Há um movimento novo no mercado brasileiro de fertilizantes. Grande importador de matéria prima para esses produtos, trazidos de países como Rússia, Ucrânia e até mesmo de Israel, país conhecido pelo uso de tecnologias avançadas na agricultura. Pois é justamente uma empresa de origem israelense que tenta acelerar na contramão desse fluxo habitual, exportando especialidade.
Uma das líderes globais do mercado de fertilizantes tradicionais, a ICL colocou em prática por aqui uma mudança na estratégia, com aumento nos investimentos voltados a produtos de maior valor agregado e com soluções consideradas mais sustentáveis, alegando atender um perfil mais sofisticado de produtor rural. Além disso, transformou a filial brasileira em exportadora, vendendo inclusive para o país da sua matriz.
O executivo Gustavo Gustavo Vasques está no comando da atual ICL América do Sul desde 2021 e se diz orgulhoso por estar tornando realidade algo que antes era impensável. “Ao invés de só apenas tropicalizar tecnologias feitas lá fora, algo comum em multinacionais, estamos aproveitando o que foi pesquisado e desenvolvido por anos no Brasil para exportar para outros países, o que é viável na integração com a ICL global”, disse ao AgFeed.
Neste primeiro trimestre de 2023, por exemplo, a ICL exportou para Israel e para o Japão condicionadores de solo que foram desenvolvidos no Brasil, com foco para diferentes culturas, principalmente frutas. A empresa não revela o volume embarcado, mas diz que há outros países interessados nas formulações brasileiras e que o negócio de “duas vias” – importar e exportar tecnologias – deve crescer.
Vasques tem 30 anos de experiência como executivo em empresas do agronegócio e acompanhou de perto diversas revoluções enfrentadas pelo setor como a adoção do plantio de sementes geneticamente modificadas nas lavouras de soja e milho. Agora, se diz impressionado com a rapidez na mudança dos anseios do produtor rural, que não atendem somente a busca por alto rendimento e baixo custo, mas também às exigências do consumidor.
A antiga ICL Brasil operava por aqui há algumas décadas com foco no fornecimento de matéria-prima às principais indústrias de fertilizantes e commodities como Fertipar, Mosaic, Amaggi, entre outras.
Lá fora o grupo israelense é reconhecido por ser líder no segmento de minerais especializados, possuir minas de produtos muito procurados no mercado, produzir e refinar matérias-primas como o cloreto de potássio. A ICL global é listada na Bolsa de Nova York (NYSE) e também na Bolsa de Tel Aviv (TASE).
Aquisições no Brasil
O maior foco no mercado brasileiro e a mudança de estratégia começaram em 2020, quando a ICL adquiriu, por US$ 120 milhões, a Fertiláqua – na época, uma das principais empresas de nutrição de plantas no país, que pertencia ao fundo de private equity Aqua Capital.
Em 2021 deu um passo ainda maior neste segmento conhecido como “de especialidades”, que inclui fertilizantes mais elaborados e bioestimulantes: anunciou a compra da divisão agrícola da Compass Minerals América do Sul por U$ 420 milhões.
“Há alguns anos era algo teórico, como uma tendência de futuro. Hoje é uma realidade. Nossos filhos querem saber de onde vem os alimentos, por isso houve uma revisão estratégica, o grupo escolheu plataformas no Brasil que possam exportar tecnologias para o mundo. A Fertiláqua e a Compass são companhias criadoras de tecnologia, isso atraiu a atenção da ICL para estas aquisições”, destacou Gustavo Vasques.
Neste cenário, foi criada a ICL América do Sul, que engloba os negócios de fertilizantes tradicionais, que ainda existem e devem continuar, o pilar de nutrição vegetal e também uma área de ingredientes para a indústria alimentícia. O mercado de especialidades ainda não representa a maior parte da receita do grupo na região mas, de acordo com Vasques, a taxa de adesão e o ritmo de crescimento é bem maior se comparado aos fertilizantes que são commodities.
A empresa não divulga a receita do segmento de matéria-prima, somente de especialidades, que alcançou R$ 3,7 bilhões em 2022, aumento de 47% em relação ao ano anterior, quando a ICL faturou R$ 2,5 bilhões. O setor de nutrição vegetal especial cresceu 15% no Brasil em 2022.
Mais de 40% da receita da ICL América do Sul vem de produtos lançados nos últimos 5 anos, segundo o CEO. Para isso, a inovação foi estabelecida como um dos 3 pilares da estratégia que inclui também acesso a mercado e ampliação de portfólio. Além de 8 fábricas no setor agrícola, com 1800 funcionários, o grupo tem 3 centros de inovação, dois deles credenciados pelo Ministério da Agricultura como instituição de pesquisa. Recentemente, a ICL também trouxe para o Brasil um programa global de investimentos em startups do agro, chamado de ICL Planet Startup Hub.
“Mas os produtos não são lançados apenas para ganhar prêmio de tecnologia, eles precisam gerar receita e trazer benefícios, sendo facilmente adotados pelos produtores”, afirma Vasques.
Novos investimentos
A ICL América do Sul vai investir R$ 100 milhões para ampliar a capacidade produtiva no Brasil em 2023. O valor será aplicado para dobrar a produção da unidade localizada em Jacareí (SP). O foco é um dos produtos que vem mostrando melhor resultado de vendas atualmente, o fertilizante para aplicação no solo, da marca Polyblen, que teve o uso impulsionado pelo avanço do plantio do milho no Brasil, especialmente a segunda safra.
O total investido este ano supera o que foi aplicado em 2021, quando R$ 70 milhões foram aplicados para ampliar a produção de fertilizantes foliares na planta de Suzano-SP.
O CEO da ICL admite que a empresa também está atenta ao movimento crescente do setor de biológicos no Brasil. “Podemos entrar neste mercado tanto desenvolvendo tecnologias próprias como de forma inorgânica, estamos olhando com bastante interesse”, disse.
O fato é que o setor de fertilizantes especiais segue em processo de consolidação. Estima-se que 500 empresas tenham registro neste segmento, mas somente 80 são ativas e menos de 20 têm mantido investimentos em tecnologias. Em 2022 a ICL fez uma pausa no processo de aquisições sob argumento de ter priorizado o processo de integração entre as diferentes empresas.
Ao manter um crescimento anual de dois dígitos, a expectativa é retomar a expansão em 2023 já que, segundo Vasques, “estamos completando a integração e agora virá um período mais interessante”.