A expectativa de dobrar as exportações de carne bovina aos Estados Unidos em 2025 foi congelada temporariamente.

Após o anúncio da tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros pelo presidente Donald Trump, as indústrias de carne brasileira pausaram a produção e o processamento dos cortes destinados ao mercado norte-americano e já buscam alternativas para escoar o produto a outros mercados.

“As indústrias brasileiras pausaram, temporariamente, a produção de carne destinadas aos Estados Unidos e estão fazendo um rearranjo para buscar destino para países onde já exportamos”, afirmou o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Roberto Perosa, em conversa com jornalistas correspondentes estrangeiros na manhã desta sexta-feira, 11 de julho.

Das 3 milhões de toneladas exportadas pelo setor no ano passado, 220 mil toneladas foram para os Estados Unidos. Mas o ciclo pecuário de baixa oferta interna naquele mercado, com o alto abate de fêmeas, impulsionou as vendas brasileiras em 2025.

Segundo a Abiec, as exportações aos Estados Unidos entre janeiro e junho de 2025 movimentaram US$ 1,04 bilhão, com volume de 181.477 toneladas e preço médio de US$ 5.732 por tonelada. Em relação ao primeiro semestre de 2024, quando foram exportadas 85.365 toneladas, com receita de US$ 514,9 milhões, o faturamento cresceu 102% e o volume, 112,6%. 

A participação dos norte-americanos nas exportações totais de carne bovina brasileira saiu de 6,58% para 12,33%. “Seria um ano em que dobraríamos as exportações, face à necessidade deles, mas é óbvio que contratos serão revistos, porque com essa tarifação é inviável economicamente enviar carnes aos Estados Unidos”, completou o executivo.

Segundo Perosa, o cenário é de incerteza inclusive sobre pedidos já feitos e até para carnes em contêineres que estão em navios a caminho do Estados Unidos. “Não queremos ficar sendo alvo de disputas políticas que vão prejudicar a população brasileira e os Estados Unidos”, completou.

Ele repetiu que o mercado norte-americano tem uma demanda específica por cortes dianteiros de bovinos para a produção de hambúrgueres e que um reescalonamento das exportações, caso a tarifa seja aplicada, teria como alvo o mercado asiático.

“Lembrando que o primeiro grande mercado da indústria brasileira de carne é o próprio Brasil, que consome 70% e que não consome os 30% restantes que são exportados. Entre eles, estão os cortes dianteiros, que seguem para os Estados Unidos, e os miúdos, para a Ásia”, explicou.

“O Brasil não tem demanda para essa oferta e precisaremos achar outros mercados”, completou.

De acordo com o presidente da Abiec, apesar de a União Europeia ser um grande mercado consumidor da carne bovina, os focos principais para o escoamento da possível oferta não enviada aos Estados Unidos são Ásia, Sudoeste Asiático e Oriente Médio, além de possíveis novos países cujos mercados estão se abrindo ao Brasil.

“A demanda é maior na Ásia e acredito que teremos de redirecionar. Houve a abertura do Vietnã, há uma negociação intensa para mercado japonês, que poderia ser rota alternativa, e existem negociações com Turquia e Coreia do Sul”, explicou.

Coincidentemente, Perosa está nos Estados Unidos esta semana, inicialmente para negociar a ampliação do mercado com os importadores locais.

O executivo seguirá por lá ao menos até a próxima segunda-feira para ampliar as conversas com o setor privado local e tentar influenciar os importadores a pressionarem o governo norte-americano para reverter o tarifaço contra o Brasil.

“Não vim para tratar da tarifação, vim para um encontro com importadores, mas foi muito providencial. Falei com mais de dez empresas e a avaliação aqui é que a medida é danosa, sem fundamento técnico e econômico e foi basicamente política. O trabalho é fortalecer a relação de complementaridade da carne bovina brasileira, que ajuda a baratear a carne norte-americana”, concluiu.

Diálogo e sanções

No mesmo encontro, feito por videoconferência, o Secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Luis Rua, reforçou as críticas à medida anunciada pelo presidente Trump, defendeu o diálogo em torno de um consenso, mas garantiu que sanções serão tomadas na mesma linha dentro da política de reciprocidade caso não haja um acordo.

“Todos os esforços são para uma solução consensuada, mas o Brasil não aceitará medidas injustas. Não queremos, não buscamos, mas o Brasil não se furtará a tomar medidas, sejam nas questões comerciais, sejam em patentes, ou em propriedades intelectuais”, afirmou.

Para Rua, os Estados Unidos seguem como importante parceiro para o Brasil, com 7% do destino das exportações totais, mas a política de abertura de novos mercados e ampliação de outros segue como alternativa ao setor caso o comércio com os norte-americanos retraia.

“A diversificação de mercado é importante para a cadeia e vamos avançar na formalização dos acordos, como o entre o Mercosul e a União Europeia e o nosso com o México, sem esquecer de seguir trabalhando com esse importante parceiro comercial que são os Estados Unidos”, afirmou Rua, que voltou ontem do México, onde tratou da abertura de mercados.

Segundo o secretário, mesmo com a tarifa imposta politicamente, o Brasil tem conversado com os Estados Unidos desde janeiro quando Trump assumiu o segundo mandato. Mas, para ele, “nesse sentido o Brasil nunca foi tratado pelos americanos como prioridade nas negociações, mesmo com conversas em busca de um acordo para a liberalização comercial”, afirmou.

Rua lembrou que 19 mercados foram abertos para a carne bovina e que 393 aberturas e ampliações foram feitas para produtos agropecuários desde o começo do atual governo. Ele citou também os setores de suco de laranja e café, ainda mais sensíveis ao mercado norte-americano do que o de carnes bovinas e com os quais o governo intensificou as conversas após o anúncio de Trump.

“Para o suco de laranja, trabalhamos para ampliar o mercado da China, mas tem uma questão tarifária local. A China também pode ser um destino para o café, pois é um mercado que tem ampliado o consumo e tem várias parcerias com os exportadores brasileiros”.

Na conclusão, Rua disse que há espaço para conversar até o próximo dia 1º de agosto, quando está previsto o início da aplicação da tarifa de 50%. “Esperamos baixar a poeira, oportunidades de consenso, mas, se não houver consenso, o Brasil é soberano e tomará decisões”, concluiu.

Resumo

  • Após o anúncio da tarifa de 50% aos produtos brasileiros pelos EUA, indústrias brasileiras de carne suspenderam temporariamente a produção voltada ao mercado norte-americano
  • Segundo Roberto Perosa, presidente da Abiec, empresas buscam redirecionar os cortes para países da Ásia, Oriente Médio e Sudoeste Asiático
  • Demanda americana por cortes dianteiros bovinos dificulta sua absorção em outros destinos