Diamantino (MT) - Nos últimos anos, empresas se desdobram e se dedicam para assumir o compromisso de reduzir gradativamente a emissão de gás carbono (CO2) no planeta, alinhadas ao movimento global “Race to Zero”, da Organização das Nações Unidas (ONU), que busca zerar as emissões de carbono até 2050.
Nessa “Corrida para o zero”, em tradução livre, há quem engatinha no processo de descarbonização, há quem esteja com medidas de redução de carbono no forno e há empresas alguns quilômetros à frente. Um exemplo desse último grupo é a Amaggi, que desde 2021 faz parte do Science Based Targets Initiative (SBTi) e, um pouco antes, iniciou testes em busca de uma produção mais sustentável.
A companhia, uma das maiores do agronegócio brasileiro, já deu partida e começou a colher os frutos dessa virada de chave na busca pela descarbonização. Um dos projetos da Amaggi é o B100, no qual tem metas de redução de CO2 em 50% até 2035 e de 100% até 2050.
O B100 passa diretamente pelas operações e logística da companhia, que, entre maio e junho, recebeu os primeiros caminhões e máquinas agrícolas totalmente abastecidos com biodiesel, feito a partir de óleo de soja degomado. Cada quilo de soja rende 230 ml do combustível que, ao ser trocado pelo diesel, pode diminuir em 99% as emissões de carbono.
“O projeto está dentro desse guarda-chuva maior que é a gente chegar a ser uma empresa de emissão líquida (de carbono) zero até 2050. É um desafio muito grande porque no agro a gente sabe o quanto é difícil reduzir as emissões, tanto na operação quanto na logística”, comenta a diretora de ESG, Comunicação e Compliance da Amaggi, Juliana Lopes.
A Amaggi trabalha em cima do projeto 100% biodiesel desde 2019, mas os primeiros testes com o maquinário agrícola começaram em 2020, na Fazenda Itamarati, em Campo Novo do Parecis (MT). Com a pandemia de covid-19, o projeto foi pausado, mas voltou em 2022, ano-base da empresa para contabilizar a redução de emissões.
A primeira fase do B100 acaba de ser concluída na Fazenda Sete Lagoas. Agora, a unidade, localizada em Diamantino (MT), trabalha totalmente com o biodiesel. Desde o maquinário de campo, das linhas verde e amarela da John Deere, aos caminhões que transportam os grãos produzidos na propriedade de 3,6 mil hectares de área total, a menor entre as fazendas da empresa.
“Escolhemos a Sete Lagoas como piloto para entendermos o resultado nessa escala. É um piloto que começa grande. Além disso, a distância entre a fazenda e a fábrica de biodiesel, em Lucas do Rio Verde (cerca de 185 quilômetros) faz com que o processo logístico do projeto seja melhor. Por isso, a escolha”, explica a executiva.
Em conversa com o AgFeed, a diretora de ESG da Amaggi relata que a ideia é, aos poucos, expandir o B100 para as demais unidades da Amaggi. Além disso, está nos planos da empresa ampliar e renovar toda a frota de caminhões. “Não há prazo para isso, mas são etapas futuras", comenta.
Hoje, a produtora de grãos e fibras tem uma frota de quase 1 mil caminhões. Entre eles, 101 caminhões foram adquiridos da Scania para o projeto B100. Desse total, 100 veículos são na configuração 6x4 (até 9 eixos) para transportar soja e um na configuração 6x2 (7 eixos) para o transporte de 35 mil litros de biodiesel.
Em 2023, a Amaggi ainda comprou 250 novos caminhões “Euro 6”, nomenclatura europeia que define os padrões sustentáveis de fabricação de caminhões. No Brasil, o "Euro 6" é equivalente ao P8, de acordo com as normas de meio ambiente no país. Todos eles são da linha Super da Scania, que geram economia de 8% de combustível.
Esses veículos são movidos a diesel, porém, contam com 10% de biodiesel em sua composição. Apesar de a compra ter sido no ano passado, a Scania entrega os veículos conforme a demanda da Amaggi. Mesmo processo para os 100 caminhões movidos totalmente a biodiesel, no qual as entregas serão até o fim deste ano.
Como o AgFeed antecipou em janeiro passado, a Amaggi solicitou autorização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para o uso do biodiesel nos caminhões e também em sua frota fluvial.
O sinal verde veio em abril e o primeiro teste com um dos empurradores da frota e 25 barcaças graneleiras ocorreu em maio, no trecho de Porto Velho (RO) a Itacoatiara (AM), percorrendo os rios Madeira e Amazonas.
A viagem, incluindo os trechos de ida e volta, durou cerca de 10 dias e teve consumo de 120 mil litros de biodiesel. De acordo com Juliana Lopes, a Amaggi já entrou com um pedido para usar o combustível em toda a frota hidroviária da companhia.
"A gente vai em etapas. Começamos o projeto em 2019, intensificamos em 2020, principalmente, nas linhas agrícolas. Fizemos testes nas frotas rodoviária e fluvial. É um processo que vai acontecer naturalmente”, diz o diretor de logística e operações da empresa de grãos, Claudinei Zenatti, ao AgFeed.
A próxima etapa não foi revelada, mas a empresa já caminha para replicar, em escala ainda maior, o projeto da Fazenda Sete Lagoas em outra unidade da companhia.
“A partir do momento que a operação na Sete Lagoas se consolidar, podemos dar um segundo passo. Ir para uma segunda fazenda, uma terceira, uma quarta”.
Deve ser um passo bem mais largo. Zenatti dá uma pista. Ele acrescenta que a Fazenda Itamarati, de 100 mil hectares, tem depósito de biodiesel, o que a coloca como candidata para receber uma próxima etapa do B100.
“Mas é uma fazenda de área muito extensa e com um número de equipamentos muito grande. Lá, pede um planejamento robusto”, pondera.
Para além das máquinas e caminhões
O executivo Zenatti destaca que os planos da Amaggi em busca da emissão zero de carbono envolve outras frentes, como a agricultura regenerativa e de baixo carbono, com práticas de restauração da saúde do solo e promoção da biodiversidade, uso de biológicos e atuação na área de energia, com seis pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que geram 115 kWh quilowatts-hora), o suficiente para ser comercializada.
Em funcionamento desde 2023, a fábrica esmagadora de soja da companhia, em Lucas do Rio Verde, recebeu investimentos de R$ 100 milhões e tem capacidade para produzir 338 mil metros cúbicos de biodiesel por ano, o suficiente para o consumo de toda a operação da Amaggi. Com isso, o executivo já projeta outros usos do combustível na operação da companhia.
“Hoje, nossos geradores de energia consomem diesel fóssil. Futuramente, a gente vai transformar esses geradores para consumo de biodiesel”, afirma.
“As próximas etapas serão mapeadas de acordo com as suas características e adaptabilidade. As outras fazendas são maiores, o que requer um pouco mais de planejamento. Não tem como virar a chave de uma vez”, completa Zenatti.