Como já era esperado e pleiteado pelas entidades do setor, o agro não fará parte do sistema de metas de redução de gases causadores do efeito estufa, o que na opinião de especialistas, não exclui a participação da agropecuária no cumprimento dos desafios globais.
Nesta quinta-feira a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que regulamenta o mercado de carbono no Brasil. Serão estipulados limites de emissões de gases do efeito estufa para as empresas, que se não cumprirem as metas, terão de pagar multas.
O agro foi deixado de fora com o aval da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), com a justificativa de que o setor agropecuário ainda não possui as referências e métricas cientificamente comprováveis para a medição das emissões.
Ao ser questionado pelo AgFeed, o vice-presidente da FPA, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), disse que "o agro brasileiro tem um compromisso definitivo com a sustentabilidade". Segundo ele, o setor já está preparado para desde já seguir atuando no mercado voluntario de carbono, como tem ocorrido em diversos projetos. "Mais adiante quando houver uma definição de métricas de uma forma clara, vamos participar também do mercado compulsório", afirmou o parlamentar.
Em uma nota oficial, a FPA afirmou que o não ingresso do setor primário no projeto foi um pleito atendido pelos parlamentares, "por entender que nenhum país do globo possui regulação do setor agropecuário". O motivo seria a falta de referências e métricas cientificamente comprováveis.
O presidente da FPA, Pedro Lupion ressaltou que parte do setor, as agroindústrias, já está no mercado regulado, o que impacta diretamente a produção.
É neste aspecto que alguns especialistas destacam o "lado positivo” do setor primário não ter metas a cumprir. Em entrevista recente ao AgFeed, Pedro Carvalho, da Ecosecurities, empresa referência em carbono mundialmente, disse que "se o agro estivesse no projeto, ele teria a obrigação de descarbonizar e, por isso, ficaria impedido de gerar o crédito de carbono e vender ao setor".
Os especialistas se refere a diferentes projetos de agricultura regenerativa, por exemplo, em que há redução das emissões e atividades de reflorestamento para que grandes multinacionais do mercado de grãos, por exemplo, possam cumprir suas metas globais em relação à produção de alimentos de baixo carbono.
Pedro Carvalho lembrou que no segmento de energia eólica, por exemplo, também se discute este problema, assim como na agropecuária. Os créditos gerados por estes agentes não podem ser vendidos para o setor elétrico, porque o setor já tem suas obrigações.
O projeto aprovado na Câmara agora precisa ser analisado pelo Senado Federal e só então seguirá para o aval final da Presidência da República.
Apesar de ficar for mercado que acaba de ser regulado, o agro poderá vender créditos de carbono no mercado voluntário. Dessa forma, quem conseguir mensurar suas reduções pode arrecadar com a venda dos créditos.
Lupion acredita que a descarbonização da atividade agropecuária primária deve ser construída a partir de metodologias científicas para o clima tropical brasileiro, de forma pioneira e reconhecida internacionalmente, por meio de instrumentos legais, políticas públicas e com investimentos da Embrapa.
“A FPA reforça a necessidade de construção de um mercado com legitimidade e credibilidade, criando condições atrativas para os potenciais investidores, de forma transparente e acessível a todo produtor brasileiro”, destacou Lupion.
Nos cálculos da FPA, o agro tem um potencial orgânico de gerar 20% dos créditos de carbono e “liderar o mercado de finanças verdes em nível global”.
Em relação ao texto aprovado, Yuri Rugai Marinho, sócio-diretor da ECCON Soluções Ambientais, acredita que, do ponto de vista da descarbonização, a legislação proposta “representa um avanço”, pois cria obrigações de redução de emissões e viabiliza um sistema de comércio de créditos de carbono.
“Isso atrai desenvolvedores de projetos e investidores, promovendo avanço tecnológico e criando um segmento novo na economia”, afirmou Marinho.
Apesar disso, ele acredita que o texto poderia ser mais claro quando fala sobre os instrumentos de conservação. Segundo o executivo, a proposta não cria estímulos a projetos privados de REDD+.
O REDD+ é um instrumento desenvolvido pelas Nações Unidas (ONU) para recompensar financeiramente países em desenvolvimento por seus resultados relacionados à recuperação e conservação de suas florestas.
“No texto não há estímulo para novos projetos privados de REDD+, de maneira que, se o governo não criar projetos públicos dessa natureza, a conservação deixará de ser remunerada”, afirmou.