazo para o Brasil”.

Ao longo desta quarta-feira, o efeito prático da tarifa chinesa aos grãos norte-americanos, por exemplo, foi uma alta volatilidade na Bolsa de Chicago, preços da soja mudaram de direção mais de uma vez, mas acabaram fechando com alta de mais de 1%.

No Brasil, como esperado, os prêmios da soja nos portos subiram mais de 50 centavos de dólar por bushell em alguns vencimentos, sinalizando uma expectativa do mercado de que poderá haver mais demanda por parte dos chineses.

Porém, outros fatores como a taxa de câmbio, que também é fortemente influenciada por cada passo de Trump, pode acabar tirando a “vantagem” do produtor brasileiro. Analistas já consideram que o efeito no mercado da soja, nesta segunda gestão Trump, pode ser diferente do que foi visto em 2018.

O sócio-diretor da Agroicone alerta que a primeira rachadura no pilar comercial entre Brasil e Estados Unidos pode vir do etanol. Para entrar no mercado norte-americano, o biocombustível é taxado em 2,5%, enquanto a tarifa para importação do etanol que vem de lá, para o Brasil, é de 18%.

“Os Estados Unidos podem aplicar quando quiserem o princípio da reciprocidade e elevar a tarifa do etanol brasileiro, o que seria até razoável”, afirmou Lima.

Segundo ele, medidas piores podem ocorrer no futuro e o caminho para um tsunami comercial contra outros países, inclusive o Brasil, já começou a ser trilhado.

O primeiro passo foi a abertura da investigação sobre a importação de madeira e subprodutos com o argumento que o comércio fere a segurança nacional dos Estados Unidos.

“Isso poderia significar um aumento de tarifa para importações de eucalipto e pinus brasileiro, por exemplo. Ou ainda um bloqueio total e adotar medidas não tarifárias usando argumentos de que o Brasil desmata”, afirmou Lima.

COP da Biodiversidade

Presente na Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP 16.2), na semana passada, em Roma, o sócio-diretor da Agroicone destacou a aprovação das metas anuais de financiamento para o setor e da participação cada vez maior dos bancos multilaterais de fomento.

Na reunião realizada na sede da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), os países concordaram com a meta de destinar US$ 200 bilhões por ano até 2030 para o financiamento à biodiversidade. Desse total, países desenvolvidos e em desenvolvimento colaborarão com US$ 20 bilhões até 2025 e US$ 30 bilhões anuais de 2025 a 2030.

O acordo foi assinado pelos 196 países membros do acordo da biodiversidade. Os Estados Unidos e a Santa Sé, representada pelo Vaticano, não integram o grupo.

Segundo Lima, a aprovação das metas é importante no momento conturbado em relação ao meio ambiente, com a regressão e as ações contrárias dos Estados Unidos nas negociações globais, e ainda sinaliza que os bancos de fomento serão os principais agentes econômicos para o suporte.

“Os bancos multilaterais como exemplo de suporte e sinalizando para onde o financiamento andará é interessante em um momento conturbado como o atual e consolida essa fotografia também para as negociações do financiamento para o clima”, concluiu.