Talvez não exista na literatura o que seja um banco de esquerda. Menos ainda no setor financeiro. Mas o LeftBank, além de assumir no seu nome, acredita que seu jeito de trabalhar explica o conceito.

Não exige score positivo dos seus clientes, ou seja, nada de investigar a condição pagadora de ninguém. E quando começar a oferecer crédito e financiamento, garante que também não exigirá garantias, não imporá limites mínimos e cobrará taxas de juros bem abaixo das praticadas pelo chamado sistema bancário.

Um dos produtos que já oferece, Leftfone, serviço de telefonia móvel com parceiro que opera com a Vivo, não exige, por exemplo, nem fidelização.

Com esse modelo, o CEO Marco Maia, ex-deputado federal petista em várias legislaturas, lembra que a instituição digital, por natureza, fica próxima do público excluído da chamada “bancarização”. E próxima, também, da população assistida pelos movimentos sociais, ONGs e por boa parte dos sindicatos de trabalhadores.

Ao pequeno produtor rural está reservada, nos planos da fintech, boa dose de expectativa de expansão.

Vem sendo assim, segundo Maia, que o LeftBank conquistou 50 mil correntistas e administra cerca de R$ 10 milhões em depósitos, desde 2021, sem nenhum marketing agressivo fora “dessas quatro linhas”.

O cenário de expansão preparado na reestruturação pela qual está passando – com meta de até 500 mil clientes na virada para 2024 e até 5 milhões em 2025 -, vai se dar a partir de julho, quando está prevista a entrada em operação dos empréstimos próximos das taxas básicas, a Selic, junto também com o lançamento de um novo aplicativo.

Fosse hoje, se a “Faria Lima”, que virou sinônimo do sistema financeiro, está jogando o custo do dinheiro acima de 25% ao ano para as empresas e de até 57% para pessoas físicas, de acordo com os últimos dados do Banco Central, o LeftBank iria procurar se manter próximo dos juros de 13,75%.

A instituição digital criada com dinheiro de dois sócios “progressistas’, o advogado Daniel Gonçalves e o contabilista e administrador Volnei Gomes, surgiu se amparando nas campanhas dos grupos organizados contra o governo de Jair Bolsonaro.

Agora pretende seguir de carona no projeto do “governo de esquerda”, tanto pela aposta no desenvolvimento econômico que o banco acredita que o Brasil viverá, quanto pelo que Marco Maia entende ser a “retomada” da agenda econômica, política e social.

À espera do Plano Safra

O apoio na consolidação dos assentamentos de trabalhadores rurais, aceleração da reforma agrária e incentivo à agricultura familiar, que estão na linha de frente das propostas de inclusão econômica e social do governo, acabarão sendo, na visão dos sócios, a mola de expansão.

“Claro que vamos crescer junto ao público urbano excluído do sistema bancário, mas não há como negar que o campo acabará sendo a base principal em vastas regiões do interior do Brasil”, aventa Marco Maia, que presidiu a Câmara Federal em duas ocasiões nos governos petistas anteriores.

Os balanços da casa, que ainda não são divulgados, deverão mostrar que a geografia da distribuição de recursos estará irrigando o meio rural onde é mais percebida a participação do pequeno produtor – com as exceções excludentes dos polos urbanos, como São Paulo, cuja base sindical dos setores industriais será dominante.

O LeftBank pode até figurar, ainda, na lista de instituições repassadoras do Plano Safra, ou ao menos dos recursos do Pronaf (agricultura familiar), lá pelos idos de 2024 ou 2025. “Está no radar, mas é algo que precisa muito planejamento específico”, diz o executivo.

Funding da esquerda

Até o momento os recursos vieram em grande parte dos sócios-fundadores, em torno de R$ 3 milhões, um volume ínfimo quando se pensa nos gigantes do sistema financeiro brasileiro.

O que muita gente pode estar se perguntando é: como o LeftBank vai sobreviver emprestando sem gordura?

Captar recursos no interbancário, a juros de CDI, é que não será, lembra Marco Maia. “Vamos trabalhar com lucro líquido bem reduzido”, informa ele.

E ainda, certamente para desconfiança da “Faria Lima”, o banco pretende remunerar pelo preço de mercado os recursos que entrarão de investidores, cuja base de captação também está nos movimentos sociais e sindicais.

Sindicatos, ONGs e outros, como o MST, precisam fazer render suas receitas. O LeftBank vai operar o funding com esses agrupamentos, para os quais as conversas já estão avançadas, segundo o ex-deputado gaúcho.

“E quem mais se sentir progressista sabendo que seus recursos estarão aplicados em uma base de economia popular”, completa Marco Maia.

Lema da fintech dos “companheiros”: “Coerente, Incluso, Fraterno”.