Uma linha imaginária se tornou referência para uma importante transformação na logística do agronegócio brasileiro. O paralelo 16 S, localizado 16° ao sul da linha do Equador, cruza os estados de Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais e Bahia e a capital federal Brasília e estabelece a “fronteira” da região chamada Arco Norte.

Os portos instalados acima dessa linha vem ganhando cada vez mais relevância no escoamento de milho e soja para exportação e na entrada de fertilizantes no Brasil.

De acordo com o Boletim Logístico produzido pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), entre os meses de janeiro e setembro deste ano, passaram pelos portos do Arco Norte – Barcarena (PA), Itaqui (MA), Itacoatiara (AM) e Santarém (PA) – quase 13 milhões de toneladas de milho para exportação, o que corresponde a 53,3% do grão vendido pelo Brasil. No mesmo período de 2023, essa participação foi de 43,2%.

Nesses nove meses de 2024, o Porto de Santos, em São Paulo, teve participação de 35,9% nas exportações de milho, enquanto o de Paranaguá, no Paraná, 3,5%.

Os dados são expressivos também em relação à soja. Ainda nessa mesma comparação temporal, e considerando os mesmos portos mais Salvador (BA), a participação nas exportações da oleaginosa foi de 35,5%, o que representa mais de 31,7 milhões de toneladas.

Também é notório o crescimento da movimentação de fertilizantes pelo Arco Norte. A entrada do insumo pelos portos acima do paralelo 16 S foi de 2,28 milhões de tonelada entre janeiro e setembro de 2020 e em igual período de 2024 já passou de 5,55 milhões de toneladas.

Até aqui, as notícias são somente positivas, pois com mais opções de escoamento e recebimento de produtos agrícolas, grãos ou fertilizantes, o agronegócio brasileiro consegue reduzir custos, ganhar agilidade logística – o que até permite ampliar o leque de parceiros comerciais – e otimizar os processos envolvidos nessa comercialização.

“Muita gente tem reclamado das grandes filas nos portos do Sul e Sudeste, por conta do volume, e do demurrage, que é o preço pela espera”, disse a especialista em Agricultura e Fertilizantes da Argus Media, Renata Cardarelli.

No entanto, assim como acontece nas lavouras, a estiagem é um grande desafio e tem prejudicado o transporte pelas bandas do Arco Norte, pois boa parte da malha logística passa por hidrovias. Segundo informações da Argus, a navegação em Porto Velho (RO) foi suspensa no dia 23 de setembro devido ao baixo nível dos rios.

“Subindo o Rio Madeira, vemos limitações de navegação também em Itacoatiara e em Miritituba”, disse Renata. Segundo ela, ainda há fluxo de cargas na região devido ao fertilizante que já se encontra em barcaças aguardando transporte. “Esta é uma seca histórica, muito maior.”

O alívio para o baixo nível da água em alguns pontos da capilaridade hídrica no Arco Norte vem pela melhor remuneração do milho no mercado nacional, estimulada principalmente pela demanda para a produção de etanol e de ração animal.

A especialista da Argus cita que o preço da saca de milho em Sorriso (MT) chegou a quase R$ 54, com aumento de praticamente 63% sobre o valor de um ano atrás.

Caso as exportações estivessem mais aquecidas, os efeitos da estiagem seriam potencializados, e a opção seria buscar os corredores do Sul e do Sudeste.

“Podemos ter mudanças mais significativas mais para a frente se a seca persistir e a comercialização aumentar. É possível haver maior demanda de escoamento para Santos e Paranaguá”, afirmou Renata.

De acordo com o acompanhamento da Argus, essas projeções de um agravamento do cenário – e suas possíveis consequências – não se concretizaram. A exemplo dos desvios de cargas da Região Norte para outros caminhos ou do aumento da demanda pelo serviço de transporte e dos fretes em outros corredores.

“Isso não ocorreu como imaginávamos”, disse o também especialista da Argus (Logística e Fertilizantes), João Petrini. “Por exemplo, frete de grãos para exportação saindo de Mato Grosso e indo para Santos, Paranaguá, Maranhão e outros pontos de transbordo como Rio Verde não tiveram alta nos preços.”

Petrini confirma haver certos impactos, mas não o suficiente para afetar o funcionamento da cadeia logística. “No ano passado, esses impactos foram maiores e vimos alterações mais amplas, com mais oscilação de fluxos de carga e preços de fretes”, afirmou o especialista.

Os aumentos nos preços de fertilizantes que ocorreram em outubro deveram-se muito ais à baixa oferta de veículos nos portos e às condições ruins de frete de retorno de grãos.

De maneira geral, as perspectivas seguem favoráveis ao crescimento do transporte de produtos agrícolas no Arco Norte, e por vários motivos. Um deles é a redução de custos, pois oferece fretes mais baixos em relação a outros modos de transporte e pode, inclusive, aumentar a competividade dos produtos agrícolas. A menor distância no acesso a determinados mercados amplia as oportunidades no comércio exterior.

Para que essa projeção se concretize, é necessário dar mais atenção aos sistemas intermodais para aumentar a eficiência no escoamento de grãos, e manter os investimentos contínuos para ampliar e modernizar a infraestrutura logística.