Cali (Colômbia) - Repartição de benefícios sobre recursos genéticos, produção sustentável de alimentos e redução do uso de pesticidas são temas relacionados ao agronegócio discutidos no Marco Global da Biodiversidade.
O mecanismo foi assinado por 196 países, incluindo o Brasil, em 2022. Agora, em 2024, o assunto volta a ser discutido em âmbito global na 16ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre biodiversidade (COP16).
Pelos corredores da COP16, em Cali, na Colômbia, a comunidade internacional cita muito o nome do Brasil, afinal, ele está entre os três países com maior biodiversidade do mundo, ao mesmo tempo em que a reconhecida produção agropecuária gera impactos aos recursos naturais e aos serviços ecossistêmicos.
Diante de um cenário complexo, a iniciativa privada está em peso na cidade de Cali – mas a presença das empresas do agro brasileiro é tímida, quase imperceptível, diferentemente do que acontece em outros segmentos.
Mário Cardoso, gerente de recursos naturais da Confederação Nacional das Indústrias, diz que somente a delegação da CNI levou para a cidade colombiana 90 pessoas.
Há ainda delegações do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), dos governos estaduais e de câmaras de comércio.
“Caiu a ficha das empresas de que elas precisam conhecer como a atividade delas impacta a biodiversidade. Estamos falando de mineração, petróleo e gás, e a agropecuária entra nisso também”, avalia.
Um dos setores mais representados na comissão da CNI é o de papel e celulose, relata Cardoso, que traz desde grandes indústrias como a Suzano até empresas de menor porte.
Enquanto para alguns segmentos o momento é de amadurecimento quanto ao Marco Global de Biodiversidade e a respectiva legislação brasileira, para o agronegócio esta COP16 ainda é um primeiro passo, uma ocasião para se familiarizar ao tema urgente.
Com uma postura mais observadora, de cautela no discurso e procurando espaços de diálogo com governos e ambientalistas, a CropLife Brasil esteve pela primeira vez em uma Conferência da Biodiversidade.
A entidade representa atualmente 52 empresas dos setores de germoplasma, biotecnologia, defensivos químicos e bioinsumos.
Em um ambiente em que se discute o impacto da transgenia para a perda da biodiversidade nativa e a consequência dos agrotóxicos para plantas e polinizadores, a CropLife esteve disposta a uma escuta ativa sobre a meta 7 do Marco Global da Biodiversidade.
Neste tópico específico é abordada a redução dos produtos sintéticos, a fim de reduzir a poluição do meio ambiente. Claudia Quaglierini, líder de sustentabilidade e boas práticas da CropLife Brasil, explica que a construção do diálogo na COP16 está baseada em mostrar como a indústria está engajada em incentivar o uso correto dos produtos.
Em outras palavras, a entidade setorial quer defender a continuidade do uso dos químicos, simultaneamente à adesão dos produtos biológicos, de uma forma mais responsável por parte dos produtores rurais.
Nas contas da entidade, entre 1,5 milhão e 2 milhões de pesoas aplicam agroquímicos no Brasil, por meio de aplicadores costais ou maquinário – a pulverização aérea não entra nesta conta.
“A gente tem um entendimento de que o que está estabelecido na meta 7 é a não utilização dos pesticidas. Isso precisa de uma avaliação de risco junto à agenda de abastecimento de alimentos às populações. Por isso a defesa é implementar boas práticas agrícolas”, diz.
Quaglierini conta que, pouco antes de viajar à Colômbia, teve uma reunião com Braulio Dias, diretor do Departamento de Conservação à Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente.
A conversa aconteceu no contexto de um encontro em que também participaram CNI, CEBDS e Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA). No entanto, a CNA não enviou representantes à COP16.
Com 42 empresas associadas em Cali, o CEBDS também coloca sobre a mesa pautas relacionadas à agricultura. Neste caso, a iniciativa privada mira soluções para a meta 15 do Marco Global da Biodiversidade.
Nela, está estabelecido que o setor privado precisa reduzir progressivamente os impactos negativos sobre a biodiversidade, aumentar os impactos positivos e promover ações para garantir padrões sustentáveis de produção.
Juliana Lopes, diretora técnica de natureza e sociedade do CEBDS, explica que há duas vertentes de bioeconomia que englobam o agronegócio: biotecnologia e sistemas alimentares.
Isso está em linha com a Estratégia Nacional de Bioeconomia, a qual também considera biocombustíveis, sistemas integrados de produção, e a sociobioeconomia, incluindo agricultura familiar.
“Uma das nossas pautas aqui na COP16 é buscar formas de aferir práticas de agricultura regenerativa com um conjunto de indicadores e estabelecer requisitos mínimos que relacionem à biodiversidade”, explica.
Para isso, o evento na cidade colombiana é ocasião propícia para construir métricas específicas à realidade de clima tropical, junto ao World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), do qual o CEBDS faz parte.
*Esta matéria foi produzida com apoio da bolsa de reportagem COP16-CBD 2024, organizada pela Earth Journalism Network, da Internews.