No mundo do dinheiro de fomento, hoje já existe vida fora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a instituição sempre lembrada quando se pensa no fortalecimento da economia nacional.

Só que a força dos negócios não está na Avenida República do Chile, no Centro do Rio de Janeiro, onde fica o imponente edifício-sede do BNDES, e sim no interior do país.

Mais próximas de empresários e produtores rurais, bancos e agências de fomento regionais vêm se fortalecendo e deixando de ser um apêndice do BNDES para ganhar mais protagonismo nas economias locais.

Um desses casos é o do Banco de Desenvolvimento Regional do Extremo Sul (BRDE). Controlada pelos estados da região Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, a instituição vem se transformando cada vez mais em um pilar importante para o setor produtivo, cooperativas e agroindústrias locais, com presença em 96% dos municípios da região.

O agro é hoje o setor mais relevante dentro dos volumes de financiamento do BRDE, superando indústria, comércio e serviços. Em apenas dois anos, entre 2022 e 2024, o volume de financiamentos para o setor agropecuário cresceu quase R$ 1 bilhão.

No ano passado, do total de R$ 5,97 bilhões concedidos em financiamentos pelo BRDE ao longo de todo o ano passado, R$ 2,7 bilhões correspondem a transações envolvendo agronegócio, considerando financiamentos para o setor agropecuário em si, mas também agroindústrias e estruturas de armazenagem.

Quando se analisa o resultado apenas do setor agropecuário, a quantidade de financiamentos foi de R$ 1,934 bilhão. O montante é 16,5% mais alto em relação a 2023, quando os financiamentos específicos do setor haviam totalizado R$ 1,660 bilhão.

Além disso, em 2024, o agro passou a ser o setor que mais contratou financiamentos no BRDE, seguido pelo setor de comércio e serviços (R$ 1,92 bilhão) e indústria (R$ 1,406 bilhão).

O setor já havia superado a indústria em 2023, crescendo 52,3% em apenas um ano, passando de R$ 1,090 bilhão em 2022 para R$ 1,661 bilhão, enquanto que os financiamentos tomados pela indústria recuaram 10% no mesmo período, passando de R$ 1,359 bilhão em 2022 para R$ 1,220 bilhão em 2023.

Ao todo, considerando todos os setores, a carteira total do BRDE fechou o ano de 2024 em R$ 21,6 bilhões, crescimento de 2% em relação a 2023.

Para Ranolfo Vieira Júnior, presidente do BRDE e ex-governador do Rio Grande do Sul, a expansão do volume do agronegócio é natural. “A vocação do extremo sul do Brasil é muito semelhante entre os três estados. O agronegócio se faz muito presente na economia dos três estados da região Sul“, afirma.

A expectativa de Vieira Júnior é de que os números concedidos em 2025 sejam similares aos de 2024, com o banco fechando o ano com R$ 6 bilhões em financiamentos.

O presidente do BRDE atenta para possíveis desafios macroeconômicos a serem enfrentados ao longo do ano. “2024 foi um ano muito difícil, sem dúvida alguma, mas os desafios para 2025 são consideráveis”, afirma, listando três fatores de preocupação.

“O primeiro deles é uma questão presente para todo o sistema financeiro, a taxa Selic, que vem crescendo mês a mês. E isso implica no custo do dinheiro, que se torna muito exacerbado”, diz.

A segunda preocupação do presidente do BRDE é a desvalorização cambial. “Como temos muitos fundings internacionais e são recursos emprestados na moeda de origem, em dólar e euro, isso tem um reflexo e o tomador acaba preocupado e evita fazer negócios na moeda estrangeira.”

“A terceira preocupação do sistema financeiro mundial, e essa vem desde o fim de 2024, é o presidente Donald Trump. A cada fala, a cada manifestação, ele tem trazido preocupações ao mercado financeiro global e não é diferente para nós, no banco.”

Linhas do agro

As linhas de financiamento específicas para o agro estão englobadas em um programa chamado Meu Agro é BRDE, que possui oito linhas de crédito para iniciativas de agronegócio sustentável, projetos de aumento de capacidade armazenagem, irrigação nas lavouras, inovação e modernização tecnológica das propriedades, aquisição de máquinas e equipamentos, investimentos em empresas ligadas ao agro, convênios operacionais, e investimentos de cooperativas agroindustriais.

As cooperativas de produção, numerosas e tradicionais na região, são importantes para fazer com que o BRDE chegue aos produtores, uma vez que o banco possui apenas três agências físicas, sendo uma em cada capital dos estados da região Sul: Porto Alegre (onde fica a sede do banco), Florianópolis e Curitiba.

“Como o BRDE não é um banco comercial, nós não temos a capilaridade que um banco comercial, estando fisicamente nos mais distantes municípios”, afirma Vieira Júnior.

“A cooperativa serve também como meio para que a gente consiga chegar lá na ponta, em seus associados que são, em regra, pequenos agricultores”.

O BRDE também tem passado por uma transformação em sua fonte de recursos, na avaliação de seu presidente.

“Entre 2015 e 2016, 98% dos negócios do banco tinham origem em recursos do BNDES. Em 2024, foi de 53%”, diz.

No lugar dos recursos do BNDES, o BRDE tem feito um mix de operações, que mistura captações de mercado, Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), Letras de Crédito do Desenvolvimento (LCDs), recursos da Finep, órgão de inovação do governo federal, e de instituições multilaterais internacionais como a Agência Francesa de Desenvolvimento, o Banco Europeu de Investimento, Banco Mundial e CAF.

“O banco deixa de ser apenas um repassador, digamos, do BNDES, para também trazer outras formas de mecanismos e recursos”, pontua.

O presidente do BRDE diz que o objetivo não é deixar de lado o BNDES, principal parceiro operacional do banco. “Mas é importante que a gente tenha, na nossa prateleira, um portfólio de várias possibilidades”, avalia.

Dentro da governança do banco, o BRDE precisa emprestar valores em fatias iguais para cada estado – mesmo que Paraná e Rio Grande do Sul tenham uma economia maior que a de Santa Catarina. “Se eu tenho R$ 100 para emprestar, preciso emprestar R$ 33,33 para cada estado”, exemplifica. “Nenhum estado pode se sobrepor aos demais.”

O próprio comando do banco de fomento é revesado entre integrantes dos três estados, que permanecem 16 meses à frente do cargo.

Indicado pelo governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, o gaúcho Ranolfo Vieira Júnior assumiu a presidência do BRDE em julho de 2024, no lugar do ex-deputado catarinense João Paulo Kleinübing. Quando deixar o cargo, em novembro deste ano, será sucedido por um nome do Paraná, indicado pelo governador Ratinho Júnior.