O sobrenome Scheffer em Mato Grosso há muito tempo é sinônimo de protagonismo na produção agropecuária.

Um dos motivos é a história de Eraí Maggi Scheffer, que já foi considerado o maior produtor de soja do mundo e que lidera um dos maiores grupos de cultivo agrícola do Brasil, o Bom Futuro.

Também é cada vez mais reconhecido no País o trabalho do Grupo Scheffer, que foi fundado por um irmão de Eraí, Elizeu Maggi Scheffer.

Mas a força dessa família, que tem mais dois irmãos, Elusmar e Fernando Maggi Scheffer, vai bem além das duas empresas e agora desponta no trabalho da nova geração.

Um exemplo concreto é o grupo Futurazy, fundado oficialmente em 2021 por três filhas de Fernando (portanto, sobrinhas de Eraí), com mais dois sócios. Um deles é Rafael Simionato, esposo de Letícia Scheffer. O outro é André Becker Soeth, casado com Maria Julha Scheffer. Completa o time Dayla Scheffer Machado.

E de onde surgiu o nome Futurazy? “O futuro vem da raiz. Foi um jeito de homenagear a geração anterior, que foi quem nos ensinou essa lida, quem nos ensina todo dia, mas pensando também no futuro”, afirmou Rafael Simionato, em entrevista exclusiva ao AgFeed.

Ele contou que a origem do grupo foi um trabalho iniciado há dez anos entre as três irmãs Letícia, Dayla e Maria Julha, em parceria com primos, inclusive filhos de Eraí Maggi. Eles tocavam uma fazenda que ficava na Chapada dos Guimarães, “um negócio pequeno”, segundo Simionato.

Alguns ainda eram estudantes, mas cada um tinha seu papel. Letícia, por exemplo, cuidava do financeiro.

Com o passar do tempo e a chegada dos esposos na sociedade, eles compraram uma segunda fazenda, no Norte de Mato Grosso, e decidiram criar a Futurazy. A empresa tem uma fazenda de pecuária em Nobres e outra em Tabaporã, onde áreas de pastagens vêm sendo transformadas em lavouras.

Depois de uma safra “para ser esquecida”, na temporada 2023/2024, Rafael Simionato disse ao AgFeed que esse ano esperam ter a maior colheita da história do grupo, em 10 anos de trabalho.

Na metade de fevereiro, já estava com cerca de 50% da área de soja colhida, “com médias muito boas”, disse ele. Na fazenda do Norte, exemplo, a produtividade média ficou em 79 sacas por hectare, enquanto na safra passada estava em 46 sacas.

“O ciclo se alongou um pouco. Então perdeu-se um pouco da janela ideal do algodão, que era até 31 de janeiro. Mas está compensando em cima dessa produtividade que a soja está entregando”, explicou.

Se considerada a parceria que a Futurazy ainda tem com os primos, são 9 mil hectares de soja, sendo 3,5 mil em área própria. A média será maior que nos últimos anos, o que se explica por alguns fatores, segundo Rafael.

“Você tem o fator tecnologia, você tem a questão de variedades, o teto produtivo está cada vez mais alto, as terras estão mais amansadas. Você vai pegando mais o jeito do manejo, mas no final do dia é porque o clima ajudou. Se o clima também não ajudasse, nada disso teria acontecido”.

A mais recente decisão do grupo foi testar o uso do seguro paramétrico. A Futurazy fechou com a startup Trag uma operação para se proteger do excesso de chuvas.

“Não usávamos nenhum tipo de seguro, mas já tínhamos identificado que essa fazenda que temos no Norte é muito chuvosa. Então, no final de janeiro, fevereiro e março, cai muita água naquele lugar, atola maquina, é complicado. Teve um ano que tivemos que deixar 150 hectares para trás, porque não conseguia colher”, contou Simionato.

Em função desse problema, o seguro contratado por eles estabelece um gatilho de 330mm de chuva para o período entre 1 de fevereiro e 2 de março. Cada milímetro a mais de chuva além desse limite, vira pagamento de indenização.

O total da apólice é de R$ 3 milhões e contempla 3 mil hectares de soja. Rodrigo Gandra, cofundador da Trag, explicou que, nesse caso, cada milímetro extra de chuva gera R$ 2,34 por hectare. Se encerrado o período, tiver chovido 500mm, por exemplo, a Futurazy receberá R$ 1,1 milhão de indenização.

Segundo Simionato, o objetivo foi mitigar o risco de algo que eles já sabem que pode ocorrer e que costuma trazer custos altos de manutenção, além de perda de produtividade e qualidade dos grãos.

Na lavoura, a agricultura digital também é regra para o grupo. A empresa diz usar mais de uma plataforma de monitoramento, o que vem garantindo entender no detalhe os motivos para variações de produtividade em cada talhão.

“Hoje nós temos todas as nossas operações mapeadas, na pulverização, colheita e plantio”, diz ele. Na próxima safra, será testado o robô da Solinftec, que também ajuda no monitoramento de pragas e doenças.

Prontos para expandir

Se considerada a história somente da Futurazy, criada em 2021, a empresa se mantém trabalhando em 10 mil hectares. A fazenda de Tabaporã tem 40 mil hectares, mas está no bioma amazônico, por isso apenas 20% da área pode ser utilizada e a empresa abriu somente 8%.

O foco foi a transformação de pastagens em lavouras de grãos e também a melhoria do pasto para uma pecuária mais intensiva. O grupo trabalha com semi-confinamento, na chamada Terminação Intensiva a Pasto (TIP) e com Recria Intensiva a Pasto (RIP).

Simionato calcula que, desde a criação da empresa já tenha conseguido multiplicar por cinco o faturamento. A receita líquida estimada para a safra 2024/2025 é de cerca de R$ 100 milhões.

O sócio da Futurazy diz que o último ano foi “para ajeitar a casa”. Em função do ciclo de baixa das commodities, o grupo preferiu não expandir áreas de cultivo e apenas ter foco na organização da empresa e na preparação para um crescimento futuro.

“A gente acredita que sempre nas crises tem as oportunidades. Então, acredito que esse ano e no próximo, devem aparecer algumas coisas interessantes, coisas boas. Nós vemos um problema muito grande no Mato Grosso, hoje, de sucessão”, explicou.

Ele diz que muitos proprietários de fazendas em Mato Grosso acabam optando por vender ou arrendar suas terras “não por necessidade, não por desejo, mas porque não tem ninguém pra perpetuar (o negócio)”.

É diferente da família Scheffer, em que desde cedo todos já participavam da administração das fazendas e mostram que estão dispostos a seguir expandindo o legado.

Neste cenário, Simionato não descarta que ainda em 2025 possam adquirir novas áreas, já que “conversas vêm ocorrendo e oportunidades estão aparecendo”.

O interesse por terras estaria em todo o estado de Mato Grosso e não em uma região específica. Ele prefere não revelar qual seria o plano estratégico e qual seria a meta de crescimento da Futurazy.

Uma das hipóteses, ele admite, é a verticalização, o que passaria por investimentos em usina de etanol ou esmagadora de soja, por exemplo.

Nas lavouras, a ideia é ampliar a produção de soja, milho e algodão. “A gente vê uma oportunidade, principalmente em algodão. Mas a gente não esquece um pouco da nossa raiz, que é a pecuária”.

Segundo Rafael, foi o seu sogro, Fernando Maggi Scheffer, que ajudou a implementar a operação de pecuária da Bom Futuro e uma das cunhadas é zootecnista, por isso devem seguir fortes no negócio de bovinos.

Ele diz que a expansão será feita com “paciência”, criticando metas que muitas vezes levam empresários a fechar negócios em que “se perde a racionalidade”. A expansão que alguns fizeram com arrendamentos de terra caríssimos, no período da disparada de preços das commodities, seria um exemplo, na visão dele, dessas decisões equivocadas.

O fato é que a empresa está capitalizada para expandir, se quiser. Apesar da forte quebra de safra no ano passado, um diferencial da empresa das irmãs Scheffer é fazer negociações em parceria com a Bom Futuro.

“Hoje nós somos considerados agregados da Bom Futuro. Então, da porteira pra dentro, nós tomamos nossas próprias decisões. Mas da porteira pra fora, temos o suporte deles. Nós compramos máquinas e insumos juntos. Comercializamos grãos, algodão e gado juntos. Isso consegue dar uma sinergia pra nós”, ressaltou.

Ele explica que, acima de tudo, a Bom Futuro é uma escola, onde aprenderam por exemplo “a não sair especulando”.

“No final do dia, nós somos produtores de commodities. Nós não mandamos no preço da soja. Não é porque nós somos agregados da Bom Futuro que vão pagar um dólar a mais na minha soja do que na do meu vizinho. Mas a ponta que a gente pode atacar é o custo. Então, nós temos que tomar esse cuidado cada vez mais com o custo”.

Foco na nova geração

Quando perguntado sobre qual diferencial a Futurazy pretende ter em relação ao que já fizeram seus pais e tios, Rafael Simionato diz que o que mais motiva o grupo “é gerar valor para a sociedade”.

Neste aspecto, destaca como exemplo a transformação feita na fazenda de pecuária. “Lá tinha 15 funcionários, hoje tem 100 pessoas, tem uma escola dentro dela, o dinheiro está girando na comunidade, na cidade. Isso é muito gratificante pra nós, porque todo mundo sai ganhando”.

Em outra frente, a esposa de Rafael, Letícia Scheffer, preside uma organização chamada Instituto Farmun, que tem como um dos objetivos desmistificar o agro para as novas gerações. Era um projeto da Bom Futuro que acabou virando um instituto sem fins lucrativos e conta com mais mantenedores.

Uma das ações leva estudantes de escolas públicas para o Farm Day, para passar o dia na fazenda e conhecer todos os processos. Alunos de escolas de outros estados também estão participando.

O projeto já atua em parcerias com entidades como SESI e SENAI do estado do Mato Grosso para oferecer também cursos de capacitação.

Rafael Simionato diz que um dos maiores desafios que o setor enfrenta hoje é a falta de mão de obra. A expectativa é de que o projeto também ajude a trazer soluções nesse sentido.

“Você leva e mostra a algodoeira, mostra a sementeira, a máquina, mostra o escritório, para ela ver o que é o agro. E ter o interesse de trabalhar no agro”, afirma.

Outra característica da nova geração, segundo ele, é a parte da tecnologia, “mas sem perder a essência de estar no campo, porque um complementa o outro” .